RIO – Militares envolvidos na tentativa de golpe de Estado apontada pela Polícia Federal (PF) afirmaram em troca de mensagens obtidas pela corporação que o general Valério Stumpf Trindade, ex-comandante militar do Sul, era um informante do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Nos prints incluídos no relatório final da investigação, militares citam Stumpf como “leva e traz” do “ovo”, como Moraes é chamado por bolsonaristas nas redes sociais. De acordo com a PF, após o resultado do segundo turno das eleições presidenciais de 2022, e a derrota do então presidente Jair Bolsonaro (PL), “as trocas de mensagens entre os investigados se tornam mais extremadas, evidenciando o intento golpista, inclusive de forma mais agressiva aos integrantes do alto comando do Exército”.
No dia 15 de novembro de 2022, o coronel Bernardo Romão Corrêa Netto, acusado de integrar o núcleo que incitava outros militares a aderirem ao golpe, encaminhou para Fabrício Bastos cinco fotografias com nomes de generais da ativa do Exército, que estavam se posicionando contrários ao golpe de Estado.
Entre os generais identificados por Corrêa Netto estão os então comandantes do Nordeste, do Sul e do Sudeste: Richard Nunes, Valério Stumpf e Tomás Ribeiro Paiva. Segundo a PF, os generais foram alvos “de vários ataques orquestrados pela organização criminosa pelo fato de terem se posicionado contrários à ruptura institucional”.
“A partir desse momento, o modus operandi da milícia digital é empregado pela organização criminosa para pressionar, atacar e expor os generais contrários ao golpe de Estado”, diz a PF.
O Estadão busca contato com os citados, mas até o momento não conseguiu localizar a defesa dos oficiais citados pela Polícia Federal.
As mensagens em que os investigados indicam a presença de “um informante” entre os militares teriam sido trocadas entre o tenente-coronel do Exército Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros, alvo da Operação Tempus Veritatis, e o ex-ajudante de ordens da Presidência, tenente-coronel Mauro Cid.
A análise do telefone celular de Cavaliere identificou que, em 2023, Mauro Cid “tinha ciência de que algo ainda estava por acontecer, que no seu entendimento seria bom para o Brasil”, segundo a PF. No dia 4 de janeiro daquele ano, Cavaliere questiona se “ainda tem algo para acontecer?”, referindo-se, possivelmente, a uma ruptura institucional.
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Mauro Cid encaminha duas respostas, que foram apagadas. Diante do conteúdo das mensagens apagadas, Cavaliere pergunta: “Coisa boa ou coisa horrível?” e, em seguida, diz: “Bom”. Cid em resposta à pergunta do tenente-coronel diz: “Depende para quem. Para o Brasil é boa”. O diálogo, segundo a PF, ocorre quatro dias antes do 8 de janeiro de 2023, “quando há uma nova tentativa de consumação do golpe de Estado e abolição violenta do Estado de Direito”.
Cavaliere encaminha para Mauro Cid quatro prints de uma conversa com o interlocutor de nome Riva. Nas mensagens, Riva encaminha o que seriam informações de uma reunião entre Bolsonaro e o ex-vice-presidente Hamilton Mourão e outros generais. Riva diz que Mourão negociou com outros generais a saída do Jair Bolsonaro, chamado de “01″.
“Estou escutando a história do Mourão e estou abismadooooooo. Fora os outros GEN. Na REUNIÃO com o 01 o que eles fizeram”, escreveu Riva.
“Q o Mourão negociou com outros Generais a saída do 01, falando que o Peru era logo ali; Rasgaram o documento que o 01 assinou; Estava em reunião com o vice da China com relação a Huawei aqui no Brasil. Tinha informante do (emoji de ovo) e leva e trás “, complementou.
Em resposta, Cavaliere cita o nome do general Valério Stumpf e recebe um “sim” como resposta: “Outro amigo do FHC. Negociando cargos no governo para parentes inclusive”, diz Riva.
Na sequência, Riva finaliza dizendo que os militares rasgaram o documento que Bolsonaro tinha assinado, segundo a PF, “possivelmente se referindo ao decreto de golpe de Estado”. E passam a atacar os integrantes do alto comando do Exército.
O general Valério Stumpf nasceu em 26 de fevereiro de 1960, em São Gabriel (RS). Entrou no Exército em 1975, na Escola Preparatória de Cadetes e foi declarado Aspirante-a-Oficial da Arma de Cavalaria em 1981, sendo classificado no 3° Regimento de Cavalaria Mecanizado, em Bagé (RS).
Durante a carreira militar, Stumpf foi Observador Militar da Força de Paz da ONU em Angola e na Iugoslávia. Desempenhou ainda as funções de instrutor da Academia Militar das Agulhas Negras, da Escola de Aperfeiçoamento de Oficias e da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército. Serviu como oficial do gabinete do Comandante do Exército e foi assessor militar no Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República nos anos de 1999 a 2003, durante a gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Em 2018, foi nomeado para o cargo de secretário-executivo do Gabinete de Segurança Institucional no fim da gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB). Antes, ocupava o posto de subcomandante de Operações Terrestres, em Brasília.
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