BRASÍLIA – A cada quatro anos, as eleições municipais de São Paulo são marcadas por episódios que entram para a história da política brasileira. Em 2024 não vai ser diferente, já que a atual campanha dos candidatos à Prefeitura tem como destaque frases de efeito e trocas de ofensas em debates, reviravoltas nas pesquisas de intenção de voto e lágrimas em sabatina.
As eleições em São Paulo, maior cidade do País, já foram protagonizadas por políticos que moldaram a política brasileira moderna. Há quarenta anos, atitudes dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso, Jânio Quadros, Fernando Collor e do do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se tornaram folclóricas. O mesmo foi feito por ex-prefeitos que estão na memória dos paulistanos, como Fernando Haddad, Marta Suplicy e Paulo Maluf.
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Os momentos marcantes deste ano vão figurar ao lado de outros episódios emblemáticos que ocorreram nas disputas anteriores. Em série especial publicada nesta semana, o Estadão selecionou cinco episódios que marcaram as eleições para a Prefeitura, desde o primeiro pleito realizado após o fim da ditadura militar, em 1985.
FHC sentou na cadeira de prefeito antes da hora e Jânio Quadros desinfetou o móvel
Em 1985, na primeira eleição municipal após a ditadura militar (1964-1985), Fernando Henrique Cardoso, que então era o candidato do MDB à Prefeitura, posou para fotógrafos sentado na cadeira do gabinete do Executivo municipal na véspera do pleito.
As pesquisas de opinião apontavam que FHC, então candidato de centro-esquerda, era o favorito a vencer a disputa apertada. O principal adversário dele era Jânio Quadros, então filiado ao PTB e representante do conservadorismo.
A eleição teve um resultado inesperado. Com os eleitores progressistas se dividindo entre Fernando Henrique e o ex-senador Eduardo Suplicy (PT), Jânio venceu a disputa com 39,3% dos votos válidos contra 35,8% de FHC. Não havia segundo turno na época.
Jânio arquitetou uma “vingança” contra FHC e colocou o plano em prática no dia seguinte à posse na Prefeitura: convocou jornalistas para fazerem o registro dele despejando desinfetante na cadeira. “Gostaria que os senhores testemunhassem que estou desinfetando esta poltrona porque nádegas indevidas a usaram. Porque o senhor Henrique Cardoso nunca teria o direito de sentar-se cá e o fez, de forma abusiva. Por isso, desinfeto”, disse.
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Lula apertou a mão de Maluf em troca de tempo de televisão para Haddad
Em 2012, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi até a casa do ex-prefeito Paulo Maluf, um dos principais rivais políticos dele, para negociar a entrada do PP na coligação do então candidato do PT à Prefeitura, Fernando Haddad.
O PT queria o PP na coligação para ter um minuto e meio a mais de tempo de televisão para Haddad, que não era conhecido pelo eleitor paulistano naquele ponto da campanha. Em troca, Maluf pediu que Lula apertasse a mão dele na frente da imprensa.
“Não faço casamento no porão da igreja. Ou é no altar, publicamente com o cardeal, ou não tem casamento. Se o Lula for almoçar em casa, então o partido vai apoiar o Fernando Haddad”, disse Maluf em entrevista à Folha de S. Paulo em 2016, relembrando o dia em que Lula foi à casa dele.
Lula não queria ir ao encontro de Maluf, mas foi convencido por aliados petistas a aceitar o convite. A foto ao lado de Maluf escandalizou a política paulistana e foi chamada de “o retrato do coronelismo” em edição do Estadão veiculada no dia seguinte ao evento. O registro motivou a saída da deputada Luiza Erundina, que era a vice de Haddad, da campanha.
Em 2017, quando Maluf foi preso após ser condenado por lavagem de dinheiro na época em que comandou a Prefeitura, Lula disse a jornalistas que nunca havia se perdoado por apertar a mão do político.
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Collor tentou voltar à política se elegendo prefeito de SP, mas teve candidatura indeferida
Em 2000, o ex-presidente Fernando Collor de Mello tentou se eleger prefeito de São Paulo pelo PRTB, mesma sigla de Pablo Marçal, candidato à Prefeitura neste ano de 2024. O plano de Collor era voltar à política com chave de ouro, comandando a maior cidade do País após ficar oito anos fora da vida pública depois do impeachment que sofreu em 1992.
Collor buscou utilizar a campanha em São Paulo para fazer o período dele na Presidência ser “passado a limpo”. O mote de revisitar o mandato no governo federal, contudo, tornava a plataforma de campanha estranha ao contexto local.
O ex-presidente não tinha conexão alguma com a capital paulista. Natural de Maceió, o ex-presidente, ao longo da vida, já havia morado em Brasília e no Rio, em função da carreira política do pai, o ex-senador Arnon de Mello.
Os obstáculos não chegaram a ser colocados em jogo, já que Collor teve a candidatura indeferida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A Justiça Eleitoral considerou que ele ainda estava inelegível devido ao impeachment de 1992, e a candidatura foi cassada.
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Em 2000, debate entre Marta e Maluf foi marcado por troca de xingamentos
Neste ano, os debates eleitorais entre os candidatos à Prefeitura estão repletos de ofensas pessoais, com a apresentação de propostas para a cidade deixada de lado. Essa não é uma novidade no pleito pelo Executivo paulistano, já que bate-boca entre concorrentes também marcou na eleição municipal de 2000.
Naquele ano, a ex-prefeita Marta Suplicy (PT) foi para o segundo turno contra Paulo Maluf (PPB, atual PP). No debate entre os dois transmitido pela TV Bandeirantes, Marta declarou que Maluf era um “mentiroso contumaz” e o ex-prefeito respondeu chamando a petista de “desqualificada”.
Com os ânimos acirrados, o candidato do PPB disse que a petista deveria “ficar quietinha, sem dar palpites”. No fundo, Marta mandou Maluf “calar a boca”. A troca de insultos foi veiculada ao vivo para os eleitores paulistanos.
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Vice de Boulos, Marta fez carreata para pedir votos contra o candidato do PSOL em 2020
Na última eleição, Marta Suplicy, que atualmente é vice na chapa do candidato do PSOL, Guilherme Boulos, participou de uma carreata para pedir votos contra o deputado federal. Boulos estava disputando o segundo turno contra o ex-prefeito Bruno Covas (PSDB), e a campanha do tucano aproveitou a imagem de Marta para conquistar votos na periferia paulistana.
Antes do pleito, Marta chegou a ser cotada para compor a chapa com Covas. O acordo não vingou e quem foi o vice do tucano foi o atual prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB). Agora, Nunes é adversário de Boulos e Marta.
No dia do segundo turno, quando o tucano venceu o candidato do PSOL por uma diferença de um milhão de votos, Marta posou ao lado de Nunes e de Covas para jornalistas. Ela ocupou o secretariado dele e permaneceu na gestão de Nunes, que assumiu a Prefeitura em 2021 devido à morte do titular. Em janeiro deste ano, ela deixou o governo do emedebista para se unir a Boulos e voltou ao PT, partido do qual se desfiliou em 2015, disparando críticas sobre o envolvimento da legenda em esquemas de corrupção.
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