Barulho das obras da Linha 6 - Laranja do Metrô tira sono de vizinhos: 'Durmo só 3 horas por noite'

Irritados com ruídos dia e noite, moradores da Pompeia e de Perdizes fazem abaixo-assinado e até se mudam de casa; concessionária afirma adotar medidas para reduzir transtornos

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Por Isabela Moya e

Barulho de geradores, sirenes, apitos, caminhões e guindastes 24 horas por dia. É assim que moradores dos bairros de Perdizes e Pompeia, na zona oeste de São Paulo, descrevem o dia e a noite em suas residências desde 2021, com o retorno, após quatro anos, das obras para a construção da Linha 6–Laranja do Metrô, que ocorrem até nas madrugadas. A entrega do novo ramal está prevista para 2025.

Os vizinhos alegam não conseguir dormir e pedem pelo fim do ‘3.º turno’ das obras. Lucas Baccelli, de 38 anos, empresário e subsíndico de um dos prédios próximos da futura Estação PUC-Cardoso de Almeida, em Perdizes, diz ter entrado com pedido no Ministério Público para investigar crime sonoro, e há ainda abaixo-assinado com adesão de mais de 150 moradores. A vizinhança diz não ser contra a obra, mas pede para que ela seja feita só durante o dia.

Barulhos de obras da Linha 6–Laranja do Metrô causam transtornos nos bairros de Perdizes e Pompeia Foto: TIAGO QUEIROZ / Estadão

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“Durmo três horas por noite”, diz Baccelli. Ele relata ter sua saúde física e mental afetadas. “Comecei a ter sintomas gastrointestinais, fiz vários exames, mas todos foram ótimos. Contei ao médico que estava dormindo pouco por causa do barulho da obra e ele me disse que os problemas gastrointestinais podem advir da ansiedade, que adquiri por não conseguir descansar”, afirma o empresário, que também tem a rotina de trabalho prejudicada, por fazer home office. 

Carla, que pediu para não usar o nome verdadeiro, mora próximo de Baccelli, no prédio ao lado da obra, e decidiu se mudar do próprio apartamento, mesmo sem saber se vai conseguir alugá-lo. Ela, de 31 anos, relata que o estresse causado pelo barulho tem prejudicado não só a saúde dela e do marido, como também a tentativa deles de ter um filho.

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O empresário Lucas Baccelli buscou Ministério Público após terimpactos na saúde física e mental Foto: TIAGO QUEIROZ / Estadão

“Desenvolvi colesterol alto sem ter nenhum outro fator associado, então o médico constatou que era pelos picos de estresse. E meu marido teve muitas crises de ansiedade, e também precisou entrar com medicamento.” Os remédios que eles tomam, diz Carla, podem atrapalhar a fertilidade. O casal chegou a instalar janelas antirruído, que não vedaram completamente o barulho.

Ela comprou um medidor de decibéis, e conta que o ruído diário costuma alcançar mais de 70dB à noite, já tendo chegado a 105db em um dia. Na cidade de São Paulo, é proibido que obras gerem ruídos acima de 59db depois das 19h. A Prefeitura, contudo, informou que obras públicas não têm limite de horário ou ruído. Em Perdizes e na Pompeia, moradores relatam que vários vizinhos têm procurado se mudar, entregando ou colocando apartamentos para vender, e contam que locatários reclamam da dificuldade em alugar imóveis nos bairros.

Alergia, mudança de horário e remédio para dormir

Vizinha de Carla, a dentista Aline Ferreira, de 36 anos, conta que os problemas respiratórios e alérgicos têm aumentado por causa da grande quantidade de poeira que entra no apartamento. Mas o que mais incomoda sua família é o barulho de conversas na madrugada vindo da casa de apoio aos trabalhadores da obra. “Todo dia acordo com dor de cabeça. Chego no trabalho sonolenta, não consigo ter o mesmo desempenho”, diz Aline, cuja filha de 12 anos tem autismo, e acorda diversas vezes na madrugada. 

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“Como a maioria dos autistas, ela tem sensibilidade auditiva. Fica mais nervosa, estressada. Tivemos de trocar o horário da escola dela do período da manhã para a tarde, para ver se ela consegue dormir um pouco mais”, acrescenta.

