Boias e canal de navegação: o plano para conter a mancha verde no Rio Tietê no interior de SP

Problema afeta o turismo, prejudica a pesca e representa risco à fauna aquática e à saúde humana

PUBLICIDADE

Foto do author José Maria Tomazela
Atualização:

O governo de São Paulo vai instalar uma barreira com boias para conter os aguapés que ameaçam fechar o Rio Tietê, na região de Barra Bonita, a 300 quilômetros de São Paulo. O problema afeta o turismo, prejudica a pesca e representa risco à fauna aquática e à saúde. No início do mês, barcos de turismo encalharam nos tapetes de plantas. Em Anhembi, no Médio Tietê, pescadores já usam foices para cortar os aguapés e passar com os barcos.

A barreira flutuante, com cerca de dois quilômetros, será instalada à montante da barragem da Usina Hidrelétrica de Barra Bonita, próximo à eclusa. As boias serão ancoradas para evitar o deslocamento da barreira. Após a instalação, será mantida uma equipe embarcada no canal para retirar o aguapé que eventualmente passar pela contenção.

Com a concentração de plantas aquáticas na eclusa da hidrelétrica de Barra Bonita, os barcos não passam Foto: Divulgação/GT Macrófitas

PUBLICIDADE

A barreira com boias faz parte de uma série de medidas anunciadas pela Secretaria do Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil) para combater a eutrofização – poluição por excesso de nutrientes que fazem proliferar algas e plantas aquáticas - do Tietê.

De acordo com Cristiano Kenji Iwai, subsecretário de Recursos Hídricos e Saneamento Básico da Semil, as boias devem ser instaladas em 120 dias, prazo que pode ser antecipado.

Publicidade

Até a instalação das barreiras, será feito o manejo das plantas aquáticas que ocupam área equivalente a 20 campos de futebol. Segundo o subsecretário, no último fim de semana foram realizadas ações para desobstrur a via de navegação, com o apoio do Departamento Hidroviário.

Aguapés têm sido um problema recorrente na eclusa de Barra Bonita, a cerca de 300 km de São Paulo Foto: Rosi Pereira/NM Homero Krähenbühl/Divulgação.

Também está sendo criado um grupo de fiscalização integrada que passará a atuar nas bacias hidrográficas do Tietê, identificando os lançamentos de poluentes e as fontes poluidoras. O grupo terá representantes de secretarias estaduais, da Companhia Ambiental do Estado (Cetesb), da Polícia Ambiental e das prefeituras cortadas pelo rio. Uma ação inicial identificou seis pontos críticos para a eutrofização na região de Barra Bonita.

A Cetesb fará ainda a instalação de sonda de monitoramento da qualidade da água à jusante da barragem. Será uma das seis novas estações anunciadas para ampliar o monitoramento da qualidade da água do Tietê, resultado de investimento de R$ 8,6 milhões, segundo o governo. Outra estação será instalada no reservatório de Promissão, também afetado pelos aguapés.

A proliferação de algas e macrófitas como os aguapés é agravada pelo aumento das temperaturas médias registradas em São Paulo desde o ano passado. No carnaval, duas embarcações turísticas – uma lancha e uma house boat – ficaram encalhadas no meio dos aguapés. No dia 4, a navegação foi totalmente interrompida por conta da quantidade de aguapés.

Publicidade

O plano de controle foi apresentado pela secretaria durante o Fórum de Integração das Ações de Recuperação do Rio Tietê nessa terça-feira, 25, em São Paulo.

Segundo a pasta, as principais fontes poluidoras podem ser derramamento de esgoto irregular, resíduos industriais ou agrícolas. O plano prevê articulação com produtores rurais e entidades do agronegócio para melhorar as práticas agrícolas e minimizar o escoamento de fertilizantes e resíduos de lavouras para os rios.

Alerta ambiental e risco à saúde humana

Um grupo de pesquisadores liderado pelo biólogo Marcelo Oliveira, de Araçatuba, divulgou em redes sociais um “alerta ambiental no Rio Tietê”, chamando a atenção para o risco das algas no rio. “Realizamos análises em amostras e identificamos a presença massiva da cianobactéria Microcystis aeruginosa nas águas esverdeadas. Essa espécie é altamente tóxica e representa sério risco ambiental e à saúde humana”, diz o texto.

