Tribunais responsáveis por vigiar uso do dinheiro público pagam supersalários de R$ 100 mil

Levantamento realizado pela Fiquem Sabendo identificou os valores líquidos recebidos por 127 conselheiros de 13 tribunais de contas estaduais; MG, GO e TO afirmam que valores mais elevados incluem pagamento de 13º e outros benefícios; São Paulo diz que são verbas indenizatórias e demais Cortes não se manifestaram

PUBLICIDADE

Foto do author Weslley Galzo
Atualização:

BRASÍLIA - Responsáveis pela fiscalização e aplicação eficiente do dinheiro público, 68 conselheiros de Tribunais de Contas Estaduais (TCEs) receberam pelo menos um supersalário nos dez primeiros meses deste ano. Quando contabilizados apenas os meses com vencimentos acima do teto, a média salarial desses servidores chega a R$ 100 mil.

PUBLICIDADE

A análise foi realizada pelo Estadão a partir dos dados coletados e disponibilizados pela organização não governamental (ONG) Fiquem Sabendo. O levantamento mostra que as Cortes de Contas têm garantido remuneração líquida — ou seja, descontados os encargos trabalhistas — entre R$ 44,4 mil e R$ 1,7 milhão em alguns meses.

Procurados, os Tribunais de Contas de Goiás e Tocantins afirmaram que os valores elevados de alguns salários derivam de 13º salário. Os contracheques nessas duas instituições oscilam entre R$ 44,4 mil e R$ 62 mil. Em São Paulo, os pagamentos foram atribuídos a verbas indenizatórias, que, em sua maioria, figuram entre R$ 83 mil e R$ 101 mil.

Já o TCE de Minas Gerais disse que “não existem penduricalhos” na Corte e que os supersalários identificados “incluem o recebimento de verbas indenizatórias determinadas pela legislação vigente”, como auxílio saúde, auxílio alimentação e férias indenizadas. Um dos conselheiros mineiros recebeu R$ 104 mil em fevereiro deste ano. Os demais tribunais não retornaram no prazo estipulado. (Veja mais abaixo).

Publicidade

Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Foto: TCE/SP

Esses valores excedem o teto remuneratório do funcionalismo público, atualmente fixado em R$ 44 mil. A Fiquem Sabendo reuniu 1.208 holerites com dados dos pagamentos líquidos realizados a 127 conselheiros de 13 Tribunais de Contas, entre janeiro e outubro deste ano. Os gastos com esses agentes públicos custaram R$ 54 milhões aos colegiados.

Dentro desse universo de contracheques, há 274 registros de supersalários em 10 Cortes: Tocantins, Alagoas, Acre, Bahia, São Paulo, Roraima, Goiás, Pernambuco e Minas Gerais. Houve ainda 60 casos de conselheiros que receberam salários acima de R$ 100 mil durante este ano.

A soma dos valores pagos aos conselheiros mais bem remunerados passa de R$ 27 milhões — ou seja, a metade do gasto anual dos 13 TCEs apurados pela Fiquem Sabendo.

Os tribunais das outras 14 unidades federativas do País não divulgam as informações de remuneração de maneira acessível e aberta, por isso foram excluídos do cômputo geral pela Fiquem Sabendo. A ONG aponta que há falta de transparência nos dados salariais das cortes que cuidam justamente do monitoramento dos gastos dos governos estaduais.

Publicidade

O levantamento ainda apresenta casos extremos, como o do Tribunal de Contas do Estado de Roraima (TCE-RR) que pagou remunerações líquidas entre R$ 1,3 milhão e R$ 1,7 milhão a quatro conselheiros, entre janeiro e setembro deste ano.

Por esse motivo, o TCE-RR é o que garante a maior remuneração média aos seus conselheiros. Um membro da Corte embolsa em média R$ 180 mil, enquanto no TC de Pernambuco - o segundo colocado - o valor médio líquido é de R$ 60 mil.

Reportagem do Estadão publicada em 2019 já mostrava a prática dos TCEs de extrapolarem o teto do funcionalismo público. Além dos salários, as cortes de contas mantém uma série de pagamentos de benefícios que elevam os contracheques de conselheiros, auditores e procuradores que atuam junto a esses órgãos.

Em 2019, um bônus pago aos membros do TC de Mato Grosso do Sul rendeu R$ 70,9 mil a mais nos contracheques sob o pretexto de estimular a compra de livros.

Publicidade

Outros lados

Minas Gerais

1) Os valores informados incluem o recebimento de verbas indenizatórias determinadas pela legislação vigente.

2) Não existem penduricalhos no TCEMG. As verbas indenizatórias são: auxílio saúde, auxílio alimentação e férias indenizadas.

3) Os pagamentos realizados pelo TCEMG estão inteiramente em conformidade com a Constituição Federal e com a legislação vigente.

4) O conselheiro-presidente Gilberto Diniz informou que recebe verba indenizatória pelo exercício da Presidência do TCEMG. Os demais conselheiros citados não vão se pronunciar.

Publicidade

Goiás

Os casos mencionados no âmbito do TCE-GO referem-se à folha salarial de janeiro de 2024, mês em que ocorreu o pagamento do 13º salário, resultando em um incremento natural no valor líquido. Todas as verbas remuneratórias, contudo, foram objeto de corte em submissão ao teto constitucional.

No TCE-GO, a primeira parcela do décimo terceiro salário é paga em janeiro.

Tocantins

A respeito da solicitação “Pedido de Resposta – Estadão”, informamos que os valores recebidos pelos três membros do Tribunal de Contas do Estado do Tocantins, nos respectivos meses mencionados, referem-se ao adiantamento de 50% do 13º salário, conforme previsto na Resolução Administrativa nº 2/2018. Esse adiantamento é efetuado no mês de aniversário dos servidores ou membros.

São Paulo

O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP) esclarece que cumpre rigorosamente os limites de subsídios de seus membros conforme o teto constitucional.

Publicidade

Os demais valores apontados pela reportagem, e que eventualmente excedam esse limite, decorrem do pagamento de verbas de natureza indenizatória, baseadas em lei e/ou decisões do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), tendo por fundamento o princípio da simetria constitucional com o Poder Judiciário, estabelecido no parágrafo 3º do artigo 73 da Constituição Federal; e no parágrafo 3º do artigo 31 da Constituição do Estado de São Paulo.

Siga o ‘Estadão’ nas redes sociais

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.