BRASÍLIA - O Senado aprovou nesta quarta-feira, em primeiro turno, proposta de emenda à Constituição (PEC) que extingue o foro privilegiado por crimes comuns para todas as autoridades, com exceção dos chefes dos Três Poderes – os presidentes da República, da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal (STF). A proposta contou com 75 votos a favor e nenhum contra.
A votação no Senado antecipou um julgamento no STF, marcado para o fim de maio, que poderia restringir os casos envolvendo políticos que hoje são julgados pela Corte. Segundo o relator da proposta, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), cerca de 35 mil pessoas possuem foro privilegiado nos tribunais do País, incluindo governadores, desembargadores e conselheiros de tribunais de contas. Com o fim do foro, todos passariam a ser julgados na primeira instância da Justiça.
Por se tratar de uma PEC, o projeto ainda terá de ser votado em segundo turno no plenário do Senado antes de ser encaminhado para a Câmara. A previsão é de que isso ocorra apenas no mês que vem.
Se promulgada, a PEC terá impacto direto nas investigações da Operação Lava Jato. À exceção dos chefes dos Três Poderes, todos os políticos investigados no STF passarão a ter seus processos tocados por juízes de primeira instância.
Votação. A votação do texto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) não estava prevista, mas foi incluída de última hora após acordo negociado entre o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e líderes partidários.
Ao se antecipar ao Supremo e votar a PEC a toque de caixa, os senadores também tiveram como objetivo evitar que o Supremo decida sobre tema que, por princípio, deveria ser debatido pelo Congresso.
A proposta original, de autoria do senador Alvaro Dias (Rede-PR), não admitia exceções. Após acordo, porém, o relator, Randolfe, acatou uma emenda do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), que estabelece que os chefes dos Três Poderes continuam sendo julgados pela Suprema Corte mesmo em caso de infrações penais comuns.
Em casos de crime de responsabilidade, a legislação continua como está: ministros de Estado, comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, membros dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União e chefes de missão diplomática de caráter permanente continuam com foro privilegiado. Já em casos de crime responsabilidade contra as demais autoridades, o julgamento cabe ao Congresso Nacional.
“O foro por prerrogativa de função, o chamado foro privilegiado no Brasil, que contempla quase 35 mil autoridades, da forma como está, estabelece dois tipos de cidadãos em nosso País. Um cidadão de uma casta privilegiada, que tem uma espécie de tribunal especial, e outros, que são julgados por qualquer juiz ou tribunal”, ressaltou Randolfe no plenário.
Após o encerramento das discussões, os líderes convocaram suas bancadas para a aprovação do texto. “Quando Montesquieu (político e escritor francês dos séculos 17 e 18) pensou o sistema de pesos e contrapesos foi porque ele se convenceu de que o homem tende a abusar da autoridade. Por isso, é muito importante a presença de todos aqui, no plenário”, afirmou o líder do PMDB, senador Renan Calheiros (AL).
‘Sessão histórica’. Após declarar o resultado, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), considerou como histórica a sessão que aprovou o primeiro turno da PEC do fim do foro e a atualização das regras de abuso de autoridade.
“Acabamos com o foro dito privilegiado não para os 600 parlamentares e ministros, mas para todas as 35 mil pessoas que detêm direito a essa prerrogativa de função. Do vereador ao membro do Conselho Nacional de Justiça”, afirmou Eunício. “Ao mesmo tempo regulamos o combate de abuso de autoridades. Uma excrescência que afeta o cidadão diariamente, a chamada carteirada na fila de cinema; a prisão injusta, dos maus tratos nas prisões; nas delegacias”, emendou.
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