Ricardo Salles (PL), 47, foi o quarto deputado federal mais votado de São Paulo com 604.918 votos. Conhecido por ser ex-ministro do Meio Ambiente de Jair Bolsonaro (PL), ele começou sua carreira política apadrinhado pelo então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSB). Quando Salles estava no ministério, o índice de desmatamento no governo Bolsonaro atingiu o maior patamar dos últimos 15 anos. Durante uma reunião ministerial em 2020, ele sugeriu aproveitar a distração que a pandemia de covid-19 oferecia e “passar a boiada” para desregulamentar políticas ambientais. Em junho de 2021, pediu demissão após ser alvo de um inquérito que investigava o seu envolvimento com um esquema ilegal de retirada e venda de madeira.
Qual é o papel do estado na preservação (ou não) de pautas como liberdade religiosa, legalização do aborto e das drogas e defesa dos direitos humanos?
Acho que o Brasil como um país cristão, embora seja laico do ponto de vista religioso, é um país cristão sobretudo. Consequentemente, tem um compromisso com esses valores da civilização cristã. Se formos analisando cada um desses temas, em cada um terá uma posição esperada do Estado, seja o representante, quem for. Obviamente o presidente Bolsonaro reeleito, esses princípios todos terão maior peso, e quero crer que em uma remota hipótese de eleição do Lula, esses valores terão menos peso.
Com relação a liberdade religiosa, o Brasil tem assegurada na sua constituição. Isso tem de ser defendido a qualquer custo. Liberdade religiosa é importante para que cada um escolha o culto que quer professar ou eventualmente não tenha religião. Enfim, é um direito de cada um.
Com relação ao aborto, acho que não deve haver nenhuma alteração legislativa nesse sentido. Sou contra a flexibilização das regras com relação ao aborto.
Em relação as drogas, tenho uma visão completamente antagônica a essa que hoje tem sido discutida, que é a da liberalização. Não sou favorável a liberalização e digo mais, acho que deve criminalizar o consumo como qualquer outro crime, qualquer outra receptação de produto ilícito. Também o usuário de drogas está consumindo e, consequentemente, tem que ser equiparado ao receptador, aquele que compra produtos ilícitos de qualquer natureza.
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Com relação a direitos humanos não há dúvida, os direitos humanos são um valor fundamental e universal e como tal deve ser preservado. Agora, não pode ser manipulado. Ele tem de ser um valor inegociável, mas tratado com a firmeza, com a abertura e com a franqueza que o tema requer.
Junto com a bancada conservadora que conseguimos eleger, um dos temas fundamentais é como tratar esse avanço enorme do consumo de drogas, tráfico de drogas e questões relacionadas a entorpecentes e narcotráfico no Brasil e, consequentemente, toda e qualquer proposta que puder ser apresentada, claro que obedecendo os ditames constitucionais, para transformar o usuário, o traficante, o criminoso em penas mais rígidas e com isso diminuir os, vamos dizer assim, os incentivos legais ou sociais ao consumo de drogas eu apoiaria e poderia até ser autor.
Devem ser feitas reformas econômicas no próximo mandato? (teto de gastos, reforma da previdência, reforma tributária) De que forma?
Acho que logo no início do próximo governo, no primeiro semestre do próximo ano, tanto a reforma administrativa quanto a tributária devem ser tratadas com absoluta prioridade. Da mesma forma, as privatizações. O Brasil já está absolutamente maduro e com decisão da sociedade acerca dos benefícios da privatização, incluindo Petrobras, bancos públicos, enfim. Na minha opinião, nós devemos caminhar para a privatização total e absoluta de todas as empresas e bancos públicos.
Há uma máxima na administração pública, já fui três vezes de governo então conheço bem essa realidade, que o ótimo é inimigo do bom. Quem fica discutindo o ótimo eternamente não realiza nem o bom no médio prazo e no curto prazo. Qual a medida que, talvez não resolva todos os problemas, mas que traria um ganho enorme de competitividade e consequentemente de desenvolvimento econômico, melhoraria da qualidade de vida das pessoas? Seria unificar os tributos por nível federativo, ou seja, você ter a unificação das regras de impostos municipais, sobretudo o ISS, em uma única regra para todos os municípios.
