Telegram repete Google, diz que PL das Fake News acaba com liberdade e estimula cerco a deputados

Recado transmitido aos usuários do canal oficial da plataforma elenca motivos pelos quais Telegram é contra texto; autoridades reagem à iniciativa

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Foto do author Isabella Alonso Panho
Atualização:

O aplicativo de mensagens Telegram enviou para seus milhões de usuários, na tarde desta terça-feira, 9, uma mensagem contrária ao Projeto de Lei das Fake News, que está em discussão na Câmara dos Deputados, sob a relatoria do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). A plataforma chama a proposta de “desnecessária” e diz que ela “concede poderes de censura ao governo”.

O texto foi veiculado no canal “Telegram Brasil”, usado para comunicações oficiais da plataforma no País. Assim como o Google, o aplicativo de mensagens usou sua plataforma para criticar a proposta legislativa. O texto começa falando que “a democracia está sob ataque no Brasil” e que o projeto “matará a internet moderna”. Segundo a mensagem, o Telegram poderá fechar as portas caso o PL das Fake News seja aprovado com o texto atual.

Mensagem enviada aos usuários da rede na tarde desta terça, 9, mostram as razões pelas quais a plataforma é contra o projeto de lei Foto: Reprodução/Telegram Brasil

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O Telegram ainda indica que os usuários devem procurar deputados para convencê-los a rejeitar o projeto. No final da mensagem, há um título “O que você pode fazer para mudar isso”, com um link que direciona os leitores para uma página do site da Câmara, com os nomes e os contatos de todos os deputados federais.

A iniciativa da plataforma levou a reações no mundo político e jurídico. Orlando Silva, relator do PL das Fake News, afirmou ao Estadão que a postura do Telegram é “inaceitável” e cobrou uma reação do Congresso. Já a Procuradoria da República em São Paulo deu dez dias para a big tech explicar a mensagem distribuída aos usuários. Ministros, secretários e políticos foram às redes sociais se manifestar contra a plataforma digital.

‘Poderes de censura’

O primeiro tópico da nota veiculada no canal “Telegram Brasil” diz que o PL das Fake News “concede poderes de censura ao governo”, porque ele poderia limitar “o que pode ser dito online” sem ordem judicial. O texto original do PL previa a criação de um órgão governamental para fazer esse controle, mas Orlando Silva retirou o item da proposta.

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O texto do Telegram também faz referência ao ministro da Justiça, Flávio Dino, que pediu explicações à plataforma durante a onda de ataques violentos às escolas. Wadih Damous, secretário nacional do Consumidor, órgão vinculado ao Ministério da Justiça, disse que notificará o Telegram por causa da mensagem. “O Telegram repete ataques já desferidos por suas congêneres contra o PL 2.630 através de informações falsas. O debate deve ser equilibrado”, afirmou o secretário.

O Telegram, por sua vez, menciona um possível estado de “vigilância permanente”, caso o Congresso aprove o PL. “Para evitar multas, as plataformas escolherão remover quaisquer opiniões relacionadas a tópicos controversos, especialmente tópicos que não estão alinhados à visão de qualquer governo no poder”, diz a empresa.

O aplicativo de mensagem também acusa o PL das Fake News de “burlar” as leis que já existem para a penalização de conteúdos falsos divulgados na internet. Segundo o comunicado, o texto permite que “uma única entidade administrativa regule o discurso, sem supervisão judicial independente e prévia”.

Meta e Google foram mencionados no final do texto, como um “exemplo” que o Telegram estaria seguindo. “É por isso que Google, Meta e outros se uniram para mostrar ao Congresso Nacional do Brasil a razão pela qual o projeto de lei precisa ser reescrito.”

A Meta publicou uma nota em seu site refutando o texto do Telegram. “A Meta refuta o uso de seu nome pelo Telegram na referida mensagem, e nega as alegações no texto”, diz a manifestação. Na noite desta terça, o Google também emitiu um comunicado similar por meio da sua assessoria de imprensa. A plataforma disse: “No texto, somos citados sem qualquer autorização e não reconhecemos seu conteúdo”.

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Outras plataformas

Um dos pontos mais delicados do PL para as plataformas de redes sociais é a possibilidade de que sejam penalizadas pela veiculação de notícias falsas, com multas que vão de R$ 50 mil a R$ 1 milhão, por hora de descumprimento. Administrativamente, também podem ser punidas com advertência, suspensão temporária e uma multa de 10% sobre o seu faturamento.

Além disso, caso a proposta legislativa se torne lei, as big techs terão de remunerar conteúdo jornalístico linkado nos seus serviços.

No dia 1.º de maio, véspera da votação do PL das Fake News na Câmara, o Google incluiu na sua página inicial de buscas um link que direcionava usuários para um artigo, assinado por Marcelo Lacerda, diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas da empresa no Brasil, repudiando a proposta. No dia 2, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), adiou a votação.

Usuários que clicavam na mensagem eram direcionados para artigo de opinião do Diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas do Google Brasil, Marcelo Lacerda, que acusou o PL de 'aumentar a confusão entre o que é verdade e mentira no Brasil'. Foto: Reprodução

O Supremo Tribunal Federal (STF) e o governo reagiram às investidas das bigh techs. A Secretaria Nacional do Consumidor notificou o Google para retirar o link da sua página inicial em duas horas, sob pena de uma multa de R$ 1 milhão por hora. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) abriu uma investigação sobre o Google e a Meta (que administra Facebook, Instagram e WhatsApp) por abuso de poder econômico pela suposta disseminação de notícias falsas sobre o PL.

No âmbito da Justiça, o ministro Alexandre de Moraes determinou que a Polícia Federal ouça os presidentes de Google, Meta, Spotify e Brasil Paralelo, para que expliquem posturas adotadas contra o projeto de lei. Há a suspeita de que o Google tenha adulterado resultados de pesquisas para induzir usuários.

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O Telegram ficou de fora dessa primeira rodada de pressões. Recentemente, o aplicativo esteve na mira da Justiça e chegou ter uma ordem de suspensão de funcionamento. Contudo, o Telegram obteve uma liminar no mesmo dia revertendo a decisão e continua operando.

Repercussão

Dino usou o Twitter para criticar o Telegram. “‘A democracia está sob ataque no Brasil’. Assim começa um amontoado absurdo postado pela empresa Telegram contra as instituições brasileiras”, afirmou o ministro. Ele questiona, então, qual o objetivo da empresa: “O que pretendem? Provocar um outro 8 de janeiro? Providências legais estão sendo tomadas contra esse império de mentiras e agressões”, afirmou.

Já o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que recorreu ao STF para contestar a iniciativa do Telegram. “Protocolamos no STF petição em função dos ataques do Telegram ao PL 2.630, utilizando sua plataforma para manipular a opinião pública a favor de seus interesses. Uma pena que o Telegram tenha notificado seus usuários de que a democracia estava sob ataque com 4 anos de atraso”, escreveu o senador, também no Twitter.

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