Soraya Thronicke passa de candidata improvável a opositora de antigos aliados bolsonaristas

Eleita senadora na onda de direita de 2018, advogada deixou a base do governo na pandemia

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Foto do author Adriana Ferraz
Por Adriana Ferraz e João Scheller
Atualização:

“O seu voto não é por um candidato, o seu voto é contra a corrupção, é contra a ideologia marxista, é contra o desarmamento e é a nossa única chance de salvar o Brasil. É Jair ou já era”, dizia a então candidata Soraya Thronicke a poucos dias da eleição de 2018, com sinal de arminha na mão.

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Apresentada ao eleitorado de Mato Grosso do Sul como a “senadora de Bolsonaro”, a advogada foi eleita e seguiu alinhada com o governo federal, até que veio a pandemia. De aliada a “traíra”, como afirmam os bolsonaristas, Soraya viu-se candidata à Presidência na última hora e, independentemente do vencedor, a porta ficará aberta para o seu partido, o União Brasil, compor o futuro governo.

O União Brasil decidiu lançar Soraya como candidata à Presidência da República em agosto, depois de o presidente da legenda, deputado Luciano Bivar (PE), desistir de ser candidato ao Palácio do Planalto para tentar a reeleição como parlamentar. O União Brasil é fruto da fusão entre o PSL, legenda que elegeu Bolsonaro em 2018, e o DEM, que rechaça apoio a Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Soraya colou sua imagem no então candidato Jair Bolsonaro para se eleger senadora em 2018 Foto: MateriaReprodução

Destaque nos debates pelas pegadinhas e frases de efeito em confrontos diretos com Bolsonaro, a quem chegou a chamar de “tchutchuca” no encontro da Band, Soraya vai aos poucos colhendo os frutos de se tornar um nome conhecido além de Mato Grosso do Sul ao mesmo tempo que desfruta do conforto de ter mais quatro anos de mandato de senadora pela frente.

Soraya Thronicke (União Brasil) participa de debate promovido por 'Estadão', Rádio Eldorado e outros veículos de imprensa nos estúdios do SBT. Foto: ALEX SILVA/ESTADÃO

Aos 49 anos, ela embarcou numa campanha calcada basicamente em uma proposta só: o imposto único, defendido há mais de 30 anos pelo candidato a vice na chapa, Marcos Cintra. O ex-secretário da Receita Federal de Bolsonaro acompanha os passos de Soraya e, quando preciso, entra em cena para explicar como se daria a cobrança, sempre ressaltando que não se trata de uma nova CPMF.

Soraya diz que o tributo é “insonegável” e que, após sua implementação, será possível isentar professores do pagamento de Imposto de Renda e acabar com a contribuição previdenciária recolhida por patrões e empregados. O resultado é uma “cervejinha” mais barata, diz ela nas inserções de TV e rádio, e mais alimentos no prato do brasileiro.

Vice na chapa, Marcos Cintra (União) costuma acompanha Soraya nos eventos de campanha. Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO

Palanque duplo

Sem capilaridade regional e com recursos limitados do partido, apesar de o União Brasil dispor de mais de R$ 700 milhões do fundo eleitoral, Soraya firmou base em São Paulo e pouco roda o País. Foram oito Estados visitados e poucos apoios declarados. Em algumas localidades, ainda divide o palanque de seu próprio partido com políticos que publicamente votam em Bolsonaro. “Não sou ciumenta”, disse ao Estadão.

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A candidata também diz não ter se arrependido de votar e ter pedido votos ao então deputado federal em 2018. “Eu acreditei, eu tive esperança. Hoje, tenho decepção”, costuma afirmar a quem questiona sua trajetória política que, por sinal, teve início de cima de um caminhão de som, ainda durante as manifestações pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Nas ruas, quase sempre vestida de verde e amarelo, a hoje senadora engrossava também o coro da defesa da Lava Jato e chegou a pedir, em dezembro de 2017, a volta do voto impresso. “Que joguem essas porcarias de urnas eletrônicas lá na Venezuela. Que a gente volte a ter só voto impresso”, discursou, ofegante, para uma plateia anti-PT em Campo Grande.

Ao trocar Dourados, no interior de Mato Grosso do Sul, por Brasília, Soraya chegou rapidamente ao posto de vice-líder do governo no Congresso e, apesar de criticar, indicou recursos do orçamento secreto – foram R$ 95,2 milhões, nos últimos três anos.

Mas as falas a favor de bandeiras bolsonaristas foram, aos poucos, dando espaço a um tom institucional, com exceção dos debates. Ao dizer que não seria aconselhável Bolsonaro cutucá-la com “sua vara curta” e que o Padre Kelmon (PTB), que não é reconhecido pela Igreja Sirian Ortodoxa de Antioquia do Brasil, da qual diz fazer parte, é, na verdade, um “padre de festa junina”, a senadora viralizou nas redes.

Soraya chegou ao fim da campanha chamando mais atenção para sua posição diante dos adversários do que necessariamente por suas propostas. De candidata improvável, virou a lacradora da eleição.

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