BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já havia prometido resolver os problemas na articulação política do governo com o Congresso no início de maio, mas só depois de ter passado por um sufoco na Câmara, na semana passada, resolveu promover um “aggiornamento” político.
A conversa entre Lula e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), nesta segunda-feira, 5, foi justamente nessa toada. O petista não pretende fazer uma ampla reforma ministerial, mas, nos bastidores, já admite a necessidade de mudanças “pontuais” na equipe, que devem atingir principalmente o União Brasil. Mesmo assim, não dá prazo para as trocas.
Lula não gostou de saber que o empresário Fernando Fialho, sogro do ministro das Comunicações, Juscelino Filho, tem usado o gabinete do genro para despachar, como revelou o Estadão. O presidente já havia conversado com o líder do União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (BA), na semana passada, para reavaliar as indicações do partido na Esplanada.
Além de Juscelino, que pode ser substituído, a ministra do Turismo, Daniela Carneiro, também está nessa lista. Daniela pode não sair do governo, mas deve mudar de repartição. Ela já pediu para se desfiliar do União Brasil e tudo indica que migrará para o Republicanos, partido que tende a ganhar espaço na Esplanada. O deputado Celso Sabino (PA), aliado de Lira, é cotado para assumir Turismo ou outro ministério hoje na cota do União Brasil, que administra três pastas.
Lula ia se reunir no fim da tarde desta segunda-feira, 5, com líderes dos partidos na Câmara, mas o encontro foi cancelado porque havia poucos deputados em Brasília. Na avaliação do Palácio do Planalto, o próprio Lira esvaziou a reunião ao levar para um jantar com empresários do Esfera Brasil, em São Paulo, alguns deputados do Centrão que iriam permanecer na capital federal. Diante dessa atitude, vista como uma “rasteira” pelo Planalto, a audiência do presidente foi apenas com os senadores.
Para Lira, o chefe do Executivo precisa arrumar logo a base aliada porque “o combustível está acabando”. Vários recados foram dados nos últimos dias: um deles, durante a análise da Medida Provisória que reestruturou a Esplanada, quando os ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas acabaram desidratados. O outro mostrou a força da bancada ruralista, que conseguiu aprovar no plenário da Câmara o projeto de marco temporal para demarcação das terras indígenas, a contragosto do Planalto.
Na prática, Lula está pressionado pelas próximas votações. Há Medidas Provisórias que, se não forem aprovadas pelo Congresso, perdem a validade ainda neste mês. A que tem mais urgência é a do Minha Casa, Minha Vida. Além disso, a reforma tributária entrará agora na pauta e o arcabouço fiscal e o Marco do Saneamento ainda precisam passar pelo crivo do Senado.
Expoente do Centrão, Lira se define como um “facilitador” para as votações, mas cobra a fatura do governo. “O Executivo precisa entender que não governa sozinho. O Brasil de hoje não é o mesmo daquele de 2003″, costuma repetir ele, numa referência ao início do mandato de Lula. “Além disso, o Congresso de agora é conservador e liberal.”
Embora o maior empenho de Lira seja para retomar o controle da distribuição de emendas parlamentares do antigo orçamento secreto, aliados do deputado no Centrão pressionam por espaço para esse grupo no governo. Querem o Ministério da Saúde, comandado por Nísia Trindade, que não é filiada a nenhum partido. A Saúde já foi, por muitos anos, feudo político do PP de Lira. Dificilmente, porém, Lula entregará esse cargo, considerado estratégico por ele.
Lira tem, ainda, uma antiga divergência com Renan Calheiros (MDB-AL), agravada depois que o senador publicou no Twitter posts ofensivos ao deputado. Apesar de ter negado, o presidente da Câmara fez chegar à Casa Civil e à Secretaria de Relações Institucionais que não admitia ver um aliado de primeira hora do governo o atacando daquela forma e pediu a demissão do ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB-AL). “Ele continua se comportando como o bolsonarista que é e quer degolar ministros de Lula para inflar seus sabujos”, diz o senador.
Para completar o mal-estar político, o ministro da Casa Civil, Rui Costa – há tempos criticado pelo Centrão – classificou Brasília como “ilha da fantasia”, em um discurso feito na cidade de Itaberaba (BA), na sexta-feira, 2. “Brasília é difícil. É difícil porque lá fazer o certo, para muitos, está errado. E fazer o errado, para muitos, é que é o certo na cabeça deles”, afirmou Costa.
Há quem diga no PT que a infeliz frase de Costa já começa a ser encarada como mais um sinal da “maldição da Casa Civil”. Uma “maldição” que, segundo a lenda política, foi responsável por derrubar poderosos, como José Dirceu, e mesmo Dilma Rousseff, que o sucedeu na chefia da pasta, de 2005 a 2010, e caiu anos depois, quando era presidente da República.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.