"Recebi a minha licença em 1964, foi pelas mãos do próprio coronel José Vicente de Faria Lima", diz Francisco Alves do Nascimento, de 79 anos, um dos ambulantes mais antigos da cidade. Deficiente visual, ele tem autorização da Justiça para trabalhar na rua mais concorrida da capital, a 25 de Março, na região central de São Paulo.
No ano passado, foi a primeira vez que esteve na ilegalidade, quando o então prefeito Gilberto Kassab (PSD) cassou a licença dele e de todos os outros camelôs de São Paulo. "Fiquei um ano sem trabalhar até a Justiça autorizar", lembra.
Apesar da tradicional perseguição do poder público à categoria, ele gosta das coisas certas e defende a regularização do setor. "O policial que vem cobrar o meu documento aqui é meu amigo. Eu tenho tudo aqui, nota fiscal, tudo certinho", diz ele. "Mas também não adianta fiscalizar só camelô. Um terço dessas lojas aqui da 25 não tem alvará, você acredita?"
Nas ruas da cidade, muitos vendedores ambulantes pensam igual a ele. Foi pela falta de atuação da Prefeitura que um grupo de vendedores informais protestou na última segunda-feira, dia 12, na Rua Libero Badaró, na frente da Secretaria Municipal das Subprefeituras.
Os ambulantes cobram mais ação no Grupo de Trabalho dos camelôs, que foi criado em maio. Com isso, foi suspensa ação civil pública que era movida contra a Prefeitura e estipulado um prazo de 180 dias para que fosse criado um plano para os vendedores ambulantes da cidade. Até agora, não se chegou a nenhuma conclusão sobre o assunto.
"A gente tem um passivo de trabalhadores que, desde 2005, tiveram os Termos de Permissão de Uso (TPUs) cassados e estão aí todo esse tempo sem poder trabalhar", afirma o advogado André Alcântara, do Centro Gaspar Garcia, que trabalha com ambulantes da cidade.
Regularização. Em maio, o subprefeito da Sé, Marcos Barreto, convocou para atualização cadastral 510 camelôs da região da Rua 25 de Março que tiveram as licenças cassadas por Kassab. Se os ambulantes convocados apresentarem documentos que atestem o cumprimento das exigências do governo para o comércio informal no centro, eles voltam a ganhar o TPU. Hoje, todos trabalham com liminares.
Alcântara afirma, por exemplo, que há espaços onde os ambulantes que tiveram os TPUs cassados poderiam voltar a atuar, como em estádios. A proibição do tradicional sanduíche de pernil vendido nas barraquinhas antes e depois dos jogos também foi decretada durante a gestão Kassab.
O advogado diz que o comércio informal tenta se regularizar, mas enfrenta grande resistência do poder público para obter a licença. "Se uma rede de lanchonetes quiser colocar um stand na rua, tem mais facilidade do que os camelôs", diz Alcântara. Outra carência, afirma ele, é capacitar o setor. Medidas como essa, segundo Alcântara, poderiam ajudar a diminuir um dos principais problemas, que é o trabalho infantil.
Questionada sobre qual será a política em relação aos vendedores ambulantes, a Prefeitura não se manifestou.
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