BRASÍLIA — O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai atender, ainda que parcialmente, a questionamentos das Forças Armadas sobre a segurança do sistema eletrônico de votação. O Ministério da Defesa insiste em mudanças ao mesmo tempo que o presidente Jair Bolsonaro (PL) propaga, sem provas, discurso de descrédito contra as urnas.
O embate entre a Corte e as Forças Armadas tem aumentado. No episódio mais recente, um coronel que divulgou fake news sobre as urnas eletrônicas foi excluído na segunda-feira, dia 8, pelo presidente do TSE, ministro Edson Fachin, do grupo de fiscalização do processo eleitoral. Ele havia sido credenciado a pedido do Ministério da Defesa.
O TSE passou a dar respostas às propostas dos militares apresentadas inicialmente na Comissão de Transparência Eleitoral e depois reforçadas em ofícios do ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira. Dois de três pedidos principais formulados por militares serão atendidos em parte. O movimento pode ajudar distender a relação com os militares.
O primeiro deles será a publicação inédita de arquivos de dados dos boletins de urna, com os votos registrados e apurados em cada máquina. Eles serão divulgados online na íntegra, criando uma base de dados acessível na internet por qualquer interessado. Os militares haviam sugerido que os dados pudessem ser enviados a um servidor específico, mas a solução adotada prevê o acesso ao conjunto de dados em um domínio do próprio tribunal.
O TSE promete publicá-los assim que receber os arquivos dos cartórios eleitorais de todo o País para contagem em tempo real, em Brasília, após o encerramento da votação, em 2 de outubro. A medida pode facilitar e até agilizar a contagem dos militares, que se preparavam para usar os espelhos dos boletins com códigos QR, já divulgados em eleições anteriores.
Não há garantia, no entanto, de que a contagem paralela completa consiga apresentar resultado na velocidade com que o TSE divulga seus dados, o que pode abrir margem para Bolsonaro alegar que prefere esperar a tabulação dos militares para reconhecer o resultado da eleição. Embora a medida atenda a um pedido das Forças Armadas, na prática, a nova divulgação dos dados estará disponível para partidos e qualquer outra entidade.
O TSE não acompanha essa atividade e, segundo técnicos da Corte, não seria possível estimar ainda quanto tempo cada equipe vai demorar na apuração paralela. Eles teriam de processar cerca de 500 mil boletins de urna ou os arquivos de dados correspondentes a esse mesmo universo. Se usarem apenas os espelhos dos boletins de urna com QR Code, a intenção das Forças Armadas era promover uma contagem amostral suficiente para assegurar a confiança na contagem oficial.
Segundo um programador da Corte, tudo dependerá do interesse de cada instituição em ter velocidade ou não na divulgação da apuração própria. Oficiais da Defesa querem promover a contagem da forma mais rápida possível. O Estadão apurou que, além das Forças Armadas, o Tribunal de Contas da União (TCU) vai promover contagem paralela, como parte de auditoria em curso. Diferentemente dos militares, porém, o órgão pretende fazer a contagem a partir dos boletins de urna impressos, coletados localmente nas seções eleitorais, em vez de usar apenas os espelhos e arquivos publicados online.
Um segundo pleito dos militares será parcialmente atendido. As Forças Armadas tinham solicitado que a urna modelo UE-2020, que vai estrear nas eleições deste ano, passasse por um teste público de segurança, similar ao realizado no ano passado com as versões anteriores de urnas, ainda em uso. Esse tipo de avaliação levaria, no entanto, de três a quatro meses para ser organizado e concluído, o que seria inviável para estar pronto nesta eleição, segundo integrantes da Corte.
Como alternativa, o TSE decidiu submeter o modelo 2020 da urna eletrônica à análise técnica pela Universidade de São Paulo (USP). Um laudo dos testes na Escola Politécnica será entregue em breve para atestar a confiabilidade do modelo, mais moderno e seguro, segundo a Corte. Elas serão 225 mil unidades nestas eleições. O TSE diz que já defendia o teste da UE-2020, por iniciativa própria, e que as urnas só não foram incluídas no teste do ano passado porque os começaram a ser entregues pela fábrica depois que a cerimônia ocorreu.
O TSE considera que não é possível atender a um terceiro pedido dos militares: realizar um teste de integridade que verifica o funcionamento correto da urna no dia da votação, dentro de sessões eleitorais e com a participação de eleitores. A Corte entende ser inviável fazer isso por problemas de logística e para evitar que o eleitor convocado a colaborar no teste fique em dúvida sobre como seu voto será registrado. O tribunal pretende manter o modelo atual de teste por amostragem de urnas que são levadas para exame nos Tribunais Regionais Eleitorais.
Para entender: Propaganda eleitoral
Contagem paralela de votos
- Forças Armadas
Militares queriam que o TSE incluísse novas funcionalidades no aplicativo Boletim na Mão, que permite às pessoas coletar os boletins de urna e baixar cópia para poder fazer contagem paralela de votos.
- TSE
Corte vai publicar na internet, pela primeira vez, em página de acesso público, arquivos de dados dos boletins de urna, o que permitirá a pessoas e entidades fiscalizadoras baixar dados do repositório e processar contagem própria. Também publicará os boletins com códigos QR.
Teste público de segurança da nova urna
- Forças Armadas
Exigiram que o novo modelo de urna eletrônica, o UE2020, a ser usado pela primeira vez em 2022, seja submetido ao mesmo teste público de segurança que os modelos anteriores dos equipamentos.
- TSE
Como o teste no modelo defendido pelos militares demora de três a quatro meses, o tribunal usou uma parceria com a Universidade de São Paulo (USP) para incluir exames similares. A universidade recolheu o equipamento e levou para testes mais extensos em seus próprios laboratórios.
Teste de integridade nas seções eleitorais
- Forças Armadas
Proposta dos militares era realizar testes de urnas eletrônicas na seção eleitoral, no dia da votação, e com participação de eleitores por meio de biometria; atualmente, esses testes são feitos nas sedes dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), ambientes mais controlados e sem envolver eleitores.
- TSE
A Justiça Eleitoral vai manter o teste de integridade nas salas preparadas dos TREs, por entender que as mudanças propostas pelas Forças Armadas poderiam trazer prejuízos ao confundir os eleitores com um convite para participar de uma segunda votação.
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