Veja em gráficos como centro, direita e esquerda saem de 2024 e se posicionam para 2026

Fotografia das eleições municipais de 2024 mostra que o centro avançou, se consolidando como o maior grupo político em número de prefeituras conquistadas

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Foto do author Zeca  Ferreira

A fotografia das eleições municipais de 2024 é clara: o centro avançou, se consolidando como o maior grupo político em número de prefeituras conquistadas. A direita e a esquerda recuaram, com a esquerda apresentando um desempenho especialmente fraco em grandes cidades — aquelas com mais de 200 mil habitantes. No total, das 5.568 prefeituras, 2.985 ficarão sob gestão do centro, 1.831 da direita ou centro-direita e apenas 752 da esquerda ou centro-esquerda.

Urnas eletrônicas usadas na votação deste ano Foto: Júlia Pereira/Estadão

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Pela primeira vez desde 2008, a diferença entre o número de prefeituras governadas pelo centro e pela direita ultrapassou mil. Além disso, o resultado de 2024 registra o menor número de prefeituras conquistadas pela esquerda nesse período.

O levantamento considerou a orientação ideológica das legendas com base no posicionamento de suas lideranças e em pautas nacionais. Foram classificados como partidos de esquerda: PT, PCdoB e PSOL; de centro: PSD, MDB, União Brasil, PSDB, Avante, Podemos, Solidariedade, Cidadania, PMB, PSDC, PT do B e PTC; de centro-direita: PP, PRD, Mobiliza, Agir, DEM, PHS, PROS; de centro-esquerda: PSB, PDT, PV, Rede, PMN, PPL, PPS e SD; e de direita: PL, Republicanos, Novo, DC, PRTB, Patriota, PR, PRB, PRP, PSC, PSL, PTB e PTN. Prefeitos eleitos por legendas de centro-esquerda ou centro-direita foram incluídos, respectivamente, nos campos da esquerda e da direita. (veja gráfico abaixo).

O bom desempenho do campo do centro nas eleições municipais não garante vantagem automática na disputa pelo Palácio do Planalto em 2026, já que, no Brasil, a dinâmica das eleições federais é diferente das municipais. No entanto, o cenário pode influenciar diretamente as próximas eleições proporcionais, como as disputas para o Congresso Nacional e para as Assembleias Legislativas.

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De acordo com o professor de Ciência Politica Paulo Niccoli Ramirez, da Fundação Escola de Sociologia de São Paulo (FESPSP), a força do centro e da direita terá impacto nas disputa pelo legislativo, pois há hoje uma estreita relação entre o Congresso e os municípios, especialmente por meio das emendas parlamentares.

“Entre 2025 e 2026, até as próximas eleições presidenciais, o Centrão deve se fortalecer ainda mais, articulando-se com prefeitos eleitos e reeleitos para garantir a distribuição de verbas. A tendência é que o governo federal se torne cada vez mais dependente do Centrão, ampliando espaços no Executivo e nas estatais. Mesmo com o discurso de austeridade, os cortes orçamentários dificilmente afetarão o Congresso”, avalia o especialista diante do resultado das urnas.

A avaliação do especialista é compartilhada pelo Dharma Political Risk and Strategy, um hub de análise de risco político. Segundo a instituição, o Legislativo tende a se consolidar como o núcleo de poder mais influente da República. Para o próximo ano, o Dharma prevê uma disputa velada entre um Executivo focado em conter despesas e um Legislativo disposto a oferecer benefícios alinhados aos seus próprios interesses.

Sucesso na gestão estadual ou municipal não garante caminho para a Presidência, diz especialista

O professor da FESPSP lembra que, com exceção de Fernando Collor, nenhum presidente eleito por voto popular desde a redemocratização tinha experiência prévia no Poder Executivo, seja municipal ou estadual. “No Brasil, a ideia de que governar uma cidade ou Estado seja um passo natural para a Presidência não se confirma. Esse é um aspecto interessante das nossas eleições”, afirma.

