Orgulhosa de não ter prédios, semáforos ou shoppings, a cidade de Analândia, a 200 quilômetros da capital paulista e com cerca de 5 mil habitantes segundo o IBGE, promete tranquilidade em meio à beleza natural da Serra do Itaqueri para atrair turistas de todo o Estado. Promete e entrega: com cerca de 700 nascentes de rios registradas, o município é diretamente beneficiado pelo Aquífero Guarani e aproveita a pureza das águas para promover suas cachoeiras, sítios arqueológicos e turismo de aventura o ano todo.
Foi em 1966 que o governo de São Paulo elevou Analândia ao nível de estância turística e climática, título atribuído pelas belezas naturais da cidade e sua vocação para os turismos rural, ecológico e de aventura. Apesar disso, o trabalho ativo para atrair visitantes de fora e impulsionar a capacidade do município para o lazer tem sido feito a passos mais lentos.
“Não temos como preservar tantas belezas naturais como as daqui sem a ajuda do turismo”, sinaliza Ana Letícia Tristão Duz, de 43 anos. Em 2020, ela assumiu a Secretaria de Turismo e Cultura, retomando alguns eventos tradicionais do calendário analandense, como a Festa do Carneiro, uma espécie de festival em que os bares da cidade servem pratos desenvolvidos a partir da carne do animal.
O trabalho é visível por quem anda na cidade, onde é possível ver em quase todas as esquinas alguma obra ou placa de sinalização indicando o caminho para as principais atrações de Analândia. “Estamos recuperando e revitalizando quase todos os pontos turísticos que não ficam em propriedades particulares. Queremos o desenvolvimento do turismo, mas sustentável. Nosso foco é a natureza”, diz Ana Letícia.
Uma preocupação comum entre moradores, turistas e poder público é a qualidade da água que sai das mais de 700 nascentes e abastece as mais de 40 cachoeiras do município. Tanto que foi fundado em 2017 o Projeto Nascentes de Analândia, tocado por representantes da Prefeitura, do Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí e da organização SOS Mata Atlântica.
“Esse projeto de recuperação começou avaliando todas as propriedades rurais do município com um diagnóstico ambiental das áreas degradadas, seja em volta de uma nascente ou à beira de um córrego, apontando quais precisariam de adequação”, explica Leandro Santarpio, coordenador do Projeto Nascentes de Analândia desde 2018.
Nos últimos cinco anos, o esforço coletivo conseguiu fazer o cercamento e reflorestamento das áreas vulneráveis da microbacia do Córrego Cavalheiro, um dos principais afluentes do Rio Corumbataí. Agora, o projeto avança para a implementação de saneamento rural e instalação de fossas biodigestoras na região, antes de repetir o processo em outras microbacias da cidade.
Abaixo, confira os principais pontos turísticos de Analândia, com opções de cachoeiras, sítios arqueológicos, bares, restaurantes, acampamentos e esportes radicais.
Morro do Cuscuzeiro
A primeira coisa que aparece quando você busca “Analândia” na internet é o Morro do Cuscuzeiro, que recebeu esse nome graças à semelhança que seu topo, a 1.098 metros de altitude, tem com um cuscuz. Um dos principais destinos para fãs de escalada em todo o Estado, ele fica na Fazenda Pedra Viva, que começou a aproveitar seu potencial turístico apenas em 2001, por demanda popular.
“Quem induziu isso foi o próprio público. Começamos a ter problemas com o público, que vinha e fazia acampamento clandestino, cortava a cerca para visitar o morro e às vezes causava até incêndios acidentais”, diz Odair Calchi, proprietário da Pedra Viva, de 70 anos, todos eles vividos em Analândia.
Depois de enfrentar problemas com os invasores, Odair construiu piscina, restaurante, lanchonete, piscina, balanços, plantou 10 mil árvores e ergueu toda a infraestrutura necessária para oferecer acampamento e esportes de aventura, como arvorismo, tirolesa, escalada e arco e flecha, na propriedade. Assim, conseguiu diversificar o público, antes formado majoritariamente por escaladores, para receber famílias, crianças, casais e os tradicionais aventureiros.
