Na época em que Elis Regina fazia sua primeira apresentação em São Paulo, em uma boate na Praça Roosevelt, nos anos 1960, Rita Lee caminhava pelo Viaduto do Chá para chegar ao consultório do pai, o dentista Charles Jones. Enquanto isso, Gilberto Gil tocava sábado à noite na Galeria Metrópole. Anos depois, o bairro da Pompeia, onde Rita formou Os Mutantes, também foi onde os Titãs fizeram o primeiro show nos anos 80.
Palco da música brasileira, São Paulo é também casa de muitos artistas. Já imaginou conhecer os lugares que fizeram (ou fazem) parte da vida de seus cantores favoritos? Ver as paisagens que os inspiraram?
Para mostrar isso, o Estadão traz a série “São Paulo pelos olhos de...”. Essas reportagens especiais montam, em vídeos, um roteiro de endereços para quem deseja passear pela capital sob a perspectiva dos artistas que passaram ou ainda vivem nela.
Do samba ao emo, do rock ao hip-hop, percorremos ruas, casas, galerias, bares e outros locais por onde passaram grandes ícones como Paula Lima, Elis Regina, Rita Lee, Gilberto Gil, Di Ferrero e Titãs. Confira abaixo:
O universo musical de Paula Lima
Paula Lima nasceu cantando. No berço, seu despertar não era o choro, mas o canto. Nascida e criada na Vila Mariana, zona sul, a artista cresceu ouvindo pelos cantos de casa grandes artistas como Ella Fitzgerald e Ray Charles. Seu primeiro instrumento? O piano.
Depois disso, a carreira só cresceu. Paula se tornou referência em soul e focou em enaltecer a música negra, cantando jazz, samba-rock, funk e disco. “A gente não escolhe esses estilos. Eles nos escolhem.”
Com mais de 20 anos de carreira, a artista carrega na bagagem sucessos que viraram trilha sonora de novelas e parcerias com ícones, como Rita Lee, Jorge Ben Jor e Seu Jorge. “Sempre tive isso, só que agora é mais consciente: fazer aquilo que acredito e que me faz bem. Esse tipo de música, música negra de maneira geral, conversa comigo. Tudo isso faz parte da minha vida musical”, explica.

Recentemente, a cantora protagonizou projetos como o ‘Soul Lee’, apresentação em que revisita as músicas de Rita Lee dando seu toque especial de soul. A última canção lançada, Deguste, retoma a era do disco dos anos 80.
Pelas ruas da cidade, o roteiro revela lugares que valorizam a música autoral, em um passeio que vai do clássico ao samba:
- Parque Ibirapuera: Av. Pedro Álvares Cabral - Vila Mariana
- Memorial da América Latina: Av. Mário de Andrade, 664 - Barra Funda
- Casa Bona: R. Dr. Paulo Vieira, 101 - Sumaré
- Quintal dos Prettos: R. José Pinheiro Bezerra, 100 - Belenzinho no primeiro domingo do mês
A trajetória de Gilberto Gil pelas ruas da capital paulista
Saindo de casa, próximo à Praça da República, Gilberto Gil caminhava até a Galeria Metrópole, onde, nos anos 60, se apresentava aos sábados no Bar Bossinha. Foi nesse mesmo período, em um lugar hoje escondido em Santa Cecília, que o cantor gravou junto de outros artistas o marcante disco Tropicália. Referências de rock, samba e MPB se espalham pela capital paulista, e é essa São Paulo musical que exploramos neste episódio, através da trajetória de Gilberto Gil e das memórias compartilhadas por sua filha, Bela Gil.
“Para São Paulo, as músicas do meu pai buscam trazer um pouco de leveza e poesia para uma cidade que pode ser muito maçante”, reflete Bela. “É quase como uma forma de oração.”

