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Os bastidores do Planalto e do Congresso

Opinião | Estratégia de Lira de confronto com Lula é arriscada e ameaça rachar Centrão

Grupo tem candidatos à cadeira do presidente da Câmara que se aproximam cada vez mais do Palácio do Planalto

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Foto do author Vera Rosa

A relação entre o Palácio do Planalto e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), vai de mal a pior. Mas isso não significa que o Centrão esteja 100% alinhado com ele, apesar de sua liderança sobre o grupo. Embora dê demonstração de força e tenha poder para segurar votações de interesse do governo Lula, o deputado faz movimentos arriscados.

Em primeiro lugar, Lira não pode adiantar o anúncio de quem terá o seu apoio na disputa pelo comando da Câmara, mesmo pressionando o presidente Lula a avalizar desde já esse candidato. A eleição dos novos presidentes da Câmara e do Senado ocorrerá somente daqui a um ano, em fevereiro de 2025, e qualquer articulação escancarada, nesse momento, pode fazer o seu mandato terminar antes da hora.

Além disso, se o troco no governo respingar na agenda econômica do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, Lira perde o respaldo do mercado e da Faria Lima. Mais do que ninguém, ele sabe dessa “armadilha”.

Lira sabe que precisa manter apoio à agenda econômica de Haddad. Foto: Wilton Junior/Estadão Foto: Wilton Junior/Estadão

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O discurso oficial para a rebelião é de que o Planalto não tem palavra, não cumpre acordos e não libera as verbas acertadas para as emendas orçamentárias. A preocupação com o dinheiro para os redutos políticos atinge todos os parlamentares neste ano de eleições municipais.

Diante desse cenário, a manifestação de Lira na retomada dos trabalhos legislativos, na segunda-feira, 5, foi feita sob medida para ecoar não só no Planalto mas também no baixo clero, de quem ele precisa para fazer o sucessor.

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O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, assegura que o governo reservou, de janeiro a dezembro de 2023, R$ 34,6 bilhões para pagamento de emendas, 106,1% acima dos R$ 16,8 bilhões empenhados no mesmo período, em 2022, no último ano da gestão de Jair Bolsonaro. Aliados do presidente da Câmara – que pede a cabeça de Padilha – dizem, por sua vez, haver bloqueio de verbas e falta de cumprimento de promessas na distribuição de cargos nos Estados.

Com o ambiente para lá de tenso, uma reunião prevista para esta terça-feira, 6, entre Padilha, Haddad e líderes dos partidos acabou cancelada.

O problema é que, se Lira exagerar na dose, racha o Centrão. Motivo: há no grupo vários pré-candidatos à sua vaga, além do líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA), até agora o preferido por ele.

Estão na lista dos que pretendem disputar a cadeira de Lira os deputados Antônio Brito, que comanda a bancada do PSD, e Marcos Pereira (Republicanos), vice-presidente da Câmara. Os dois têm se aproximado cada vez mais do governo.

O diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, o presidente Lula e o deputado Antônio Brito Foto: @antoniobritobahia via Instagram

Nos bastidores, dirigentes do PT e auxiliares de Lula afirmam que o favorito do Planalto é Brito. E, por “coincidência”, ele apareceu na foto ao lado de Lula, do diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, e de Padilha horas depois de Lira ter puxado a faca para o governo em discurso no plenário.

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A ministra da Saúde, Nísia Trindade, também estava no encontro com o diretor-geral da OMS. A Saúde é uma pasta reivindicada há tempos pelo grupo do presidente da Câmara, que agora também apresentou requerimento de informação para saber detalhes da execução orçamentária do ministério.

Para completar, o PSB do vice Geraldo Alckmin deixou o bloco parlamentar de Lira e anda namorando o governo, que ajudou na volta do senador Cid Gomes ao partido. Nesse jogo, enquanto a cúpula do PT esfria o café de Lira, o Planalto joga iscas para dividir o Centrão.

Só que política não é aritmética e Lira também tem sua “bancada” de apoio nas fileiras do PT. Muitos ali se lembram de que uma única canetada do presidente da Câmara, à época Eduardo Cunha, deu origem ao impeachment de Dilma Rousseff. O Brasil de 2024, porém, não tem semelhança com o de 2016. E, além disso, Lula não é Dilma.

Opinião por Vera Rosa

Repórter especial do ‘Estadão’. Na Sucursal de Brasília desde 2003, sempre cobrindo Planalto e Congresso. É jornalista formada pela PUC-SP. Escreve às quartas-feiras

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