A situação de Flávia Angi, de 48 anos, que mora a um quarteirão da futura Estação Sesc-Pompeia, também na zona oeste, é parecida. A fisioterapeuta relata que ela e os filhos passam o dia de fone de ouvido, seja para trabalhar ou escutar músicas que disfarcem os ruídos externos. “Mas o que mais a incomoda é a madrugada. Fica difícil dormir. Às vezes tenho de tomar remédio indutor de sono, e uso tampão, mas nem sempre resolve, porque quando está calor, não consigo fechar a janela”, conta.

Síndica Jacqueline Toledo tem problemas para conseguir dormir por conta do barulho e iluminação Foto: FOTO TIAGO QUEIROZ / Estadão

Síndica de um prédio na rua Cardoso de Almeida, Jacqueline Toledo também reclama que as obras da futura Estação Sesc-Pompeia trazem diariamente barulho e poeira para dentro de seu apartamento. Ela conta ainda ser impossível dormir sem fechar todas as janelas, uma vez que as luzes do local ficam acesas à noite. "Tem noite que não dá pra dormir de jeito nenhum", reclama Otaviano Zanfelice, de 55 anos, que é consultor imobiliário e subsíndico de outro edifício da região. 

Otaviano Zanfelice, de 55 anos, relata ter o sono prejudicado em muitas noites sem conseguir dormir Foto: FOTO TIAGO QUEIROZ / Estadão

Concessionária diz cumprir lei e tomar medidas para minimizar impactos

A Linha Universidade, concessionária responsável pelas obras por meio de parceria público-privada (PPP), informou cumprir a regulamentação referente aos níveis de emissão sonora em obras civis. Disse ainda que as empresas envolvidas informam antecipadamente a possível ocorrência de ruídos no entorno, além de adotar medidas mitigadoras como a manutenção periódica dos equipamentos, atenuação do sinal sonoro dos caminhões e guindastes e instalação de barreira acústica. Segundo a empresa, também há treinamentos com os colaboradores sobre o comportamento adequado nas atividades noturnas. Sobre o turno da madrugada, não deu previsão de término, mas disse que o trabalho neste horário é essencial para as obras da linha, que transportará mais de 630 mil pessoas por dia. 

Já a Secretaria de Transportes Metropolitanos disse que, conforme o contrato, a concessionária deve seguir a lei e as boas práticas referentes a barulho em obras civis na cidade e, entre outras ações, “informar antecipadamente aos moradores do entorno sobre a possibilidade de ruído próximo canteiros e adotar medidas mitigadoras” nas atividades à noite. 

Expansão da Linha 2 Verde também motiva queixas da vizinhança

Na zona leste, moradores no entorno das obras do parque linear do Complexo Rapadura reclamam das obras de expansão da Linha 2-Verde, que ganhará 8,4 quilômetros. O barulho e o tráfego intenso de caminhões são algumas das queixas. 

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“Era um parque de uso público, mas tudo isso foi retirado dos moradores, que agora andam nas ruas, ao lado dos caminhões, que correm em toda a velocidade”, diz a professora Marta Cavalcanti, de 52 anos, nascida e criada na região. Moradores falam ainda em falta de diálogo com a Companhia do Metropolitano de São Paulo. “O serviço de atendimento aos moradores é sem assertividade”, continua ela, que também vê risco de poluir o córrego no local.

“Tínhamos um verde incomparável aqui na região. Agora, olhar e ver a obra do jeito que está sendo tocada é de uma tristeza sem tamanho”, conta a aposentada dona Cleusa Spínola, que viveu 60 dos seus 67 anos na região. 

Procurado, o Metrô disse que, além de ter central exclusiva na Vila Formosa para atender quem mora perto da obra, já fez várias reuniões com os moradores e informa com antecedência atividades que podem afetar o entorno – obras são prioritariamente entre 7h e 22h, com exceções avisadas antecipadamente, e o tráfego de caminhões é autorizado pela Companhia de Engenharia de Tráfego.  Ainda segundo o Metrô, as atividades no canteiro da Rapadura são licenciadas e fiscalizadas por órgãos ambientais, tem contenção e tratamento de efluentes, sem despejo de resíduos no córrego ou via pública. O Estadão não conseguiu contato com o Consórcio Metrô Linha 2 (CML2). /COLABOROU JOÃO KER

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