No 7 de Setembro, horas antes de ser alvo de um ruidoso protesto na Avenida Paulista, no qual aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro pedirão o seu impeachment, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes deverá estar a 1.037 quilômetros dali. É que Moraes foi convidado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para participar do Dia da Independência, na Esplanada dos Ministérios.
O porta-voz do convite foi o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. O magistrado confirmou presença na comemoração, em Brasília, marcada para o período da manhã. “Eu convidei o ministro Alexandre, em nome do presidente, e ele respondeu prontamente que vai ao nosso desfile do 7 de Setembro. Estou chamando todos os ministros do STF”, disse Múcio à Coluna.
À tarde, porém, seguidores de Bolsonaro vão levar o boneco de “Xandão” para a avenida com uma “cabeça de ovo” – expressão com a qual se referem a ele –, xingá-lo com todos os impropérios que lhe vierem à mente e chamá-lo de “ditador” que suspendeu a rede social X, de Elon Musk.
A presença de Moraes na tribuna de autoridades – ao lado de Lula, dos presidentes do STF, Luís Roberto Barroso, e do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de ministros e de comandantes das Forças Armadas – representa um desagravo do governo ao juiz que mais inimigos comprou nas fileiras bolsonaristas.
Lula avalia que Moraes foi um dos responsáveis por salvar a democracia quando houve a tentativa de golpe, em 8 de janeiro de 2023. Não é só: desde o início de seu terceiro mandato, o petista selou uma aliança com o STF para governar.
Sem maioria no Congresso, Lula tem contado com a ajuda da Corte até mesmo para a solução de crises políticas que envolvem a distribuição de emendas parlamentares ao Orçamento. Nos últimos dias, em entrevistas, o presidente fez uma defesa veemente de Moraes e disse que Musk precisava acatar as leis brasileiras. “Ele pensa que é o quê?”, criticou.
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Na Avenida Paulista, seguidores de Bolsonaro vão responder a essa pergunta com elogios a Musk, tratado como “perseguido”.
Desde sexta-feira, 30, quando Moraes decidiu suspender a rede social X, a procura por pulseiras de identificação para acesso VIP aos trios elétricos do ato organizado pelo pastor Silas Malafaia praticamente triplicou.
Ali a palavra de ordem será “Fora, Moraes”. Além disso, no momento em que a Polícia Federal está a um passo de indiciar Bolsonaro e seus aliados por tentativa de golpe, a ideia é começar ali um movimento mais vigoroso, cobrando anistia para os vândalos do 8 de Janeiro.
Colegas de Moraes no STF têm certeza de que o ato na Paulista desgastará ainda mais a instituição. Ali será dado o pontapé da campanha que pretende eleger, em 2026, mais bolsonaristas ao Senado, Casa que tem o poder de aprovar o impeachment de magistrados.
Plano é pressionar Pacheco com manifestação em Belo Horizonte
Após as eleições municipais, o plano de seguidores de Bolsonaro é fazer uma outra manifestação, desta vez em Belo Horizonte, para pressionar Rodrigo Pacheco a pautar esse tema.
Ministros do STF não sabem, porém, como conter a nova crise que se avizinha sem desautorizar Moraes, ainda que, nos bastidores, discordem de algumas de suas decisões, como a do bloqueio das contas da Starlink.
Nesse enredo que ninguém sabe como termina, candidatos de direita à Prefeitura de São Paulo, como Pablo Marçal (PRTB) e Marina Helena (Novo), querem colar em Bolsonaro e pegar carona na popularidade do duelo entre Moraes e Musk.
O prefeito Ricardo Nunes (MDB) tentou desviar do foco do impeachment, mas, ainda assim, disse que comparecerá ao protesto, ao lado do governador Tarcísio de Freitas. Sua equipe de campanha, porém, já faz cálculos eleitorais sobre a conveniência de sua participação.
Na prática, Nunes corre sério risco de levar uma sonora vaia dos chamados “bolsonaristas raiz”, que votam em Marçal. Trata-se de uma imagem que o ex-coach certamente fará chegar às redes sociais. Embora suas contas nessas plataformas tenham sido suspensas por decisão da Justiça Eleitoral, o candidato continua operando outros perfis.
Está claro que, nesse jogo, Bolsonaro pôs um pé em cada canoa. Oficialmente, ele apoia Nunes, mas, como a campanha do prefeito está em apuros, “corrigiu” a rota e dá sinais de que pode abraçar Marçal.
No duelo contra Lula, Bolsonaro fará qualquer manobra para não se associar a uma derrota. Até agora, Marçal é visto como candidato “teflon”, pois nada gruda nele. Vamos ver até quando. O fato é que, com receio de comprar briga com a Justiça, onde enfrenta processos, ele não quer atacar “Xandão” na Paulista.
Nesse confronto com o bolsonarismo, o Planalto está com Moraes. E o “Dia da Independência” terá duas imagens: uma contra e outra a favor de “Xandão”. Resta saber de que lado estará a maioria do eleitorado.
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