A eleição de 1989 completou 35 anos na sexta-feira, 15 de novembro. Primeiro pleito com voto popular direto desde a redemocratização teve 22 candidatos. O então jovem político alagoano Fernando Collor de Mello foi eleito o 32º presidente do Brasil, vencendo o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, que perdeu a primeira das cinco eleições presidenciais que disputou.
Nomes como Paulo Maluf, Ronaldo Caiado e Guilherme Afif Domingos tiveram destaques em outros cargos, enquanto alguns brilharam menos, mas entraram no imaginário popular, casos de Enéas Carneiro e Marronzinho.
O pleito foi a última eleição do Brasil disputada no dia 15 de novembro, tradição inaugurada pelo regime militar a partir do Ato Institucional nº 3, em 1966. Já na eleição seguinte, a votação voltou a ser realizada em dois domingos de outubro, como era antes do golpe.
O Estadão levantou o que cada um dos candidatos da época fez depois do pleito.
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Fernando Collor de Mello
Então com 40 anos, Collor foi o mais jovem presidente eleito no Brasil, somando 53,03% dos votos no segundo turno, quando venceu Lula. No famoso debate transmitido final entre eles na Rede Globo, afirmou que, caso Lula fosse eleito, o petista iria confiscar o dinheiro do povo. Em 16 de março do ano seguinte, a ministra da Economia de Collor, Zélia Cardoso de Mello, anunciou o confisco das cadernetas de poupança dos brasileiros por 18 meses, iniciando a trajetória de crise em sua Presidência.
O tesoureiro de sua campanha, Paulo César Farias foi acusado de chefiar um esquema que arrecadava propina em troca de favorecimento de empresas. O depoimento do irmão do presidente, Pedro Collor, balançou o governo. As investigações de corrupção levaram à abertura de um processo de impeachment contra Collor. Ele renunciou ao cargo poucos dias antes do fim do processo. O vice, Itamar Franco, assumiu como presidente.
Depois disso, em 2002, Collor lançou-se ao governo do Estado de Alagoas pelo PRTB, perdendopara Ronaldo Lessa (PSB). Voltou a se candidatar ao estado em 2010 e 2022, sem sucesso. Mas foi eleito Senador por Alagoas em 2006, pelo PRTB; e reeleito em 2014, agora pelo PTB, somando 689 mil votos.
Na última semana, o STF referendou condenação de maio de 2023 a oito anos e seis meses de prisão em regime fechado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro ao fraudar um contrato da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras, em R$ 29 bilhões. A denúncia foi baseada em investigações da Operação Lava Jato.
Luiz Inácio Lula da Silva
Lula começou naquela eleição uma saga de disputas consecutivas que o levariam, em 2002, à cadeira de presidente da República por dois mandatos consecutivos e mais o terceiro depois de um período fora do poder. À época, Lula ainda falava em reforma agrária, anticapitalismo, entreguismo, classe trabalhadora, imperialismo, sindicalismo e corrupção. Na televisão, a campanha usou um humor irônico e ácido, com sua ‘Rede Povo’ – paródia da Rede Globo –, onde mostrava as desigualdades sociais do Brasil e denunciava os vínculos dos seus adversários com a ditadura militar.
Em 1994, o hoje presidente voltou a disputar e perder a corrida eleitoral para Fernando Henrique Cardoso, o que se repetiu em 1998. Foi depois disso que lançou sua Carta ao povo brasileiro, de 2002, quando indicou que seguiria a cartilha de quem, 13 anos antes, eram considerados “os mal-agradecidos da nação” do mercado financeiro. Na carta, Lula comprometeu-se com reformas aguardadas pelo empresariado – como a tributária e previdenciária – e deu garantias de que nada seria “produto de decisões unilaterais do governo”. Assim, venceu a disputa contra José Serra, e repetiu a dose quatro anos depois contra Geraldo Alckmin.
Após sair do poder, Lula viu sua sucessora, Dilma Roussef, impedida, e ele próprio seria condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro na Operação Lava Jato em 2017, sendo preso em 2018. Lula ficou 580 dias no Presídio de Curitiba, e foi, ao fim, solto, com todas as acusações anuladas por decisão do Supremo Tribunal Federal. Em 2022 foi eleito presidente em seu terceiro mandato, em uma aliança inédita com seu ex-rival, Geraldo Alckmin.