Em seu restaurante Camélia Òdòdó, na Vila Madalena, a apresentadora e chef de cozinha relembra momentos especiais ao lado do pai na metrópole, como as visitas ao Butantã e as hospedagens no icônico Maksoud Plaza. “A gente tocava o terror naquele hotel”, brinca. “Era uma experiência maravilhosa. Nós faltávamos na aula e depois ficávamos no hotel, pedindo comida.”
Neste episódio da série, exploramos a São Paulo pelos olhos de Gilberto Gil. Da repressão vivida durante a ditadura militar aos momentos de afeto em família, traçamos um roteiro por lugares que marcaram a trajetória do cantor. Cada parada revela um pouco da história do artista e da cidade que ajudou a moldar um dos movimentos mais revolucionários da música brasileira, o tropicalismo.
- Galeria Metrópole: Av. São Luís, 187 - República
- Disco Tropicália: Rua Veridiana, 178 - Santa Cecília
- Maksoud Plaza: Rua São Carlos do Pinhal, 424 - Bela Vista
- Disco Gilberto Gil 1968: Edifício Gazeta, Avenida Paulista, 900
- Programa Divino Maravilho, da antiga TV Tupi: Av. Prof Afonso Bovero 52
- Gilberto Gil ao vivo no Teatro da PUC (Tuca): Monte Alegre, 1024 - Perdizes
- Show secreto na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo: Av. Prof. Luciano Gualberto, 380 - Butantã
- Camélia Òdòdó: R. Girassol, 451b - Vila Madalena
A São Paulo do Hip-hop por Drik Barbosa
Foi por meio das batalhas de rimas que aconteciam na saída da estação de metrô Santa Cruz que Drik Barbosa se apaixonou pelo rap. Paulistana, a cantora escreve desde os 14 anos e trouxe em suas músicas a realidade de viver a capital paulista. “As músicas que mais fluíram foram em transporte público”, conta, “Foram em momentos em eu estava observando as pessoas viverem, me observando viver”.
Se conectar com as pessoas e a realidade de São Paulo é uma das características do hip-hop para Drik. A rapper, que já cantou com artistas como Emicida e Karol Conká, lançou sua carreira em 2018 com o EP ‘Espelho’. Porém, anos antes, em 2016, já cantava no grupo ‘Rimas e Melodias’, coletivo que reúne cantoras da cena, como Tássia Reis.
‘O rap tem muito esse poder de nos aproximar da realidade, de aproximar a gente das questões que precisam ser vistas e ouvidas, sabe?‘, diz a cantora. ‘Ficamos mais curiosos para entender onde estão essas pessoas, o que fazem, onde posso encontrar e me conectar mais com as pessoas em São Paulo’

Na terra onde surgiram os Racionais MCs, Drik mostra ao Estadão pontos importantes, como os encontros no metrô São Bento, um dos lugares onde o rap começou no Brasil, até as batalhas de rimas nos anos 2000.
- Batalha do Santa Cruz: Quinzenalmente aos sábados, às 20h, na Rua Domingos de Morais, 2564 - Vila Mariana
- Metrô São Bento, berço do hip-hop: Largo São Bento - Centro Histórico de São Paulo
- Centro Cultural São Paulo: Rua Vergueiro, 1000 - Liberdade
- Casa do Hip-Hop: R. Vinte e Quatro de Maio, 38 - Jardim Canhema, Diadema
Caminhos do rock nos anos 80 com os Titãs
Uma banda nacional formada por nove paulistanos: foi assim que os Titãs começaram sua trajetória em 1982. Eles se conheceram no Colégio Equipe, em Higienópolis, região central de São Paulo, numa época em que bandas de rock surgiam a todo momento na cidade.
Ao Estadão, Tony Bellotto, Branco Mello e Sérgio Britto falaram sobre a conexão da cidade com a banda, que tem mais de 40 anos de estrada e hoje também conta com os músicos Mario Fabre e Beto Lee. “Tem isso do espírito da coisa, da urgência urbana, do barulho da cidade. Isso está na nossa música”, reflete Britto.
Branco Mello relembra uma das primeiras matérias sobre a banda, publicada no Jornal da Tarde em 1983. Com fotos de Antonio Lúcio, a reportagem trazia o título ‘Titãs: música para dançar com raízes paulistas’. Na época, a banda era descrita como uma “juventude urbanal transfunkcionada”.
Segundo Bellotto, eles eram reconhecidos nacionalmente como uma banda paulistana. “As pessoas têm essa expectativa, com uma atitude meio de São Paulo, progressista, diferente, com referências misturadas”, diz.

Do primeiro show no Sesc Pompeia aos encontros no Clube Madame Satã, o Estadão preparou um roteiro especial para quem quer mergulhar na São Paulo roqueira dos anos 80 e reviver a história da banda.
- Biblioteca Mário de Andrade: Rua da Consolação, 94 - República
- Sesc Pompeia: Rua Clélia, 93 - Água Branca
- Praça Benedito Calixto - Pinheiros
- Madame Underground Club: Rua Conselheiro Ramalho, 873 - Bela Vista
Uma São Paulo hardcore por Di Ferrero
Franja, roupas pretas e muito sons de guitarra. Esse era um retrato comum da juventude em São Paulo no início dos anos 2000, época da ascensão do emo. A todo momento novas bandas surgiam. Uma delas é o NX Zero, banda formada por Di Ferrero, Gee Rocha, Daniel Weksler, Caco Grandino e Filipe Ricardo.
“Era um turbilhão de coisas rolando no rock em São Paulo”, conta Di Ferrero. Depois de mais de 10 anos na banda, Di iniciou a carreira solo em 2017 e lançou seu primeiro álbum solo Uma bad uma farra em 2022. De Campo Grande, o cantor mora desde os 14 anos em São Paulo e pôde testemunhar o crescimento das bandas hardcore na capital, entre encontros na Galeria do Rock, gravações no estúdio NiMBUS e shows no Hangar 110.
Mas ele não apenas vive a cidade, Di se inspira nela - principalmente à noite. “As músicas que fiz em São Paulo também são as mais obscuras, de certa forma”, diz. E acrescenta: “as músicas mais rock’n’roll do NX e minhas são daqui”.
Confira a São Paulo hardcore de Di Ferrero:
- Blue Note: Av. Paulista, 2073 - Bela Vista
- Galeria do Rock: Av. São João, 439 - República
- NiMBUS BAR & STUDiOS: R. Duílio, 35 - Lapa
- Hangar 110: R. Rodolfo Miranda, 110 - Bom Retiro

