SÃO PAULO - Dezembro de 2016. O então açougueiro Daniel da Silva, de 28 anos, desce de um ônibus na Rodoviária do Tietê, vindo de São José dos Campos. Compra cinco pedras de crack nas imediações e vai a pé para a Cracolândia. Está lá até hoje.
A história do rapaz se junta à de centenas de usuários de drogas que se amontoavam no “fluxo” de viciados na Rua Helvétia e na Alameda Dino Bueno e que, hoje, se espalham por vários pontos da cidade, principalmente na Praça Princesa Isabel.
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A reportagem conheceu Silva na praça. Sozinho, ele estava sentado em um banco, pensativo. Sem fazer cerimônia, começou a conversar. “Este lugar vai ficar cada vez mais cheio de usuários. Todo mundo que tava lá (na Alameda Dino Bueno) veio pra cá”, disse ele. O Estado o acompanhou durante toda a semana.
Silva começou a usar drogas aos 13 anos, na Bahia, onde morava com a avó. Filho único, perdeu a mãe quando tinha apenas 9 anos. “Eu experimentei maconha, depois fui para a cocaína. O crack, eu conheci com 18 anos. A sensação é indescritível, embora dure menos de dez segundos”, ressaltou.
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Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
1 / 20Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Segundo a polícia, 20 quilos são vendidos por dia com um faturamento estimado em R$ 8 milhões mensais Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Justiça expediu cerca de 70 mandados de prisão e 50 de busca e apreensão Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Ruas da Cracolândia foram cercadaspor policiais; muito lixo também foi espalhado pelas vias da região Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Usuários de drogas revoltados e angustiados com a ação na Cracolândia Foto: WERTHER SANTANA/ESTADAO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Operação foi encerrada por volta das 8h30; PMs permaneceram na região da Alameda Dino Buenopara garantir a segurançados garis durante a limpeza Foto: WERTHER SANTANA/ESTADAO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Policiais civis e policiais militares do Comando e Operações Especiais (Coe) também cumpriram ação na Favela do Moinho Foto: GABRIELA BILO/ ESTADÃO
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Agentes ingressaram no interior da favela em busca de procurados Foto: GABRIELA BILO/ ESTADÃO
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Operação policial também chama a atenção de animais de estimação da Favela do Moinho, na zona central de São Paulo Foto: GABRIELA BILO/ ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Foco da operação está na Alameda Dino Bueno; segundo a polícia, traficantes montaram 34 barracas na via para vender crack 24 horas por dia Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Segundo a polícia, 20 quilos são vendidos por dia com um faturamento estimado em R$ 8 milhões mensais Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Polícia Civil realiza, na manhã deste domingo, 21, uma grande operação na região da Cracolândia, no centro de São Paulo Foto: WERTHER SANTANA/ESTADAO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Traficantes contam com a ajuda dos usuários, cerca de 800, que ocupam a rua e dificultam a entrada da polícia Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Helicópteros sobrevoam a Cracolândia e a região está totalmente cercada; policiais também apreendem armas Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Usuários de drogas acompanham operação policial na Cracolândia Foto: WERTHER SANTANA/ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Não foram vistos assistentes sociais acompanhando a ação e a polícia não informousehouve planejamento para encaminhar os usuários a um abrigo ou unida... Foto: WERTHER SANTANA/ESTADAOMais
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Cerca de dez viaturas chegaram à região às 7 horas na Favela do Moinho Foto: GABRIELA BILO/ ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Favela do Moinho: Helicóptero da Polícia Civil sobrevoou o local em apoio à operação Foto: GABRIELA BILO/ ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Policiais civis e policiais militares do Comando e Operações Especiais (Coe) também cumprem mandados na Favela do Moinho, na região central Foto: GABRIELA BILO/ ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Moradores acompanham a operação apreensivos; crianças também observam a ação policial Foto: GABRIELA BILO/ ESTADÃO
Polícia faz operação para prender traficantes na Cracolândia
Policiais também cumprem mandados na Favela do Moinho, na manhã deste domingo Foto: GABRIELA BILO/ ESTADÃO
Por causa do vício, Silva saiu da casa da avó aos 23 anos e foi para São José dos Campos, no interior de São Paulo. Primeiro, ficou em uma clínica de recuperação. Passou um ano e meio “limpo”. Conseguiu, então, um emprego de açougueiro. “Comecei a trabalhar e a crescer profissionalmente. Conseguia ganhar R$ 3 mil por mês. Em pouco tempo, aluguei uma casa e financiei um carro, mas as pequenas pedras acabaram com tudo.”
Segundo ele, após uma discussão no trabalho, decidiu fumar uma pedra de crack. “Foi o excesso de confiança de que eu podia usar uma vez só e parar. Mas, naquele dia, eu também decidi conhecer a Cracolândia. Peguei um ônibus e vim para São Paulo. Perto do Tietê, comprei cinco pedras e não parei mais.”