Leonel Brizola
Anteriormente deputado estadual e federal, Leonel Brizola ficou nacionalmente conhecido enquanto governador do Rio Grande do Sul, quando protagonizou a Campanha pela Legalidade em 1961, para garantir a posse do vice-presidente João Goulart após a renúncia do presidente Jânio Quadros.
Após o golpe militar de 1964 no Brasil, Brizola viveu no exílio, retornando ao país apenas após a anistia política em 1979. Com a reorganização política do país e a impossibilidade de reativar o PTB original, fundou o Partido Democrático Trabalhista (PDT). Em 1982, foi eleito governador do Rio de Janeiro, cargo que ocupou até 1987. Durante seu mandato, implementou programas sociais e de infraestrutura, destacando-se na área da educação com os CIEPs (Centros Integrados de Educação Pública).
Na eleição de 1989, lançou-se à presidência, com Fernando Lyra como seu vice. Alcançaram 11.167.665 votos, correspondente a 16,51% do total, ficando em terceiro lugar no pleito. Em 1994, Brizola concorreu novamente à Presidência da República, ficando em quarto lugar na disputa na qual FHC foi eleito já no primeiro turno. Voltou a ter sucesso em eleições estaduais, retornando ao cargo de governador do Rio de Janeiro entre 1991 e 1994.
Brizola morreu em 21 de junho de 2004, no Rio de Janeiro, devido a uma insuficiência cardíaca.
Mário Covas
Antes da eleição presidencial de 1989, Mário Covas já tinha uma carreira política notável. Nascido em 1930, formou-se em engenharia civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) e trabalhou como engenheiro. Sua trajetória política começou no antigo PTB, mas tomou novo rumo após o golpe militar de 1964. Com a extinção dos partidos políticos, Covas foi um dos fundadores do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) em 1966, partido de oposição ao regime que, sob o bipartidarismo imposto pelos militares, congregava diversas correntes políticas contrárias à ditadura.
Como membro do MDB, Covas foi eleito deputado federal por São Paulo em 1966, reeleito em 1970 e novamente em 1974, destacando-se pela sua defesa da democracia. Em 1978, foi eleito senador, mantendo-se como uma figura importante na luta pela redemocratização do país.
Com a abertura política, participou da fundação do PMDB em 1980, que sucedeu o MDB. Em 1983, Covas foi eleito prefeito de São Paulo até 1985. Após deixar a prefeitura, participou da fundação do PSDB, distanciando-se das correntes mais tradicionais, representadas pelo PMDB na época.
Na eleição de 1989, Covas somou quase 8 milhões votos (11,52%), atingindo o quarto lugar. Após a derrota na eleição presidencial, ele continuou a desempenhar um papel importante no cenário político. Em 1990, concorreu ao governo do Estado de São Paulo e foi eleito, assumindo o cargo em 1991. Covas foi reeleito governador de São Paulo em 1998, cargo que ocupou até sua morte, em 2001, devido a um câncer.
Paulo Maluf
Paulo Salim Maluf é uma figura controversa na política brasileira, com uma carreira marcada tanto por realizações em cargos públicos quanto por acusações de corrupção. Nasceu em 1931, formou-se em engenharia e entrou na política pela Arena, partido de sustentação do regime militar. Sua carreira política inclui mandatos como prefeito de São Paulo (1969-1971 e 1993-1996), governador do estado de São Paulo (1979-1982) e Deputado Federal (1983-1987 e 2007-2018).
A eleição presidencial de 1989 foi um momento significativo dessa trajetória. Ao fim do pleito, ficou em quinto lugar, com quase 6 milhões de votos (8,85%), refletindo as divisões dentro do PDS e a dificuldade em se desvincular da imagem do regime militar.
Maluf já foi acusado em diferentes processos por corrupção e lavagem de dinheiro. Entre eles, um que o levou a prisão preventiva por 40 dias em 2005. Em 2017, o STF o condenou a 7 anos e 9 meses e 10 dias de prisão em regime fechado por receber propina das empresas OAS e Mendes Júnior durante sua gestão na Prefeitura de São Paulo. A pena não foi cumprida porque, à época, Maluf gozava de imunidade parlamentar, mas perdeu a possibilidade de concorrer novamente por causa da Lei da Ficha Limpa. Em 19 de março de 2024, o Supremo Tribunal Federal da Suíça determinou a repatriação ao Brasil de US$ 16,3 milhões, equivalente a aproximadamente R$ 80 milhões, que estavam bloqueados nas contas de Maluf no país europeu.