“Vem gente dos 2 aos 90 anos”, comemora. A propriedade, que está com a família de Odair desde a década de 1950, hoje já conta também com a ajuda de sua filha, Tássia Calchi, de 26 anos. O espaço abre aos sábados, domingos e feriados e tem atividades suficientes para passar um dia inteiro, mesmo para quem não tem toda a adrenalina de subir os 40 minutos de trilha até o topo do Cuscuzeiro.
Cachoeira do Salto Major Levy
Uma das principais atrações de Analândia fica no centro da cidade e funciona todos os dias da semana, de segunda a segunda. A Cachoeira do Salto Major Levy é aberta ao público, de acesso gratuito e fácil, feito através de uma escadaria com estacionamento no topo.
Alimentada pela nascente do Rio Corumbataí, responsável também por abastecer Piracicaba e outras cidades da região e um pouco mais acima do seu ponto de entrada, a queda d’água é limpa, rasa e tem pressão suficiente para refrescar nos dias de calor sem grandes sustos, o que a torna uma ótima opção para crianças.
Há 10 anos, a Cachoeira do Salto ganhou um bar e restaurante que também funciona de segunda a segunda e é administrado pelo empresário Vitor Ferreira da Silva através de concessão pública. Aos 41 anos, ele passou a maior parte da vida em Analândia, desde que sua mãe decidiu abandonar a capital por causa do aumento da violência. Acompanhado do pai, Pedro Minhoco, hoje com 70 anos, ele diz que tem “vocação” para o turismo e ajudou a idealizar muitas das atrações turísticas da cidade através da agência Bicho do Mato, hoje extinta.
No dia em que o Estadão esteve no local, casais, famílias e grupos de amigos passaram pela cachoeira, alguns apenas para se refrescar, outros para aproveitar a calma do lugar em um dia de semana atipicamente quente e mais vazio que de costume. “A gente está de férias e já conhecia o lugar, então sabíamos que hoje estaria mais tranquilo”, conta Bruno Kleiner, que saiu de Rio Claro, a 50 quilômetros dali, acompanhado dos amigos Vitor Ferri e Iago Ferreira.
“Aqui é um lugar de tranquilidade. Não temos TV nem caixa de som para não atrapalhar o sossego dos clientes e o barulho da natureza”, diz Vitor. O bar e restaurante que ele administra tem como carro-chefe a porção de tilápia empanada e sem espinhos, servida à beira da cachoeira.
Cachoeira do Escorrega
Aberta de quarta a domingo e aos feriados, a Cachoeira do Escorrega faz jus ao nome e é formada principalmente por uma corredeira de pedras planas, onde a queda d’água é mais fraca, mas constante, e forma um poço de água que não chega a canela. A atividade principal ali é realmente escorregar sentado, mas é preciso ter atenção para não fazer a descida antes da hora, uma vez que o lodo que cobre a área torna difícil a função de ficar simplesmente parado em pé ao longo do trecho.
Como fica em uma propriedade privada, o acesso à cachoeira custa R$ 10, valor que dá direito também ao banheiro. As outras atividades e o restaurante do local, que funciona só a partir da quinta-feira, são pagos por fora. O espaço conta com mesas internas e externas, uma espécie de lounge com poltronas e uma vista privilegiada para o Morro do Cuscuzeiro e o do Camelo, vizinho.
Cachoeira do Rangel
Um pouco afastada das ruas comerciais, mas ainda no Centro de Analândia, a Cachoeira do Rangel tem a água 100% limpa, uma vez que a nascente fica logo acima do poço principal. Também de água rasa, ela tem um “esconderijo” entre as pedras onde é possível sentar embaixo da queda d’água. O acesso é feito por uma descida de terra cuja entrada fica no meio da Avenida Um, mas tão discreta que se você não prestar atenção acaba perdendo o ponto. Por ser menor e menos conhecida, costuma ficar mais vazia nos dias de calor e também não conta com bar, restaurante nem banheiros.
Gruta do Índio
Nem só de cachoeiras e rios vive Analândia. Uma das atrações mais diferentes e únicas da cidade, a Gruta do Índio é um importante sítio arqueológico do Estado de São Paulo que guarda pinturas rupestres de pelo menos 5 mil anos atrás. A importância histórica do local foi descoberta há menos de dez anos por pesquisadores da Unesp de Rio Claro e desde então tem servido para atrair turistas, curiosos e outros estudiosos da pré-história.
