Se confirmado que foi de autoria do Primeiro Comando da Capital (PCC), o atentado que matou um empresário a tiros na tarde desta sexta-feira, 8, no Aeroporto de Guarulhos, na Grande São Paulo, representa o “ápice da audácia” da facção, na avaliação da desembargadora Ivana David. Antonio Vinicius Lopes Gritzbach, que havia feito acordo com as autoridades para delatar esquemas da organização, foi executado a tiros.
Por outro lado, segundo a juíza do Tribunal de Justiça de São Paulo com experiências em casos ligados a organizações criminosas, esse foi o puro cumprimento do estatuto que orienta a conduta do PCC desde sua fundação, há mais de 30 anos.
A polícia ainda investiga quem são os autores do atentado - pelo menos 27 tiros foram disparados, segundo a perícia, Dois motoristas de aplicativo e uma passageira que desembarcava de outro voo ficaram feridos.
A senhora avalia que, confirmado o PCC como autor desse homicídio, ele representa um aumento da ousadia da facção?
Do que se conhece da facção desde que ela nasceu até hoje, o que aconteceu - de mandar matar um indivíduo que desviou dinheiro (ele mesmo confessa) - é simplesmente cumprir o que manda o estatuto. Quem desvia dinheiro trai a facção e morre. Guarda coerência com tudo que o PCC fez nesses 30 anos.
A facção não mudou, nesses 30 anos?
O que mudou foram os ‘players’ (atores envolvidos). Antigamente eram pequenos traficantes, presos ou ex-presidiários. A facção cresceu, o volume de dinheiro envolvido aumentou muito, então as pessoas envolvidas são mais poderosas.
E o crime desta tarde?
A audácia do local, o maior aeroporto do País, às 4 horas da tarde de uma sexta-feira, na faixa de pedestre, a tiros de fuzil. Essa é uma situação gravíssima. Certamente vai ecoar no mundo: ‘que segurança esse País oferece?’. (O crime aconteceu) num lugar que até poucas semanas atrás estava em GLO (decreto federal de Garantia da Lei e da Ordem). Antigamente se matava no matagal, escondido, desovava o corpo em algum lugar ermo. Hoje se faz à luz do dia. É o ápice da audácia. Tem outro aspecto: para saber qual era o voo da vítima de hoje, ela provavelmente estava sendo monitorada, talvez seguida. De uns tempos pra cá, o PCC tem investido nessa estrutura, investido para matar quem traiu a facção.
O Brasil se aproxima da situação de criminalidade de países como o México, onde há guerras de cartéis de drogas?
O que assistimos hoje é praticamente um atentado, como se vê no México. Faz tempo que a gente tem falado sobre isso, a “mexicanização” do Brasil. Em um ano, o número de facções no País aumentou significativamente.
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Como interromper esse crescimento?
O narcotráfico só cresce no Brasil. A forma de combater é a forma que a Itália fez (com as máfias): investigar, retirar força econômica, identificar as lideranças. O Brasil faz fronteiras com dez países; precisa fazer cooperação internacional. E o Brasil é o segundo maior consumidor de cocaína do mundo. Não é só um corredor do tráfico.
As leis precisam mudar?
Pior do que as leis é a interpretação que muitas vezes se faz delas. O que desafia mais é a interpretação que se dá à legislação. A Lei de Organização Criminosa, por exemplo, dá pena de três a oito anos. Mas aí vem a jurisprudência: “coitadinho, porque é mulher, porque é só ‘mula’”, e assim vai mudando a interpretação.
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