EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

As relações entre Executivo e o Congresso

Opinião | Futuro Banco Central terá espaço para subir juros se necessário

Sinais recentes de Lula e da equipe econômica mostram que alta dos juros, ainda que indesejada, não seria um tabu

PUBLICIDADE

Foto do author Silvio Cascione
Atualização:

A disparada do dólar entre julho e o início de agosto trouxe algumas lições sobre a política econômica do governo Lula. Em especial, a respeito do Banco Central e da estratégia para os juros, que podem voltar a subir ainda neste ano, sem interferência direta do Planalto.

Basta ver a retórica adotada por Gabriel Galípolo, favorito à sucessão de Roberto Campos Neto na presidência da autoridade monetária. Até algumas semanas atrás, ainda havia dúvidas sobre a postura dele diante de um difícil dilema: agradar ao mercado, prometendo medidas duras para manter a inflação sob controle, ou agradar a Lula e aos petistas? Mas, a cada manifestação pública, Galípolo tem deixado clara sua posição, sendo o primeiro dentre os atuais diretores do BC a reforçar a ameaça de que os juros subirão, sim, se necessário. A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, disse que a ameaça do BC é um “tapa na cara” do país, mas Galípolo tem insistido.

Gabriel Galípolo, possível sucessor de Roberto Campos Neto no Banco Central, tem indicado que pode aumentar juros Foto: Wilton Junior/Estadão

PUBLICIDADE

O importante não é só a posição de Galípolo, mas a de Lula e do governo como um todo. O silêncio do presidente sobre as falas do seu “menino de ouro”, junto com o apoio a medidas de contenção fiscal “custe o que custar”, indicam que Lula quer uma trégua nas brigas com o BC e o mercado para evitar uma escalada sem fim. Perto dos R$ 6, o dólar alto inevitavelmente pressionaria os preços, e começaria a representar um risco sério para a reeleição do presidente em 2026. Reeleição que, por enquanto, segue bastante factível, dado o índice de aprovação do governo. Se o governo não está em desespero, não há motivo para esticar ainda mais a corda.

Há outro fator a considerar no cenário para o Banco Central: a relação pessoal de Lula com o BC. Por enquanto, há uma desconfiança total; tudo que Campos Neto diz ou faz é visto como suspeito de segundas intenções, com o objetivo oculto de enfraquecer o governo. Quando Lula tiver o seu indicado na presidência, ele estará mais tranquilo, e até mais aberto a ouvir argumentos contrários à queda dos juros sem pensar em teorias conspiratórias.

É verdade que, do ponto de vista dos juros, os próximos dois anos tendem a ser um período frustrante para o governo: ainda que os juros caiam, dificilmente eles irão muito longe, dada a incerteza fiscal e o cenário global. Ou seja, Lula ainda reclamará dos juros altos, por bastante tempo. Ninguém no governo gosta de juros.

Publicidade

Mas, com Lula um pouco mais calmo, ou mais contido, Galípolo – ou quem quer que assuma a posição de Campos Neto – tem espaço para uma gestão mais firme da política monetária.

Opinião por Silvio Cascione

Mestre em ciência política pela UNB e diretor da consultoria Eurasia Group

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.