Guilherme Afif Domingos
“Era uma eleição que dependia muito mais do produto do que da máquina. Ou seja, do candidato. Faria tudo de novo. Eu me senti muito recompensado de ter participado”, relembra Guilherme Afif Domingos quando perguntado por que escolheu lançar sua candidatura em 1989, pelo PL. Ele tinha 46 anos na época e seu jingle, “Juntos chegaremos lá”, buscava embarcar no fulgor da renovação política que as eleições daquele ano prometiam.
Administrador de formação, Afif foi um dos deputados da Constituinte de 1988, eleito dois anos antes com mais de 500 mil votos, terceiro colocado. Em 1989, com seu nome em alta, o PL o escolheu para o pleito, completando a chapa com Aluísio Pimenta. Não passou para o segundo turno, levando 3,2 milhões de votos (4,84%). Terminou em sexto lugar.
Afif voltou a se candidatar a senador por São Paulo em 1990, na chapa do governador eleito Luiz Antônio Fleury Filho (PMDB). Diferente da eleição a presidência, encarada por ele como experiência válida, ele lamenta o resultado. “Eu me senti dispensado. Larguei tudo”.
Depois disso, foi presidente do Sebrae e atuou na criação do “Simples Nacional”. Até que recebeu um telefonema. “Fui candidato ao Senado na chapa do Serra. E ele me convidou, então, para trabalhar no governo”, conta, na chefia da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo.
Em 2010, ele completou a chapa eleita de Geraldo Alckmin, como vice-prefeito de São Paulo. Logo no início do governo, foi nomeado secretário estadual de Desenvolvimento, mas foi demitido na sequência, ao se filiar ao recém criado PSD de Gilberto Kassab. Logo em 2013 foi anunciado como ministro-chefe da Secretaria da Micro e Pequena Empresa no governo Dilma Rousseff, cargo que ocupou até 2015.
“Foi ele [Paulo Guedes] que escreveu o capítulo econômico do meu programa de governo como candidato à presidência [de 1989]”. Essa é a explicação de Afif sobre como passou de integrante do Governo Dilma para assessor especial de Paulo Guedes, ministro da economia de Jair Bolsonaro, em 2018. “Eu não tinha nada com o Bolsonaro. Aí, Guedes me chamou e disse: ‘há trinta anos atrás nós sonhamos juntos. Agora, vem me ajudar a realizar o sonho’. Eu fui ajudá-lo”. Hoje ele é secretário especial de Projetos Estratégicos do Estado de São Paulo no Governo Tarcísio.
Ulysses Guimarães
Conhecido nacionalmente pelo papel ativo na luta contra a ditadura militar (1964-1985) e na transição para a democracia, Ulysses Silveira Guimarães ocupou vários cargos públicos importantes. Nascido em 1916, iniciou sua trajetória política no estado de São Paulo, filiando-se ao Partido Social Democrático (PSD). Sua entrada formal na política se deu com a eleição para o cargo de deputado federal em 1950, posição que ocupou por diversas vezes nas décadas seguintes.
Durante o regime militar, Ulysses não apenas se manteve ativo na política como também emergiu como uma das vozes mais fortes da oposição. Ele foi um dos líderes do MDB (Movimento Democrático Brasileiro), demonstrando sua capacidade de liderança e resistência. Sua atuação política nesse período foi marcada pela luta pela anistia, pelas eleições diretas para presidente, na campanha Diretas Já, e pela convocação da Assembleia Nacional Constituinte, da qual foi presidente.
Nessa posição, Ulysses Guimarães não apenas liderou o processo de elaboração da nova Constituição Brasileira, mas também se tornou um dos principais articuladores políticos daquele período, legando um marco indelével no texto constitucional e na Terceira República. Sua candidatura em 1989 não alcançou o sucesso esperado, terminando em sétimo lugar, com 3 milhões votos (4,74%). Em 1990, foi reeleito deputado federal, atuando de forma combativa contra Fernando Collor.
Ulysses Guimarães morreu em em 12 de outubro de 1992, em um acidente de helicóptero em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. Seu corpo nunca foi encontrado. Em 2019, teve o nome inscrito no Panteão dos Heróis da Pátria Brasileira.