Um dia após megaoperação na Cracolândia, usuários de droga seguem no centro de São Paulo
1 / 18Um dia após megaoperação na Cracolândia, usuários de droga seguem no centro de São Paulo
Cracolândia
Apósa megaoperação das Polícias Civil e Militar neste domingo, 21, o centro de São Paulo amanheceu com usuários de droga em ruas da região e do entorn... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Cracolândia
A reportagem doEstadoconstatou nesta segunda-feira que os usuários avançaram para outras vias fora do 'quadrilátero do crack'. Foto: Werther Santana/Estadão
Cracolândia
O chamado 'quadrilátero do crack' é formado por Alameda Dino Bueno, Rua Helvétia, Alameda Cleveland e Avenida Duque de Caxias. Na foto, o cruzamento d... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Cracolândia
O lixo que se acumulou após a megaoperação também continuava nas ruas da região nesta segunda-feira. Foto: Werther Santana/Estadão
Cracolândia
No domingo, um total de 900 policiais, entre civis e militares,realizaram uma das maiores operações na Cracolândia e na região contra o tráfico de dro... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Cracolândia
OEstadoflagrou usuários de droga na esquina da Avenida Duque de Caxias com a Rua Santa Ifigênia. Foto: Werther Santana/Estadão
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A polícia desmontou as 34 barracas da feira de drogas que funcionava na área e comercializava 19 quilos de crack por dia. Foto: Werther Santana/Estadão
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Na Rua Helvétia, moradores de rua e usuários de droga carregam seus colchões e outros pertences. Foto: Werther Santana/Estadão
Cracolândia
Segundo a polícia,foram presos 38 traficantes durante a megaoperação- entre eles estão bandidos que foram filmados segurando armas no entorno, nas últ... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
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Vista geral do cruzamento da Rua Helvétia com a Alameda Dino Bueno, esquina que faz parte do 'fluxo', dentro do 'quadrilátero do crack'. Foto: Werther Santana/Estadão
Um dia após operação, Cracolândia tem fluxos 'paralelos'
A reportagem do Estado circulou por toda a manhã e início da tarde nas ruas do centro no entorno da Cracolândia e constatou que pequenos fluxos se mon... Foto: JF Diorio/EstadãoMais
Um dia após operação, Cracolândia tem fluxos 'paralelos'
Um dia após a operação do governo do Estado para prender traficantes na Cracolândia, na região central de São Paulo, o fluxo de usuários de crack e mo... Foto: JF Diorio/EstadãoMais
Cracolândia
Equipes da Prefeitura de São Paulo trabalham para limpar a área da Cracolândia. Foto: Werther Santana/Estadão
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Funcionário da Prefeitura limpa a Rua Helvétia. Foto: Werther Santana/Estadão
Cracolândia
As investigações que resultaram na megaoperação começaram a ser feitas pelo Departamento de Investigação Sobre Narcóticos (Denarc) em novembro, quando... Foto: Werther Santana/EstadãoMais
Um dia após operação, Cracolândia tem fluxos 'paralelos'
Um dia após a operação do governo do Estado para prender traficantes na Cracolândia, na região central de São Paulo, o fluxo de usuários de crack e mo... Foto: JF Diorio/EstadãoMais
Cracolândia
Investigadores entraram em hotéis e estabelecimentos comerciais à procura de traficantes, armas e drogas. Foto: Werther Santana/Estadão
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Vista geral da Alameda Dino Bueno,um dia depois da megaoperação das Polícias Civil e Militar. Foto: Werther Santana/Estadão
No ‘fluxo’. Silva lembra de ter chegado à Alameda Dino Bueno numa madrugada. No começo, teve medo. A aparência dos usuários o assustou. “Não imaginava que eram tantas pessoas assim. Por causa disso, ficava à vontade para usar o crack. Perto de mim havia outra pessoa fazendo a mesma coisa.”
Mas ele se adaptou rapidamente. Durante dez dias, fumou uma pedra de crack atrás da outra. Quando percebeu, tinha perdido todas as economias: R$ 12 mil. “A partir daí, eu vi que estava sem emprego, casa, documento, tudo. Passei a me desfazer das roupas e calçados até ficar sem nada.”
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A convivência na Cracolândia lhe ensinou alguns cuidados. Segundo ele, um usuário nunca fuma crack sem estar encostado na parede. “Isso impede de ser atacado pelas costas. Já fui roubado assim”, contou. Sem dinheiro e trabalho, Silva sobrevive na Cracolândia como catador de latinhas e fazendo “corre” para outros viciados. “Eu, às vezes, sou procurado para buscar pedra para outro usuário que chega aqui de carrão. Ganho uma comissão”, explica.
Silva afirma que guardará as imagens do “fluxo” que já não existe no quadrilátero do crack. “Era um bando de zumbis, eu inclusive, andando de um lado para o outro.”
Susto com as bombas. No dia da megaoperação policial, que contou com 900 agentes e helicópteros, Silva havia usado crack algumas horas antes. “Foi a última vez... Eu lembro que me assustei com as bombas. Tivemos de correr para a avenida (Duque de Caxias), tinha muitos policiais.”
Quando falou com o Estado pela primeira vez, na terça-feira, Silva estava havia dois dias sem fumar. “Se a Cracolândia vai acabar? Pode ser que acabe, mas o crack nunca vai acabar, o tráfico nunca vai acabar, porque existe o usuário.”