Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) avaliam que as acusações envolvendo o colega Alexandre de Moraes vão recrudescer os ataques à Corte e mostram preocupação com os desdobramentos do caso. Embora em público os magistrados defendam Moraes, nos bastidores mais da metade acha que ele deveria concluir logo os inquéritos das fake news e das milícias digitais, que atingem o ex-presidente Jair Bolsonaro, e não esticar mais a corda.
Reportagem do jornal Folha de S. Paulo revelou que Moraes usou a Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) como braço investigativo de seu gabinete no STF nas diligências contra bolsonaristas. À época, Moraes presidia o TSE e as mensagens trocadas entre ele e juízes auxiliares indicam um procedimento fora dos canais oficiais.
O assunto foi tratado na noite desta terça-feira, 13, até mesmo em rodas de conversa de um jantar na casa do ministro do STF Gilmar Mendes, em Brasília, para comemorar o aniversário de sua mulher, a advogada Guiomar Mendes. Moraes compareceu à festa e recebeu a solidariedade dos pares.
Um dos magistrados presentes criticou declarações de Nelson Jobim, ex-presidente do STF, para quem os métodos empregados por Moraes são “próximos” ao da Operação Lava Jato. A avaliação ali foi a de que Jobim não deveria ter atacado o ministro, mesmo porque todas as críticas públicas a ele expõem ainda mais o Supremo.
A oposição já começou a cobrar a abertura de processo de impeachment contra Moraes e uma das representações foi enviada ainda na noite desta terça-feira pelo partido Novo à Procuradoria-Geral da República. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), avisou a interlocutores que não levará adiante esses pedidos.
O receio dos ministros do STF, no entanto, é que, se houver pressão popular mais adiante, Pacheco não consiga segurar o assunto.
Sob reserva, um deles disse ao Estadão que, embora um grupo do Senado seja solidário a Moraes, muitos no Congresso vão fazer “marola” com o tema para transformá-lo em nova crise com o Supremo.
Além disso, aliados de Bolsonaro estão convencidos de que podem agora aprovar a anistia política para condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Querem, ainda, derrubar a inelegibilidade do ex-presidente até 2030, aprovada pelo TSE.
Foi a conselho de pelo menos um ministro do STF que, antes de ir para o jantar em homenagem a Guiomar Mendes, nesta terça-feira, Moraes divulgou uma nota na qual sustentou que o TSE tem “poder de polícia”. Disse, ainda, que todos os procedimentos adotados foram “oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria-Geral da República”.
Inquérito sem fim causa desconforto na Corte
A ala mais crítica a Moraes avalia, porém, que os ritos fora do padrão começaram ainda em março de 2019, quando Dias Toffoli, então presidente do STF, instaurou inquérito de ofício para apurar a disseminação de fake news, ameaças e calúnias dirigidas a ministros da Corte. Naquele ano, o primeiro do governo Bolsonaro, Toffoli designou Moraes para presidir o inquérito.
Em parecer enviado ao STF, a então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu a nulidade do ato, sob o argumento de que as apurações não poderiam ser conduzidas sem a participação do Ministério Público.
Na ocasião, Dodge alegou que, se o órgão que acusa é o mesmo que julga, haverá sempre a tendência de condenar o acusado e chegou a se referir ao STF como “tribunal de exceção”. Moraes discordou e manteve as diligências.
O problema, no diagnóstico de ministros do STF, é que esse inquérito não teve fim até hoje. E a longevidade do ato dá combustível às acusações de perseguição política por parte de bolsonaristas. Resta saber agora qual será o próximo capítulo dessa batalha.
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