Aí você discute lá dentro critérios de tomador e prestador, enfim, como compartilhar esse recurso, mas tratar isoladamente os três níveis tributários, você ter a unificação do ISS, a unificação de todas as legislações estaduais em uma única regra de ICMS, com um módulo assim como o ISS, uma regra para compartilhamento das receitas de origem e destino no ICMS, mas uma regra só nacional.
E da mesma forma unificação e simplificação nos tributos federais. Sem misturar, em um primeiro momento, tributos municipais, com estaduais e federais. Essa mistura de diferentes níveis federativos complica demais o entendimento para uma simplificação e uma melhora do arcabouço tributário e acaba complicando e fazendo com que demore uma questão que pode ser resolvida em curto prazo.
Acho que o teto de gastos deve ser mantido. O teto de gastos é algo importante para dar sempre a indicação de solvência da máquina pública e, consequentemente, ao você demonstrar a sua solvência, capacidade de pagamento, você tem juros menores que são exigidos pelo mercado para rolar dívida e para fazer operações com o governo. O teto de gastos é de fundamental importância.
Você é a favor da permanência do Auxílio Brasil ou de outros programas de renda?
O auxílio é importante, principalmente porque passamos por uma pandemia e as consequências nocivas do desequilíbrio de preços de alimento e energia, em razão da guerra da Ucrânia e da Rússia. Por outro lado, com a economia crescendo, diminui a dependência evidentemente das pessoas em relação ao auxílio Brasil. Sou favorável que, em um segundo momento, nós tenhamos uma espécie de auxílio que incentive a pessoa a arranjar um emprego.
Como você faz isso? Você aumenta o valor que ele for receber de um futuro empregador até um determinado volume, talvez um salário mínimo e meio ou dois, precisa fazer obviamente um estudo de impacto de gastos, mas se nós fizermos isso, nós vamos incentivar as pessoas para que consigam sair dessa dependência do auxílio obtendo um emprego. E aí quem obtiver o emprego recebe um auxílio, um complemento que eventualmente pode até dobrar o seu salário no setor privado.
Acho que já agora nesse primeiro ano você ter manter o auxílio Brasil, mas criar um incentivo para empregabilidade. Ou seja aquele que quiser procurar um emprego conseguir um emprego, né? Não é só querer conseguir.
O que pretende fazer para melhorar a educação no País?
A educação tem que ter meritocracia, seja do lado do aluno, seja do lado dos docentes. Sou favorável às cotas sociais, diferentemente de uma cota simplesmente racial, para aqueles que, com o mérito, com a vantagem de poder passar num vestibular ou numa determinada prova, ganhem bolsas parciais ou totais. Acho que é absolutamente correto.
Por outro lado, do lado dos docentes. Aqui no Brasil, esse princípio de isonomia salarial permanente acaba nivelando por baixo, ou seja, os bons professores que se dedicam, se capacitam e que fazem um bom trabalho, acabam sendo desprestigiados por uma política de isonomia. Da mesma forma, dá os mesmos salários da mesma compensação, os mesmos incentivos. O que que precisamos fazer: criar uma metodologia séria, equilibrada, republicana, que permita que professores e quaisquer outros servidores públicos tenham diferencial de salário por desempenho pessoal. Aí precisa ter uma avaliação de desempenho séria, feita por por alguém que está fora do sistema e não se transforma numa avaliação corporativistas de colegas para as colegas. Isso não vai resolver o problema.
Como a próxima legislatura deve combater a falta de transparência no uso de recursos públicos?
A ideia que surgiu de ter toda e qualquer emenda, seja ela de relator, de bancada ou qualquer emenda, colocada de maneira absolutamente transparente num sistema informativo eletrônico, é muito boa. Essa é uma essa é uma medida que deixa claro que recurso foi para quem foi para usar no quê.
Por outro lado que o orçamento ela é uma peça de execução do Executivo. Não pode o legislativo avançar da forma que vem avançando no orçamento, que cabe ao executivo implementar, porque acaba distorcendo essa correlação entre o papel do executivo que como o nome diz, é executar, e o papel do Legislativo, que, a priori, é legislar. Houve um avanço excessivo. Seria plausível que isso fosse revisto. Esses dados têm que ficar mais claros.
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