Roberto Freire
Candidato pelo Partido Comunista Brasileiro nas eleições de 1989, quando recebeu 769.117 (1,14%) dos votos, Roberto Freire completou 82 anos em abril. Até 2023, ele ainda era presidente do Cidadania, partido que ajudou a fundar em 1992, então sob a sigla PPS. Apesar da idade, ele gosta é de falar sobre o futuro – capitalismo pós-industrial, mundo digital, aldeia global, computadores na palma da mão, e, sobretudo, o porvir da esquerda brasileira.
Freire tem currículo político extenso: lutou contra a ditadura ao lado dos trabalhadores rurais em Pernambuco, virou deputado estadual e federal ainda no regime militar, pelo MDB, então frente da luta democrática contra os militares, e chegou às eleições de 1989 encabeçando o decano Partido Comunista. Alguns anos depois, esteve à frente da dissolução do Partidão, quando criou o PPS. Depois disso, foi ainda senador, deputado federal novamente, e até ministro da Cultura do Brasil em 2016, por convite de Michel Temer, cargo no qual ficou quase um ano, em sua última participação em um cargo político institucional.
“Fomos derrotados sem uma bala sequer. Houve um momento em que isso [o comunismo] apareceu como o mundo do futuro”, disse referindo-se ao fim da União Soviética e à crise do movimento comunista internacional, sem esconder algum saudosismo. “Alguns podem dizer que a mudança foi prematura. Mas agora estamos vendo que, ou ousamos mudar, ou estaremos cada menos presentes na vida política”. Ele continua atento ao futuro da esquerda, campo do qual ainda se vê parte. Com as chuteiras penduradas, Freire opina que o problema não é de comunicação, mas de projeto, e que as esquerdas perderam “o sentido da história” ao apoiar regimes obscurantistas e reacionários, como Venezuela e Rússia. “Existem Marçais da vida, que usam melhor a internet, mas o problema é muito mais profundo. A esquerda não sabe dialogar com o futuro”, vaticinou.
Aureliano Chaves
Nascido em 1929, em Minas Gerais, Antônio Aureliano Chaves de Mendonça foi vice-presidente da República durante o governo de João Figueiredo, de 1979 a 1985, último suspiro do regime militar no Brasil. Ele ocupou os cargos de deputado federal e ministro de Minas e Energia, ainda em meio ao regime militar, pela Arena. Exerceu ainda o cargo de governador em Minas entre 1975 e 1978.
Na eleição presidencial de 1989, Chaves não foi um dos protagonistas: o candidato somou apenas 600 mil votos (0,89%), figurando em nono lugar. Foi membro da Academia Mineira de Letras. Chaves faleceu em 30 de abril de 2003, aos 74 anos, em Belo Horizonte, devido a complicações depois de uma cirurgia para correção de problemas circulatórios.
Ronaldo Caiado
Antes de 1989, Ronaldo Caiado já havia iniciado sua carreira política, embora não ocupasse cargos eletivos. Sua atuação era mais notável no setor agropecuário, onde se destacou como líder ruralista. Caiado ganhou proeminência nacional como presidente da União Democrática Ruralista (UDR), uma organização que defendia os interesses dos proprietários rurais no Brasil. A UDR teve um papel significativo nos debates sobre a reforma agrária durante a década de 1980, e Caiado se tornou conhecido por sua postura firme contra as políticas de redistribuição de terras.
Na eleição de 1989, somou apenas 489 mil votos (0,72%), figurando em 10º lugar. Mas foi em seguida que a carreira política de Caiado deslanchou, sendo eleito para diversos cargos públicos. Venceu para deputado federal pela primeira vez em 1990, pelo Estado de Goiás, cargo para o qual foi reeleito em várias ocasiões. Durante estes mandatos, destacou-se por sua atuação em temas relacionados à agricultura, economia e questões rurais.
Em 2014, Caiado foi eleito para o Senado por Goiás, onde continuou a defender os interesses do agronegócio. Alcançou o cargo de governador do Estado em 2018, após vencer as eleições no primeiro turno. No cargo, implementou políticas focadas na segurança pública, saúde e educação, além de continuar a apoiar o setor agropecuário. Foi reeleito para o cargo de governador em 2022. Hoje, aos 75 anos, segue no cargo, filiado ao União Brasil e já se lançou como pré-candidato à Presidência da República.
