Treze meses antes de os paulistanos irem às urnas, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) e o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), principais pré-candidatos à Prefeitura de São Paulo, antecipam a disputa do próximo ano com críticas mútuas e embates nas diversas instâncias de poder. A estratégia dos postulantes e de seus aliados é semelhante e consiste em representações contra o adversário no Ministério Público e ações no Judiciário. Neste contexto, a mais recente frente de batalha entre Nunes e Boulos é uma ação do PSOL questionando os gastos da gestão municipal no Autódromo de Interlagos, na zona sul da capital. O local recebe o festival The Town entre os dias 2 e 10 deste mês.
Um exemplo da antecipação do embate entre Nunes e Boulos são as críticas frequentes que eles têm disparado um contra o outro. Em encontros com empresários, o prefeito já afirmou que “nunca invadiu nada de ninguém”, em alusão a atuação de Boulos no Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). O pré-candidato do PSOL, por sua vez, já chamou o emedebista de “ladrão de dinheiro de merenda das escolas públicas” nas redes sociais. A declaração de Boulos, inclusive, é objeto de um processo por danos morais aberto por Nunes contra o adversário no Tribunal de Justiça de São Paulo. A Corte, porém, rejeitou a ação do prefeito duas vezes.
O confronto entre os dois pré-candidatos, em alguns casos, não acontece diretamente, mas sim por meio de aliados. Recentemente, o vereador Rubinho Nunes (União Brasil), que compõe a base do prefeito na Câmara, protocolou uma representação no Ministério Público de São Paulo (MP-SP) contra Boulos por campanha eleitoral antecipada. No documento, ele cita um evento do qual o pré-candidato do PSOL participou em uma escola municipal em Perus, zona norte da capital, no último dia 19.
Na avaliação de Jairo Pimentel, doutor em Ciência Política pela USP e pesquisador do Cepesp-FGV, a estratégia de tumultuar a campanha adversária com processos judiciais não costuma render mais votos para quem propõe a ação, uma vez que tais questões estão distantes do dia a dia do eleitor. Porém, ele pondera que as contestações na Justiça podem criar entraves para o candidato adversário. “Há também a questão da retaliação”, diz Pimentel, em referência ao clima de polarização entre Nunes e Boulos esperado para as eleições do ano que vem.
De acordo com pesquisa Datafolha, divulgada no último dia 31, Boulos larga na frente na corrida ao Edifício Matarazzo, sede da administração paulistana desde 2004, com 32% das intenções de voto. Mas Nunes aparece logo em seguida, com 24%. O levantamento também traz a deputada federal Tábata Amaral (PSB) com 11% e o deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil) com 8%.
Pimentel conta que a estratégia de judicialização faz mais sentido para Boulos, visto que o PSOL é um partido de oposição ao governo municipal e que dispõe de menos recursos quando comparado à coligação de Nunes. “É uma forma de combater o uso da máquina pública, com ações que mirem a diminuição da avaliação do governo. Ou mesmo que diminuam o ímpeto da situação em utilizar a máquina pública”, diz o pesquisador. O volume de ações do PSOL contra Nunes reforça a avaliação do pesquisador. Nos últimos meses, Boulos e aliados já apresentaram sete ações questionando a gestão Ricardo Nunes no MP e na Justiça.
The Town é nova frente de batalha entre Nunes e Boulos
No início desta semana, o vereador Toninho Vespoli (PSOL) protocolou uma representação no MP-SP solicitando que o órgão investigue o que classificou de “utilização de recursos públicos para financiamento de evento privado”. No documento, o parlamentar acusa a gestão Nunes de gastar ao menos R$ 73 milhões em obras no Autódromo de Interlagos com o objetivo de atender especificamente ao festival The Town, que acontece no local entre os dias 2 e 10 de setembro.
Entre as benfeitorias feitas no autódromo, o texto cita obras de terraplanagem, drenagem superficial e pavimentação. Além disso, a representação enviada ao Ministério Público diz que a Prefeitura também pagou pela iluminação, montagem e desmontagem de palco do festival. O texto ainda argumenta que outros eventos semelhantes realizados no autódromo - como o Lollapalooza, por exemplo - nunca receberam o mesmo tratamento do Executivo municipal.
“É imprescindível apurar por que a Prefeitura investiu milhões em mudanças de estrutura do autódromo que atendem especificamente ao festival. Concordo que é importantíssimo que o administrador público atraia recursos para o município, mas isso nunca deve sobrepor o particular sobre o coletivo”, disse Vespoli.
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Procurada pelo Estadão, a Prefeitura de São Paulo informou que até o momento não foi notificada pelo Ministério Público. Além disso, enfatizou que as melhorias feitas na infraestrutura do autódromo visam reforçar a vocação do espaço em receber grandes eventos internacionais. A gestão municipal já anunciou investimentos de R$ 190 milhões no local. “As obras que estão sendo executadas no circuito aprimoraram a drenagem do local, melhoraram a integração dos espaços para facilitar o deslocamento do público e, com as novas redes de esgoto instaladas, deixa de ser necessária a utilização de banheiros químicos durante os eventos”, informou em nota.
A Prefeitura ainda informou que assinou um termo de parceria com a Rock World, organizadora do festival The Town, “estabelecendo uma correalização entre as partes em relação ao festival”. “A parceria reforça o trabalho da Prefeitura para incrementar ainda mais a economia da cidade. A expectativa é de que, em cinco dias de evento, a economia da cidade movimente R$ 1,7 bilhão”.
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