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Opinião | A linha que une os ataques no Equador, a política argentina e o 8 de Janeiro, no Brasil

Urgência das pessoas em buscar soluções rápidas é um problema que entrou também no mundo da política

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Foto do author Sergio Denicoli

Há uma clara linha que conecta os recentes acontecimentos no Equador, na Argentina e até mesmo as fatídicas invasões aos poderes em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023. Essa linha é algo muito relacionado à aceleração dos tempos atuais e à simplificação do debate político. Trata-se da urgência das pessoas em buscar soluções rápidas para todo tipo de problemas, inclusive os mais complexos.

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A política, que ocupou as redes sociais, entrou no ritmo determinado pela guerra narrativa algorítmica, que faz com que posts e memes sejam difundidos e compartilhados a uma velocidade estratosférica, gerando uma ansiedade eleitoral constante.

É uma doença digital, que faz com que os eleitores escolham para os representar personalidades que se enquadrem no arquétipo do super-herói. Alguém que possa usar superpoderes para resolver todas as aflições, quase que instantaneamente.

As fatídicas invasões aos Poderes em Brasília se relacionam com os acontecimentos no Equador e na Argentina pela aceleração dos tempos atuais e a simplificação do debate político Foto: Wilton Junior/Estadão

Além de buscarem essas personagens, esses eleitores ainda cobram delas soluções ininterruptamente, 24 horas por dia, pressionando por ações imediatas.

O mais recente exemplo dessa patologia cibernética vem do Equador, que esta semana figurou como um dos assuntos mais falados no Twitter, no mundo todo. O presidente do país, Daniel Noboa, foi um dos que acreditaram em suas próprias ilusões. Com uma canetada, buscou extinguir facções criminosas que há décadas assolam o País.

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Motivado pelo superpoder que acredita possuir, decretou Estado de Exceção, após a fuga da prisão de um dos líderes do mundo do crime equatoriano. Uma decisão que garante ao presidente a possibilidade de subverter o Estado de Direito, em nome do bem comum, com base na instrumentalização das Forças Armadas. Como retaliação, diversas facções colocaram ações terroristas em prática, sendo a mais escandalosa a invasão de um estúdio de TV, para mostrar ao vivo a decadência equatoriana e o domínio da sociedade pelo crime.

Na Argentina, Javier Milei busca a todo custo impor seu plano de 664 artigos, que altera mais de 50 leis e que prevê, entre outras questões, a possibilidade do presidente obter plenos poderes para governar por decretos. Inicialmente visto como uma esperança diante do caos que o País enfrenta, Milei agora começa a gerar desconfianças no mercado e na população, em relação à solução que apresentou. Está também aprendendo que não é um super-herói, que não conseguirá governar sem negociar com seus pares e com a sociedade, e que não há soluções mágicas.

No Brasil, a ilusão ocorreu em torno da ideia de que um poder militar ditatorial corrigiria os erros do País e traria a ordem social e econômica. Algo que alimentou corações e mentes durante meses, após as eleições, culminando com a depredação nas sedes dos três poderes, uma semana após o novo governo ter tomado posse. Um delírio que acabou de completar um ano.

O que há de mais comum entre esses três episódios, além da utópica ideia de que um único governante com amplos poderes pode resolver qualquer questão, é algo que beira a inocência. É acreditar que, em estados corrompidos, as instituições funcionarão de forma distinta, ilibada e protegida das pressões externas.

Se o crime domina o Equador a ponto de coordenar ações terroristas em todo o País, ele está, inevitavelmente, infiltrado também nas forças militares e em outros campos. Se a Argentina sofre com o déficit, que há décadas compromete suas contas, é porque tal cenário beneficia grupos que também estão enraizados no poder. Se o Brasil carece de ordem, é porque a corrupção e a ilicitude já se capilarizaram, enfraquecendo os braços que poderiam se voltar contra isso.

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Portanto, não é de super-heróis que os países precisam, mas sim de inteligência, diplomacia e planejamento. Ações intempestivas, cujas consequências não são medidas, não trazem soluções e só ampliam os problemas.

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As redes sociais não são o mundo real. A lacração que garante votos não garante governabilidade. A estridência transmitida em lives diárias só sobressalta a todos, criando um ambiente maniqueísta, aquele onde o bem vence o mal apenas nos filmes.

As democracias estão regredindo na sua capacidade representativa, a ponto de a população flertar com o autoritarismo. Mas isso já existiu e não funcionou, deixando chagas abertas até hoje. Não há caminho seguro fora da própria democracia, mas é preciso resgatá-la de seus algozes e isso se faz com liderança, união e perspicácia, utilizando o que ainda está saudável no sistema para combater o que está errado.

Partir para regimes de exceção vai apenas resultar em mais sofrimento, por isso as vozes das redes devem ser consideradas com parcimônia, mais como um apelo por uma vida melhor, por parte dos cidadãos, do que como um manual de ação governamental.

É preciso salvar a política do ambiente mordaz e insalubre da internet desregulada e colocá-la novamente no ambiente do debate público sério, encabeçado por especialistas em suas respectivas áreas, e não baseado em opiniões passionais de quem não tem a menor ideia de como solucionar a intrincada teia perversa que influencia na tomada de decisões, nas mais diversas esferas de poder.

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Opinião por Sergio Denicoli

Autor do livro TV digital: sistemas, conceitos e tecnologias, Sergio Denicoli é pós-doutor pela Universidade do Minho e pela Universidade Federal Fluminense. Foi repórter da Rádio CBN Vitória, da TV Gazeta (Globo-ES), e colunista do jornal A Gazeta. Atualmente, é CEO da AP Exata e cientista de dados.

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