No dia 4, a Cetesb interditou a praia de Sabino, a 469 km de São Paulo, após constatar que a concentração de algas tornava a água do Tietê imprópria para banho. Segundo a companhia, foram encontradas concentrações elevadas de microcistinas produzidas por cianobactérias e a presença de nata verde na água. Foi recomendado evitar contato com o rio, não apenas por pessoas, mas também por animais domésticos, de pecuária e silvestres.

Publicidade

PUBLICIDADE

Operadores de turismo de Barra Bonita que avaliam que a proposta do governo não prevê intervenções no curto prazo, a não ser soltar os aguapés pela eclusa de Barra Bonita. Para eles, o recomendado seria a retirada mecânica dos aguapés que se concentram em extensas áreas à montante da barragem, na região de Anhembi.

Lembram também que algas e aguapés já ocupam áreas em uma extensão de mais de 300 quilômetros do Tietê, de Conchas a Araçatuba, atingindo também as eclusas de Bariri e Ibitinga.

Para o vereador Daniel Zacharias Zago (MDB), da Câmara de Anhembi, o grupo de fiscalização sobre a questão os efluentes é fundamental, mas não resolve o problema imediato. “Mesmo que tenha emissão zero de poluentes hoje, há um passivo ambiental de 50 anos e o problema com plantas aquáticas vai continuar por décadas. Faltou um plano de manejo para elas. O escoamento das plantas será enxugar gelo”, afirma.

Zago diz que a pior situação é de quem depende da pesca para sobreviver. “Estão usando foices e facões para abrir caminho entre as ilhas de plantas para mover os barcos e terem acesso à água do rio.” Ele avalia que a situação vai piorar e pode afetar a Festa do Divino de Anhembi, evento centenário, em junho. “Não temos mais chuvas, o rio deve fechar por completo nas próximas semanas.”

Publicidade

Menos esgoto

Kenji Iwai, da Semil, diz que a eutrofização é um problema de décadas e vem se intensificando nos últimos anos devido à crise climática e estiagens prolongadas. Ele cita ações do governo para melhorar as condições do rio, como o Integra Tietê, lançado em 2023, que retirou 2,6 milhões de metros cúbicos de sedimentos de rios, entre eles o próprio Tietê e o Pinheiros.

Com a proposta da Sabesp de universalizar o saneamento até 2029, mais 2 milhões de imóveis estão sendo ligados à coleta de esgotos. “Em 2024 já vimos melhoria na qualidade dos afluentes do Tietê, o que indica que as ligações que estão diminuindo a quantidade de esgotos que chega ao rio”, diz.

Sobre a retirada mecânica das plantas aquáticas do rio, o gestor diz que a questão está sendo avaliada. “Já fizemos mapeamento das regiões com mais acúmulo de plantas. Do ponto de vista mais imediato, foi feita uma ação com a concessionária da hidrelétrica para desobstruir o canal de navegação no último fim de semana. Os barcos estão passando.”

A Auren Energia, que opera a hidrelétrica de Barra Bonita, informa que mantém diálogo constante com o governo estadual e, desde o fim de semana, implementa um conjunto de medidas para viabilizar a manutenção da navegabilidade na eclusa da Usina Hidrelétrica de Barra Bonita, considerando o pedido de apoio da secretaria.

Publicidade

Entre as ações, a empresa intensificou o escoamento gradativo e controlado da água por meio das comportas da usina. A iniciativa objetiva permitir a passagem das plantas aquáticas e manter navegabilidade na eclusa, prática já adotada pela companhia para garantir o controle das macrófitas.

A empresa ressalta que a proliferação da espécie segue ciclos de oscilação de densidades ao longo do ano e não está ligada à geração de energia da UHE Barra Bonita, que opera normalmente. A Auren participa de fóruns com representantes do governo, pescadores e usuários da navegação profissional e organizações da sociedade civil para discutir soluções em conjunto.