A cozinheira Zuleide Pereira Alves, de 38 anos, escapou da enxurrada de lama que destruiu a sua casa com uma bebê de 7 dias, o marido e outras duas crianças. Ela morava no bairro de Topolândia, no morro do Juramento, em São Sebastião.
Perto da meia noite de domingo, Zuleide ouviu um estrondo, que pensou ser um trovão. “Aí começou a descer tudo, a lama vinha trazendo pedaço de casa, geladeira, fogão, botijão de gás”, conta. Ela só conseguiu pegar a bolsa da bebê. As crianças salvaram uma blusa de frio cada. “Foi desesperador.”
A família se abrigou na casa de um vizinho, mais alta, segundo ela, e esperaram acordados a noite toda por socorro. Moradores da comunidade avisaram os vizinhos para também deixarem suas casas e, quando amanheceu, eles desceram o morro. “O medo era a gente estar descendo e a lama levar a gente, a lama estava na altura da cintura. Um poste de energia estava entortando, quase pegando na água.”
Nesta segunda-feira, 20, Zuleide e a bebê Rhillary Vitória, que nasceu dia 12 de fevereiro, estavam abrigadas em uma escola municipal de São Sebastião com outras cerca de 30 pessoas.
Segundo a secretária de Educação da cidade, Marta Braz, outras nove escolas estão servindo de abrigo e recebendo doações. A que recebeu mais desabrigados foi a da Barra do Sahy, por onde passaram cerca de 500 pessoas esta noite. A praia também registou o maior número de mortos. O número de óbitos pelas chuvas no litoral paulista chega a 36, além de 40 desaparecidos.
“Minha maior preocupação era ela”, diz Zuleide sobre a menina, sua sexta filha. “Não deu para salvar nada”. Ela disse que não voltou mais para sua casa, onde morou quase a vida toda. “Agora é segurar na mão de Deus e ver o que vem pela frente.”
A ajudante de cozinha Julia Amaral, de 26 anos, também tem uma bebê de pouco mais de 1 ano e está abrigada na escola por medo de voltar para a casa no mesmo morro. “Vim pegar fralda para minha filha porque tudo ficou na casa”, disse. A escola recebeu água, comida, fraldas de moradores e empresários da região.
Outros moradores da Topolândia também disseram que esperaram ajuda na noite de sábado e que não foram resgatados. Fabio da Silva Ferreira, de 26 anos, disse que foi a comunidade que deu o alerta para que as famílias deixassem as casa. “Não teve uma sirene, ninguém bateu na porta para avisar, acho que foi negligência”, afirmou. Ferreira também perdeu tudo no deslizamento e diz que desde 2016 as casas estavam ameaçadas. “Essa ajuda que estão dando agora é o mínimo que podem fazer.”
Segundo o prefeito de São Sebastião, Felipe Augusto (PSDB), a prefeitura “já tinha emitido todos os alertas com a Defesa Civil” quando as chuvas fortes começaram no sábado à noite. “O que não se esperava era a densidade dessas chuvas que ultrapassaram 600 milímetros em curto espaço de tempo”, afirmou em pronunciamento no Teatro Muncicipal, em que estavam presentes também o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o governador Tarcísio de Freitas. Segundo ele, a primeira equipe da prefeitura foi ao bairro da Topolândia às 5 horas da manhã de domingo. “E a partir de lá começamos a entender o tamanho da tragédia que tinha acometido o nosso município.”
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