São Paulo pelos olhos de Elis Regina
Natural de Porto Alegre, a cantora Elis Regina morou por mais de dez anos em São Paulo. Foi nos anos 1960, antes de ir para o Rio de Janeiro, que ela fez suas primeiras apresentações na cidade, na boate Djalma’s, onde hoje fica o Bar Papo, Pinga e Petisco. À época, Elis tinha 19 anos e passou uma temporada cantando no local.
“Ela encontrou em São Paulo um lugar que a acolheu profissionalmente”, diz João Marcello Bôscoli, produtor e filho mais velho de Elis. Responsável pela preservação da memória da mãe, ele conta que, apesar da vida pública, Elis gostava das atividades domésticas, como fazer compras no Mercado Municipal.

“Havia um misto de ser tratada como igual, que era como ela se sentia, mas em certo momento descobriam que era a Elis Regina, a figura pública”, relembra. “Eu me lembro de uma vez ela ir para trás do balcão e começar a ajudar a pessoa a vender.”
A “pimentinha” vivia a metrópole em sua intensidade, tanto que seu espetáculo Transversal do Tempo, de 1978, trazia toda a atmosfera caótica da cidade grande. A inspiração veio quando ficou presa em um engarrafamento durante um protesto e decidiu contar sobre a solidão na rotina paulistana. Ela morou na capital até a morte, em 1982.
Gravações no Teatro Renault, compras no Mercado Municipal, passeios com Adoniran Barbosa no Bixiga: o Estadão mostra um roteiro para conhecer São Paulo pela ótica da artista:
- Teatro Renault: Av. Brigadeiro Luís Antônio, 411 - República, São Paulo
- Bar Papo, Pinga e Petisco: Praça Franklin D. Roosevelt 118
- Vila Itororó: Rua Maestro Cardim 60
- Mercadão: R. da Cantareira, 306 - Centro Histórico de São Paulo, São Paulo
- Placa da Elis: Doutor Melo Alves, 668, Jardins
- Praça Elis Regina no Butantã: R. Pereira do Lago, 100
São Paulo pelos olhos de Rita Lee
A roqueira Rita Lee Jones de Carvalho tornou-se um símbolo da cidade. Nascida e criada em São Paulo, foi na capital paulista que ela cresceu, brincando nas ruas da Vila Mariana, na zona sul, e indo a piqueniques com a família no Parque Ibirapuera.
Na Pompeia, zona oeste, Rita Lee conheceu os irmãos Arnaldo Baptista e Sérgio Dias e, em 1966, formaram a banda Os Mutantes, marco para o rock brasileiro. Foi também em Sampa, como chamava a cidade, que viveu os tempos sombrios da ditadura militar, como sua prisão em 1976.

Em Rita Lee: uma autobiografia, lançada em 2016 pela Globo Livros, a rainha do rock narrou essas memórias de vários cantos. ‘Conhecia Sampa de ponta a ponta, do Museu do Ipiranga à Galeria Metrópole, da Augusta a Interlagos, do Bixiga à Praça da Sé‘, escreveu a cantora. No primeiro roteiro da série, mostramos os lugares da infância, da juventude e da vida de muito rock de Rita Lee, que morreu em 8 de maio de 2023.
O Ibirapuera, um de seus tantos pontos preferidos, foi onde ocorreu seu velório. Para homenagear a cantora, a Prefeitura sancionou o projeto de Lei que deu o nome dela à Praça da Paz, que fica no parque.
Conheça lugares marcantes da cantora por meio desse roteiro:
- O Casarão: Rua Joaquim Távora, 670, Vila Mariana
- Casa dos Mutantes: Rua Venâncio Aires, 408, na Pompeia
- Viaduto do Chá, no centro
- Consultório do pai: Rua Xavier de Toledo, 98, República
- Encontros com Caetano Veloso e Gilberto Gil: Avenida São Luís
- Piqueniques com a família: Parque Ibirapuera