O episódio da aprovação do nome de Flávio Dino para o STF arrastou para as controvérsias da política brasileira um nome que há alguns anos era tido como um grande artífice da moralização do País. Trata-se do ex-juiz Sérgio Moro, que ascendeu com um forte discurso antipolítico, escancarando as relações entre lideranças, partidos e empresas que, durante muito tempo, foram a base das articulações envolvendo o financiamento de campanhas e a manutenção de nomes que ocupavam cargos de poder no Executivo e Legislativo.
O tempo, no entanto, fez com que o ex-juiz cedesse aos encantos do poder que emanam de Brasília, primeiramente ao aceitar assumir um ministério do governo que ascendeu diante dos escombros provocados pela Operação Lava Jato e, posteriormente, se candidatando a Senador, para integrar um sistema do qual era um crítico veemente.
A metamorfose de Moro e sua aptidão para navegar tão desenvolto nos bastidores do poder deixam seu modus operandi político nitidamente parecido com aqueles que um dia ele condenou. O episódio revelado pelo Estadão, no qual o senador recebe uma mensagem via WhatsApp, falando que ele deveria manter seu voto secreto em relação à indicação de Flávio Dino, não cedendo à pressão das redes, mostra a mudança do homem que gostava de lançar luz às conversas privadas do mundo político.
As menções a Flávio Dino nas redes sociais cresceram 71%, após ele ter seu nome homologado pelo Senado. E entre os 10 termos mais associados aos posts sobre a aprovação do ex-governador do Maranhão para compor o STF aparecem apenas três nomes de políticos: Lula, Bolsonaro e Sérgio Moro.
Lula e Bolsonaro são citados no contexto da dicotomia esquerda X direita. Já Sérgio Moro surge como alguém que abraçou Flávio Dino e que abraçou também a dissimulação dos que tentam fazer um jogo dúbio, de forma a agradar esferas de poder e a tentar não desagradar os seus eleitores. Puro suco da política brasileira.
Nas buscas do Google, “Moro Dino” tem sido o termo mais pesquisado por quem procura informações a respeito do senador, após a revelação da conversa indigesta do ex-juiz.
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Moro enfrenta, nas redes, a ira da direita, que fez uma ampla campanha contra a nomeação de Dino, taxando-o de “comunista”, “anticristão” e buscando narrativas que tentavam associá-lo ao tráfico de drogas e ao suposto crescimento da criminalidade no país.
O ex-juiz parece não ter entendido o que estava em jogo para os seus eleitores. Vindo da seara antilulista e eleito por um dos estados mais bolsonaristas do Brasil, Sérgio Moro agora pagará o preço pela falta de um posicionamento claro diante de um tema tão importante e visceral na guerra política atual.
A chegada de Dino ao Supremo sinaliza uma politização da Corte, conforme já referimos anteriormente, mostrando que, nas redes, tanto esquerda quanto direita concordam com essa premissa. E o silêncio estratégico de Sérgio Moro diante desse episódio ressoa como um eco revelador do barulho político no Brasil. Antes aclamado como defensor da moralidade e crítico contundente do establishment, Moro agora revela sua nova face, bem adaptada aos movimentos de Brasília.
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