Affonso Camargo
Affonso Camargo Neto entra na política ao ser indicado à presidência do Banco do Estado do Paraná e depois Secretário de Fazenda no Estado, entre 1973 e 1974. Ainda durante o regime militar, foi eleito presidente do diretório regional da Arena em 1975 e nomeado senador biônico em 1978, ascendendo ao cenário nacional.
Com o fim da ditadura, migrou para o liderado por Tancredo Neves, depois o acompanhando na transição para o PMDB. Camargo foi indicado como ministro dos Transportes em 1985, após a eleição de Tancredo à Presidência da República, sendo mantido na pasta por José Sarney, depois do falecimento de Neves. Neste período, criou o vale-transporte e, por isso, ficou conhecido como “pai do vale transporte”. Deixou o governo e foi reeleito senador em 1986.
Na eleição de 1989, foi mais um dos candidatos que fez números pouco expressivos, alcançando 379.284 votos, ou seja, 0,56% dos votos válidos. No segundo turno, apoiou a candidatura de Fernando Collor. Quando da eleição do alagoano, voltou à cadeira do Ministério dos Transportes, depois atuando também como ministro das Comunicações.
Affonso ainda foi eleito deputado federal em 1994, 1998, 2002 e 2006. Neste período, foi filiado a partidos como o PPR, PFL e PSDB. Ao todo, Camargo acumulou 54 anos de atuação na política. Morreu no dia 24 de março de 2011, em Curitiba, aos 81 anos.
Enéas Carneiro
Nacionalista, contrário ao aborto e à legalização das drogas, crítico das privatizações da década de 1990, defensor da moratória da dívida pública brasileira, do militarismo, da construção de uma bomba atômica brasileira e conhecido pela verborrágica oposição aos “políticos tradicionais”. O belenense Enéas Carneiro, o doutor Enéas, recebeu 360 mil votos em 1989, mesmo sendo até então desconhecido. O candidato tinha apenas 15 segundos para propaganda eleitoral, e terminava todas com seu bordão icônico, “meu nome é Enéas”. Se dizia pobre e órfão, criado em bairro simples da capital do Pará, e como alguém que havia conquistado formação por mérito próprio. Polímata, foi médico cardiologista, mestre pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e professor de física, matemática, física, química, biologia e português.
Apesar, ou por causa da sua excentricidade, foi eleito deputado federal por São Paulo de 2003 até 2007. Recebeu nada mais nada menos que 1,57 milhões de votos, recorde inatingido por qualquer outro candidato até 2018. Propôs centenas de projetos, na sua maioria arquivados, entre eles um sobre a substituição de combustíveis derivados de petróleo por outros produzidos a partir da biomassa.
Em 2006, acometido por uma pneumonia e uma leucemia mieloide aguda, não disputou as eleições presidenciais. Foi reeleito deputado durante tratamento quimioterápico que o fez perder a barba inconfundível. Em 6 de maio de 2007, aos 68 anos, faleceu. Foi homenageado em uma marcha contra o aborto, em Brasília, dois dias depois.
Marronzinho
José Alcides Marronzinho de Oliveira, o Marronzinho, concorreu nas eleições de 1989 pelo PSP, que tinha apenas registro provisório na Justiça Eleitoral, com Reinaldo Valim como seu vice. A agremiação foi extinta logo após o pleito.
Foi antes candidato a vereador em Osasco, em 1982, e tentou se lançar como candidato à Prefeitura de São Paulo em 1985, mas sem sucesso.
Protagonizou uma série de conflitos e acusações diretas ao então senador Fernando Henrique Cardoso. Em um destes episódios, chamou FHC para uma briga, em outra, teria o acusado de ser “maconheiro”.
Marronzinho ficou conhecido por sua abordagem única em sua campanha e pouco tempo de televisão. Em uma das mais famosas, aparece com uma mordaça. Em outra, fala sobre a seca no nordeste enquanto latidos de cachorro podem ser ouvidos ao fundo.
Na eleição de 1989, obteve 238.408 votos, o que corresponde a 0,35% do total de votos válidos, figurando em 13º lugar, mas à frente de outros nove presidenciáveis.
Marronzinho tentou, mas nunca voltou a se candidatar a nenhum outro cargo eletivo. O mais recente registro de que se tem notícia aponta que hoje Marronzinho mora com a família e atua como pastor evangélico em Cabreúva, cidade que fica a 86 quilômetros de São Paulo.
