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Opinião|Associação da política com narcotraficantes e milícias é intensa nas redes

Narrativa de envolvimento da política com grupos criminosos está tão consolidada que é até foco de disputas eleitorais, com os grupos ideológicos se acusando de operarem junto com criminosos

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Foto do author Sergio Denicoli

O Brasil parece viver um surto de negação em relação à criminalidade. Todos os Estados do País estão afundados na insegurança diária, no tráfico de drogas, nos roubos e assaltos, nos altos índices de homicídio. No entanto, as lideranças políticas, governos, assembleias legislativas e prefeituras deixam em segundo plano o combate a essa que é a questão mais grave do País hoje, porque atinge a todos. Há uma falta de enfrentamento direto desse problema, que tem sido usado para alimentar discursos demagógicos.

É fato que as polícias necessitam de mais estrutura, mas ninguém duvida que, mesmo nessas instituições responsáveis pela segurança dos cidadãos, o crime tem se infiltrado. E não há nem um movimento sequer para tirar das forças policiais quem se submeteu ao crime, o que acaba por prejudicar o bom policial, um profissional fundamental nesta terrível fase que o Brasil atravessa.

Chiquinho Brazão teve a prisão mantida pela Câmara dos Deputados por apenas 20 votos de diferença Foto: WILTON JUNIOR/ ESTADÃO

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Além disso, há ainda a espetacularização de criminalidade. TVs, portais de notícia, perfis e páginas das redes sociais que têm a violência como foco, utilizam as atrocidades diárias como fontes para promover um entretenimento mórbido que, muitas vezes, utiliza até mesmo o humor, a ironia e o sarcasmo para falar de casos bizarros, que já não chocam ninguém, porque são vistos como corriqueiros. Um sinal de falência social.

Essa anestesia há muito ultrapassou os limites do tolerável, pois as pessoas estão reféns da violência e são obrigadas a mudar hábitos e rotinas para não colocar a própria vida em risco.

Recentemente, ficou mais explícita a penetração do crime nas gestões públicas. Escândalos envolvendo propinas e esquemas para entregar parte do orçamento do Estado a empresas montadas por narcotraficantes eclodiram, mas foram rapidamente absorvidos pela normalização do terror e pela inação dos que deveriam atuar fortemente para coibir essa captura das instituições, que está em curso.

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O caso Chiquinho Brazão foi emblemático. Um deputado acusado de ser mandante de um assassinato que teria sido cometido devido a questões ligadas ao loteamento de terras em áreas da milícia da zona oeste carioca, conseguiu 277 votos na Câmara para que deixasse a prisão. Por uma diferença de apenas 20 votos ele foi mantido em cárcere.

A desculpa de que a Câmara não poderia abrir precedentes por não haver flagrante foi lamentável. Na lógica de quem votou pela liberação de Brazão, um deputado que violasse crianças, por exemplo, também deveria ser solto se não houvesse flagrante. Algo que não encontra sentido e que, inclusive, não pesou na conta quando a Câmara manteve a prisão de Daniel Silveira.

Nas redes, as pessoas não demonstram pudores e dizem que a política está atolada no crime. Um grande volume de internautas acredita que grupos como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e as milícias cariocas possuem tentáculos nos poderes constituídos.

A AP Exata Inteligência Digital coletou 48 mil menções ao PCC e às milícias, no X, nos últimos 30 dias, e constatou que essas facções estão sendo amplamente associadas ao universo da política.

No caso do PCC, as cinco hashtags mais utilizadas quando o termo é mencionado são: Brasil, CV, Corrupção, LulaLadrão e BolsonaroFrouxo. Em relação às milícias, as hashtags que mais aparecem são ExtremaDireita, Bolsonaro, Familícia, Micheque e ForaMiliciano.

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Essa narrativa de envolvimento da política com grupos criminosos está tão consolidada que é até foco de disputas eleitorais, com os grupos ideológicos divergentes se acusando mutuamente de operarem junto com narcotraficantes e milicianos. No entanto, essa consciência não se traduz em ações efetivas para combater a expansão do crime organizado.

Diante do agravamento contínuo da situação, surge a inquietante interrogação: será que já é tarde demais para agir? A normalização da violência e a conivência com a impunidade corroem os alicerces da democracia e sequestram a máquina pública. Mas a história nos ensina que a mudança é possível, mesmo nas circunstâncias mais adversas. Para alterar essa realidade, a sociedade e suas lideranças precisam ter a determinação e a coragem necessárias para romper com o ciclo vicioso que aprisiona o País, ou deixarão que a inércia prevaleça, relegando o Brasil a um futuro sombrio.

Opinião por Sergio Denicoli

Autor do livro TV digital: sistemas, conceitos e tecnologias, Sergio Denicoli é pós-doutor pela Universidade do Minho e pela Universidade Federal Fluminense. Foi repórter da Rádio CBN Vitória, da TV Gazeta (Globo-ES), e colunista do jornal A Gazeta. Atualmente, é CEO da AP Exata e cientista de dados.

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