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Ele observa que partidos como PSD e MDB, embora tenham conquistado um grande número de prefeituras, mantêm o hábito de não lançar candidatos próprios à Presidência, optando por apoiar outras chapas. As alianças desses partidos costumam variar regionalmente, e para 2026, não está descartada a possibilidade de apoio tanto a candidatos da direita quanto da esquerda.

Na direita, o cenário permanece indefinido. Com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), inelegíveis – embora Caiado ainda possa recorrer em instâncias superiores –, e o coach Pablo Marçal (PRTB) também sob risco de inelegibilidade, sobra o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Contudo, Tarcísio já declarou que pretende disputar a reeleição no Estado, deixando a direita sem um nome claro para a corrida presidencial.

No campo da esquerda, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é considerado o candidato natural. No entanto, uma recente cirurgia de emergência levantou preocupações entre aliados sobre sua saúde e a viabilidade de uma candidatura à reeleição. Esse alerta colocou o campo progressista em estado de atenção para possíveis alternativas, como o ministro da Fazendo, Fernando Haddad (PT).

Desempenho da esquerda é o pior em 24 anos

Um levantamento do cientista político Murilo Medeiros, da Universidade de Brasília (UnB), revela que o desempenho da esquerda nas grandes cidades nas eleições de 2024 foi o pior desde 2000, antes do primeiro mandato de Lula (2003-2006). Nesse intervalo, o número de cidades com mais de 200 mil habitantes aumentou de 85 para 103. Por isso, a análise do desempenho das forças políticas é mais precisa quando feita em termos percentuais, e não por números absolutos.

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De 2000 a 2024, a esquerda caiu de 42,4% para 9,7% no percentual de grandes cidades governadas. O centro, por sua vez, cresceu de 50,59% para 54,37%, enquanto a direita subiu de 7,06% para 35,92%. Em uma entrevista ao Estadão, Medeiros afirmou que os resultados de 2024 evidenciam o domínio do centro e da direita sobre os grandes centros urbanos do País, enquanto a esquerda perdeu espaço nas cidades de maior porte.

“A esquerda, além de enfrentar um apagão de lideranças, perdeu conexão com segmentos importantes da sociedade nos grandes centros urbanos, como evangélicos, moradores da periferia e o público jovem”, disse à época.

O avanço do centro marcou também as eleições no Nordeste, tradicional reduto petista. Na Bahia, estado governado pelo PT, o União Brasil venceu em Salvador e em outras grandes cidades, como Feira de Santana, Ilhéus e Barreiras. No cenário geral, a esquerda ficará à frente de apenas duas das nove capitais da região — Fortaleza (PT) e Recife (PSB) — enquanto as demais serão comandadas por partidos de centro, direita ou centro-direita.

Segundo a análise da Dharma, diante de resultados modestos nas eleições municipais, da troca de comando no partido e da possibilidade de Lula não disputar a reeleição em 2026, o PT buscará se reaproximar de segmentos do eleitorado e de atores políticos que migraram para o bolsonarismo nos últimos anos. Entre as estratégias, destacam-se o diálogo com lideranças evangélicas e o esforço para reconquistar a hegemonia junto aos grupos sociais mais vulneráveis.

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No entanto, a casa de análise de risco político avalia que esse movimento deve ter impacto limitado, devido às dificuldades de comunicação do partido, ao desgaste de sua imagem ao longo dos anos e às mudanças nas preferências do eleitorado.

Já para Paulo Niccoli Ramirez, o crescimento dos partidos de centro, que têm forte presença nas redes sociais, é uma das razões para a queda da esquerda. “Os partidos de esquerda enfrentam dificuldades para adaptar seu discurso às novas realidades do trabalho, como o surgimento de freelancers e trabalhadores de aplicativos. O discurso sindical tradicional não dialoga com essas novas gerações, criando uma barreira para atrair eleitores desse segmento”, avalia.

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