Paulo Gontijo
Natural de Bom Despacho, Minas Gerais, Paulo Gontijo se formou em engenharia na Universidade Federal de Minas Gerais. Chegou a se candidatar a deputado federal pelo Estado, mas não foi eleito. Ele publicou cinco livros, abordando temas como física e ciência política. Escreveu ainda uma tese sobre a transposição das águas do rio São Francisco e a construção de Represas de Cabeceiras.
Em 1989, foi candidato à Presidência pelo Partido do Povo (PP), fundado por ele mesmo. Como promessa de campanha, defendia a construção de 200 mil represas no Nordeste e outras 200 mil na bacia do Rio São Francisco. Além disso, advogou pela construção de uma rodovia ligando Xique-Xique, na Bahia, a Benjamin Constant, no Alto Solimões. Seu nome constou nas cédulas de votação da época como “PG”. Ficou em 14° lugar na disputa, conquistando apenas 198.710 votos, correspondente a 0,29%.
Sofrendo de esclerose lateral amiotrófica (ELA), promoveu uma campanha destinada a procurar a cura da doença, tendo escrito quatro teses sobre o assunto. Faleceu em junho de 2002, em Brasília.
Zamir José Teixeira
Candidato pelo PCN, o economista paranaense Zamir José Teixeira havia ocupado o cargo de vereador de Campo Mourão/PR, por três mandatos. Como vice, foi lançado o presidente e fundador do PCN, o gaúcho William Pereira da Silva.
O partido obteve 60 segundos na propaganda eleitoral gratuita nacional, chamando a atenção dos eleitores por uma narrativa curiosa. A chamada dizia: ‘Vote Zamir - Do Acre à Santa Catarina’, fato que gerou brincadeiras e especulações sobre separatismo do Rio Grande do Sul, que foi deixado de fora. Dentre os 22 candidatos à Presidência, Zamir ficou em 15º lugar, com 187.164 votos, ou seja, 0,28% dos votos.
Ao saber que o apresentador e Silvio Santos, dono do SBT, buscava se candidatar, Zamir chegou a oferecer seu espaço. O apresentador optou pelo PMB, mas teve sua candidatura impugnada pela Justiça Eleitoral.
Em 1990, chegou a ser eleito suplente de senador. Os mais recentes registros de que se tem notícia apontam que Zamir, aos 82 anos, é empresário e hoje reside em Curitiba, no Paraná.
Eudes Mattar
Eudes de Oliveira Mattar, filho do médico paulista Tufik Mattar, lançou-se candidato em 1989 pelo Partido Liberal Progressista, fundado no ano anterior. Sua chapa tinha ainda Dante Lazzaroni Júnior, como vice. Tufik manifestava sua vontade de criar um partido. Ele foi médico de políticos proeminentes, como Juscelino Kubitschek, Ademar de Barros e Jânio Quadros; chegando a escrever um livro chamado “Nas Entranhas do Poder”.
O candidato recebeu uma massiva votação no município de Esperantina, no Piauí, um forte reduto do PT. Os eleitores do pequeno município rural, muitos analfabetos, teriam sido instruídos a votar no “primeiro da cartela”: Lula. Contudo, especula-se que, como não sabiam ler, viraram a cartela de cabeça para baixo e marcaram o primeiro candidato: Eudes Mattar.
“Vote 55, o último da cédula”. Foram as palavras ditas por Mattar em seus 30 segundos de campanha na TV. Eudes alcançou 162.343 votos, 0,24% dos válidos.
Em 2006, o Estadão publicou um perfil de Eudes, relembrando algumas de suas promessas e opiniões, além de informar que ele se exilou da política desde a derrota na eleição. A reportagem apurou que Eudes, aos 75 anos, é dono de empresas e segue morando no Rio de Janeiro.
Livia Maria Pio
Lívia Maria Pio foi a primeira mulher a concorrer às eleições presidenciais no Brasil, pelo Partido Nacionalista (PN), fundado pelo general Nemo Canabarro. “A mulher é eleita para dizer um basta e salvar o Brasil” era o mote de sua campanha, que recebeu 180 mil votos. A servidora pública aposentada pelo Banco do Brasil nunca mais concorreu a alguma eleição, mas não deixou de lado a atuação política. Tentou, a partir de 2013, fundar uma nova sigla, o Partido do Brasil Forte, inspirado nas ideias desenvolvimentistas dos militares, mas não arrecadou as assinaturas necessárias. Em 2018, declarou voto em Jair Bolsonaro. Ela reside em Brasília (DF).
