Ao referendar a decisão de Alexandre de Moraes em suspender o X, ex-Twitter, em território nacional, os ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) deixaram recados sobre o assunto envolvendo, segundo eles, a soberania brasileira no embate entre Moraes e o bilionário Elon Musk, dono da rede social que está fora do ar no Brasil desde sexta-feira, 30, por descumprimento de determinações judiciais.
Os votos dos ministros
Moraes cita tentativas de intimar o X
O voto de Moraes foi feito em 42 páginas. Ele relatou todas as tentativas da Corte ao intimar o X a cumprir as decisões judiciais. Hoje, a multa por descumprimento já passa de R$ 18 milhões. “O Supremo Tribunal Federal fez todos os esforços possíveis e concedeu todas as oportunidades para que a X Brasil, as demais empresas do seu ‘grupo econômico de fato’ e Elon Musk cumprissem as ordens judiciais e, também, pudessem adimplir as multas diárias aplicadas, no intuito de impedir medida mais gravosa”, afirmou Moraes.
Fux rechaça punições a pessoas físicas e jurídicas indiscriminadas
Dos cinco ministros da Primeira Turma, apenas Luiz Fux acompanhou o relator Moraes com ressalvas ao citar que pessoas - naturais ou jurídicas - que não estão envolvidas em investigações conduzidas pelas autoridades brasileiras não deveriam sofrer com multas, como a imposta por Moraes na semana passada em R$ 50 mil por utilização do X.
Acompanho o ministro relator com as ressalvas de que a decisão referendada não atinja pessoas naturais e jurídicas indiscriminadas e que não tenham participado do processo, em obediência aos cânones do devido processo legal e do contraditório
Luiz Fux
Fux deixou claro em seu voto que o enquadramento para barrar utilização de redes deveria ocorrer caso o usuário utilize para fraudar a decisão, “com manifestações vedadas pela ordem constitucional, tais como expressões reveladoras de racismo, fascismo, nazismo, obstrutoras de investigações criminais ou de incitação aos crimes em geral”.
Dino diz que empresas não podem decidir quais leis valem no Brasil
Flávio Dino focou seu voto em mostrar que a legislação brasileira deve ser respeitada. Segundo ele, o ordenamento jurídico do Brasil define com clareza os instrumentos para o embate judicial, o que impede obstrução da Justiça.
“Como se constata, os magistrados brasileiros exercem um poder, diretamente emanado da Constituição, a ser exercido com independência. As pessoas naturais e jurídicas têm pleno acesso a um vasto sistema de recursos e instrumentos de impugnação das decisões do Judiciário. Mas a ninguém é dado obstruir a Justiça ou escolher, por critérios de conveniência pessoal, quais determinações judiciais irá cumprir”, disse.
Dino disse ainda não ser possível a uma empresa atuar em território brasileiro e tentar impor sua visão sobre quais regras devem ser válidas ou aplicadas. Sem citar o nome de Musk, Dino disse que não se leva em consideração o poder financeiro para imunidade de jurisdição.
O poder econômico e o tamanho da conta bancária não fazem nascer uma esdrúxula imunidade de jurisdição.
Flávio Dino
Cármen Lúcia diz que Brasil não pode ser soberano só para brasileiros
A ministra Cármen Lúcia também citou a soberania do Brasil na decisão que referendou a suspensão do X no País. A magistrada faz diversas perguntas em seu voto, como “o Brasil é soberano apenas para os brasileiros?”. Na resposta, Cármen Lúcia lembra o artigo 170 da Constituição Federal. “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional“, diz trecho do artigo constitucional.
A magistrada questiona ainda se qualquer brasileiro poderia atuar de maneira a desrespeitar a soberania de outro país. “Haveria soberania de um povo quando, no espaço nacional, não houvesse como garantir o direito brasileiro, incluído aquele afirmado na Constituição do Brasil? Um brasileiro poderia atuar em qualquer outro Estado soberano desprezando e descumprindo seu ordenamento jurídico e as ordens judiciais exaradas pelos seus respectivos juízes?”, escreveu no voto.
É grave, é séria e fez-se necessária, como demonstrado na decisão e no voto do ministro relator, a medida judicial adotada. Nem o juiz há de julgar por voluntarismo, nem o particular pode se achar por vontade própria mais soberano que a soberania de um povo, que se faz e se constrói segundo o Direito que ele cria, impõe e cumpre.
Cármen Lúcia
Em outro trecho, Cármen Lúcia também afirmou que qualquer questionamento jurídico deve ser feito seguindo legislação vigente, “não segundo os humores e voluntarismos de quem quer que seja, nacional ou estrangeiro”.
Zanin lembra descumprimento reiterado das decisões
Cristiano Zanin afirmou que o reiterado descumprimento de decisões proferidas pelo STF é grave para qualquer cidadão ou pessoa jurídica. Ele também acompanhou o voto de Moraes.
“O reiterado descumprimento de decisões do Supremo Tribunal Federal é extremamente grave para qualquer cidadão ou pessoa jurídica pública ou privada. Ninguém pode pretender desenvolver suas atividades no Brasil sem observar as leis e a Constituição Federal”, afirmou o magistrado.
De imediato, antecipo compreender que as medidas ordenadas nestes autos objetivam a própria satisfação das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, sistematicamente descumpridas pela empresa, e, por conseguinte, a preservação da própria dignidade da Justiça.
Cristiano Zanin
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