A gruta é formada por dois salões onde é possível ver oito símbolos rupestres, uns mais definidos que outros, como os de animais quadrúpedes ou um segundo que seria de um homem segurando uma ave. Como a descoberta é relativamente recente, ainda não foi possível afirmar para que os povos paulistas de cinco mil anos atrás usavam o local, mas as teorias mais prováveis dão conta de que ele seria alguma espécie de templo religioso ou refúgio para tempestades.
O acesso à Gruta do Índio só é possível com algum guia local, uma vez que ela fica em uma propriedade privada, no meio de um morro com 150 metros de desnível por dentro da mata fechada, sem trilhas, placas ou sinalização. O Estadão fez o percurso acompanhado de Calebe Vivaldini Albieri, analandense de 26 anos que desde a infância desbrava a área rural da cidade com o pai, que é mateiro.
“Eu me atraí (pela profissão) por causa do meu envolvimento com o meio natural desde criança. Meu pai é mateiro e sempre me levava, então sempre tive esse contato”, conta o rapaz, que está terminando o curso de Turismo na UFSCar com um trabalho de análise sobre a capacidade de carga da Gruta do Índio. “A valorização pela cidade me fez querer trabalhar com isso para garantir a nossa sustentabilidade. (A gruta) é de extrema importância não só para a cidade, mas para o Estado e para o País.”
Para fazer a trilha, além de um guia é recomendável também ir com tênis confortável para caminhada, chapéu ou boné, garrafa de água e calça jeans ou outra comprida - se possível, acrescentar também uma perneira, tanto pelo mato alto como pela possibilidade de se deparar com cobras e outros animais ao longo do caminho. “Esse não é um ambiente controlado”, disse Calebe.
No interior de ambos os salões da gruta, é possível o desnível sedimentado na rocha ao longo de milênios, como pequenos degraus que vão formando poços e cantos nas paredes e no teto (onde ficam as pinturas). A vista do local para o horizonte da região é indescritivelmente bonita, abrangendo também o Morro do Cuscuzeiro e do Camelo, as partes mais intocadas de uma paisagem que é contemplada desde a pré-história.
Outras sugestões
Apesar de mais afastada da cidade, a Cachoeira da Bocaina e o Cânion Feijão ficam próximos à divisa com São Carlos, tem uma das maiores quedas d’água e vista privilegiada para os principais pontos de Analândia. O acesso é feito por uma fazenda privada e custa R$ 6.
Outros passeios de aventura da cidade são a Gruta Toca da Onça e a Gruta Nossa Senhora de Lourdes. Enquanto a primeira funciona mais como sítio arqueológico e ainda preserva algumas pinturas rupestres de milênios atrás, a segunda se tornou um ponto de maior enfoque religioso. O acesso a ambas, entretanto, também só é feito com a ajuda de um guia local.
Boêmios que quiserem passar a noite em Analândia encontram na Esquina da Cachaça opções com os melhores bares e restaurantes da cidade, ocasionalmente com alguma apresentação de música ao vivo.
Serviço
- Morro do Cuscuzeiro
Endereço: Estrada Orlando Tendolini, Analândia - SP, 13550-000
Mais informações: https://www.instagram.com/pedravivacuscuzeiro/
- Cachoeira do Salto Major Levy - Bar e Restaurante
Endereço: R. Quatro, s/n - Centro, Analândia - SP, 13550-000
Mais informações: https://www.instagram.com/cachoeiradosalto_analandiasp/
- Cachoeira do Escorrega
Endereço: Estrada Municipal ALD 030 Rural, Analândia - SP, 13550-000
Mais informações; https://www.instagram.com/restaurantecachoeiraescorrega/
- Cachoeira do Rangel
Endereço: Av. Um, 92 - Analandia, Analândia - SP, 13550-000
- Gruta do Índio
Endereço: Rua 3, Nº 891 - Centro, Analândia - SP, 13550-000
Contato Calebe Vivaldini Albieri, guia local: https://instagram.com/calebealbieriguia
- Cachoeira da Bocaina / Cânion Feijão
Endereço: Estrada da Serra – Analândia / São Carlos
- Gruta Nossa Senhora de Lourdes
Endereço: Estrada da Serra - Orlando Tendollini, KM 03
Contato Calebe Vivaldini Albieri, guia local: https://instagram.com/calebealbieriguia
- Esquina da Cachaça
Endereço: Esquina da Rua J com a Rua H, no bairro Portal das Samambaias
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