Está disponível na praça, já à disposição do público em geral, a última lenda da campanha eleitoral deste ano: o ex-presidente Lula é, neste momento, um candidato moderado. Essa bobagem é apresentada em várias embalagens. Lula inclinou-se para “o centro”, diz uma delas. Lula “mudou o discurso”, diz outra. Lula está empenhado em atrair apoios entre as forças “conservadoras”, diz mais uma.
A prova disso, pelo que foi dito, é que no lançamento de sua chapa para a Presidência ele leu o discurso, em vez de falar o que lhe vem na cabeça - um monótono calhamaço sem cor, sem sabor e sem cheiro, e sem uma única palavra escrita por ele, Lula. Com isso, evitou cometer “deslizes” - que é como os gestores da sua campanha chamam as repetidas barbaridades que desandou a dizer nas últimas semanas.
A ficção que se quer vender, em suma, é que Lula está virando um Geraldo Alckmin - que o acusava ainda há pouco de querer voltar “ao local do crime” e agora estaria sendo uma espécie de grilo falante que mantém o chefe nos caminhos da virtude. É uma piada, claro; é mais fácil o camelo da Bíblia passar pelo buraco de uma agulha do que Lula fazer alguma coisa que Alckmin lhe peça. Mas essa invenção está sendo apresentada a sério, como sinal de que o ex-presidente não é mais o mesmo.
Como fica, então? Lula vai passar o resto da campanha lendo discursos escritos por outros? Vai trocar de personalidade, de estilo e de vícios? Vai ficar fingindo que respeita ou que ouve Alckmin, na esperança de que o ex-governador lhe traga algum voto “da direita”? (Nas últimas eleições Alckmin teve 4% dos votos.) É uma equação difícil.
Os devotos da sua candidatura sonham com um Lula no papel do bom vovô, sorridente e amigo das crianças, afável com todo mundo, pronto a “negociar” tudo, defensor número 1 das soluções sensatas - em suma, o homem que condena os extremos e só pensa na paz de que “o Brasil tanto precisa”. Mas para isso ele não pode mais ser o Lula da vida real - e esse, infelizmente para os crentes na “moderação”, é o único Lula que existe.
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