Fernando Gabeira
Fernando Gabeira, conhecido pela sua carreira como jornalista e escritor, e por sua participação na luta armada contra a ditadura, concorreu às eleições de 1989 pelo Partido Verde, criado naquele ano após uma ruptura com o PT. Recebeu 0,19% dos votos, 125,8 mil, ficando entre os menos votados daquela eleição. Mas a projeção o permitiu concorrer e vencer as eleições para deputado federal, em 1994, e novamente em 2006. Disputou a Prefeitura do Rio de Janeiro em 2008, perdendo no segundo turno por uma diferença de apenas 1,66% contra Eduardo Paes. Dobrou a aposta e tentou se eleger governador do Estado em 2010, sofrendo uma derrota contundente para Sérgio Cabral Filho. Desde então, não concorreu a cargos eletivos; em 2013, se tornou comentarista da GloboNews.
Apesar da participação no MR-8 – esteve presente em episódios emblemáticos, como o sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick –, Gabeira passou a assumir a defesa do liberalismo político e econômico durante a redemocratização. Seu partido é conhecido por defender a descriminalização da maconha, o direito ao aborto e o casamento homoafetivo.
Celso Brandt
Em 1989, Celso Brandt já era um político veterano. Nascido em Diamantina, em 1920, iniciou a carreira política pelo PR, ligado ao governador de Minas, Clóvis Salgado. Passou por áreas técnicas ligadas à educação, chegando a ser ministro da Educação durante o governo de Juscelino Kubitschek.
Foi eleito deputado federal em 1956 e 1962 pelo Estado de Minas Gerais. Teve seus direitos políticos cassados no golpe militar de 1964, ficando inelegível por 10 anos.
Antônio Pedreira
Antônio foi um dos candidatos menos votados da eleição de 1989, sendo um novato na política da época. Havia disputado a Prefeitura do Rio de Janeiro em 1985, além do Senado Federal em 1986, quando fez mais de 100 mil votos — mas não foi eleito. O bom desempenho o estimulou a lançar-se candidato à Presidência em 1989, quando recebeu apenas 86.107 votos, correspondentes a 0,13%.
Voltou ao cenário nacional em 2005 ao ser citado no escândalo do Mensalão, em meio ao governo Luiz Inácio Lula da Silva. Seu nome foi levantado pelo então diretor de material dos Correios, Maurício Marinho, que o acusava de ser “amigo” do então deputado federal Roberto Jefferson.
Pedreira morreu em 2013, enquanto dirigia, em Brasília, devido a uma parada cardíaca.
Manoel Horta
Não se sabe sobre o que aconteceu com Manoel Antonio de Oliveira Horta após as eleições de 1989. O Partido da Democracia Cristã do Brasil (PDCdoB), pelo qual concorreu, foi extinto no ano seguinte em uma tentativa frustrada de fusão com o PRTB. Desde então, o nome sumiu completamente do noticiário.
Armando Corrêa
Armando ficou famoso por ceder sua candidatura ao apresentador Silvio Santos, que aspirava a se eleger presidente. O PMB foi fundado pelo pastor e advogado Armando Corrêa, que lançou a si mesmo como candidato em São Paulo nas eleições municipais de 1985 e 1988. No ano seguinte, repetiu a dose e se lançou à Presidência da República, depois cedendo o espaço para Santos.
A campanha foi impugnada pela Justiça Eleitoral, depois de dezenas de pedidos dos demais presidenciáveis. O argumento foi que o PMB não havia realizado o número mínimo de convenções regionais exigidas por lei. Com isso, todos os votos depositados em Corrêa/Santos foram anulados.
Um fato curioso é que antes da anulação da candidatura, Silvio Santos fez campanha na televisão pedindo para que as pessoas assinalassem “Corrêa” nas cédulas, que já estavam impressas e não poderiam ser trocadas a tempo da eleição. Armando chegou a convidar o apresentador Silvio Santos a concorrer à Prefeitura de São Paulo, mas ele não participou.
Depois da eleição, tentou registrar o Partido Municipalista Social Democrático (PMSD), mas teve o registro definitivo negado. A reportagem não achou nenhum registro recente que indique onde mora Corrêa.
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