Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) exploram um tiroteio em Paraisópolis que interrompeu agenda do ex-ministro e candidato ao governo de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos) para investir em uma tese de "atentado" contra o político e atacar a candidatura do petista Luiz Inácio Lula da Silva. A versão não é confirmada pela Polícia Civil, que considera a suspeita de tentativa de atentado pouco provável e diz que informações preliminares apontam para um confronto motivado pela presença das forças policiais na região.
Em seu Twitter, Tarcísio de Freitas escreveu que ele e a sua equipe foram "atacados por criminosos", mas que todos estão bem e que um bandido foi baleado. Depois, no entanto, a assessoria do candidato mudou o tom e passou a classificar o episódio para a imprensa como uma "tentativa de intimidação". O governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB), que declarou voto em Tarcísio no segundo turno, afirmou no Twitter que determinou "a imediata investigação do ocorrido".
Houve uma série de postagens de bolsonaristas na sequência, prestando solidariedade a Tarcísio sobre o ocorrido, insinuando que o mando do suposto ataque seria da esquerda ou do adversário no segundo turno Fernando Haddad (PT) e ironizando a agenda de Lula no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, que ocorreu sem incidentes. O termo "atentado" entrou nos trending topics e acumulou mais de 170 mil tuítes em poucas horas.
A lista dos assuntos mais virais na plataforma ainda contava com o nome de Tarcísio de Freitas (265 mil tuítes) e de Paraisópolis (118 mil tuítes), além das palavras "tiroteio" (28 mil) e "fakeada 2.0" (12 mil), no meio da tarde. O último termo é usado por petistas para contestar não apenas a versão do atentado contra Tarcísio, mas também a facada sofrida por Bolsonaro em 2018, da qual há fartas evidências de que realmente ocorreu e que levou à prisão de Adélio Bispo, considerado depois inimputável por sofrer de transtorno mental grave.
Suposto 'atentado' contra Tarcísio vira munição contra Haddad e Lula
Mesmo sem nenhuma relação com os fatos, o nome do candidato Fernando Haddad (PT) aparece como o 12º mais frequentemente associado em posts no Twitter sobre o assunto, segundo o Monitor de Redes Sociais do Estadão. O ex-presidente Lula, da mesma forma, aparece em 15º, e o presidente Jair Bolsonaro, em 6º.
Ainda que Bolsonaro tenha se mostrado cauteloso inicialmente em declarações sobre o ocorrido, dois de seus filhos políticos logo associaram o fato a um atentado. "Ao que parece trata-se de um atentado de traficantes fortemente armados contra o Ministro Tarcísio em SP", alegou o vereador carioca Carlos Bolsonaro (PL-RJ). "Graças a Deus o atentado em Paraisópolis/SP não fez vítimas fatais", postou o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
A associação direta com Lula, Haddad e o PT fica a cargo de aliados como a deputada federal Carla Zambelli (PL-DF). "Lula disse no debate que ele é o único o candidato que entra na favela sem colete e sem precisar de polícia. Hoje: Tarcísio Freitas sofre atentado em Paraisópolis. Tire suas conclusões", postou a deputada no Twitter, em referência à visita recente do petista ao Complexo do Alemão, quando não houve nenhum incidente de segurança.
Outros políticos recorrem ao boné utilizado por Lula com a sigla "CPX" no conjunto de favelas carioca, dando impulso a uma desinformação já desmentida pelo Estadão Verifica e outras agências de checagem de fatos. É uma abreviação para "Complexo", mas bolsonaristas alegam que seria "cupinxa (sic)" e revelaria conluio com facções criminosas. "Tarcísio sofre atentado?? Provavelmente não estaria usando o boné salvo conduto CPX....", escreveu o deputado federal Sargento Fahur (PSD-PR).
"Em 2018, Bolsonaro sofreu um atentado quando disputava eleição presidencial contra o Haddad. Hoje, Tarcísio sofreu um atentado também disputando contra o Haddad em SP. Seria uma mera coincidência?", insinuou o ex-secretário de Cultura Mário Frias (PL-SP), eleito deputado federal por São Paulo.
"A QUEM INTERESSA O ATENTADO CONTRA TARCÍSIO??", postou a senadora recém-eleita pelo Distrito Federal e ex-ministra da Mulher do governo Bolsonaro, Damares Alves (Republicanos). Nesse mesmo tom, usuários compartilham ainda uma montagem com o rosto de Tarcísio no lugar de Marielle Franco -- vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL assassinada em 2018 -- com os dizeres: "Quem mandou matar Tarcísio?".
Em grupo de influenciadores pró-Bolsonaro a que o Estadão teve acesso, foram postadas imagens do local onde se ouvem tiros junto a uma legenda alegando sem provas que Marcola, o PCC e o crime organizado estariam "fechados com o PT do Lula". A campanha de Bolsonaro frequentemente associa o partido a facções criminosas e já teve conteúdos removidos a mando do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). /COLABOROU GUSTAVO QUEIROZ
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