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Cracolândia: lojistas no centro de SP usam grades e fecham portas com medo de novos saques

Estabelecimentos foram saqueados por grupos de dependentes químicos após ação do poder municipal na região da Santa Ifigênia: Prefeitura afirma que ações continuam

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Foto do author Gonçalo Junior
Foto do author Ítalo Lo Re
Atualização:

A poucos metros da esquina das Avenidas Ipiranga e São João, a mais famosa da cidade, na região central, funcionários do minimercado Extra instalaram uma grade de contenção na entrada principal. Isso só permite a entrada de um cliente por vez. Essa é a medida de segurança mais visível depois que o estabelecimento foi saqueado por grupos de dependentes químicos da Cracolândia, agora localizada na região da Santa Ifigênia, na sexta-feira, 7.

A unidade da Drogaria SP localizada na esquina da Avenida São João com a Rua Vitória, também alvo de um “arrastão”, abriu apenas parcialmente na manhã desta segunda-feira. Das três portas do estabelecimento, apenas uma estava aberta. Tanto na farmácia como no minimercado, os funcionários mantêm o silêncio como forma de precaução e evitam relatar quais produtos foram roubados.

Farmácia localizada na esquina da Avenida São João com Rua Vitória manteve duas portas fechadas após os saques. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

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Após os episódios do final de semana, cada estabelecimento busca sua própria solução de segurança com medo de novos saques. Os arrastões ocorreram depois de uma ação de zeladoria da Prefeitura de São Paulo para remover lixo e desmontar as tendas usadas para o tráfico de drogas de acordo com a polícia na área conhecida como “fluxo”, que reúne grande número de usuários e que atualmente se localiza entre as Ruas Conselheiro Nébias e dos Gusmões.

Imagens de câmeras de segurança mostram o momento do saque. Uma grande quantidade de pessoas entra de forma desorganizada, levando tudo o que consegue. Neste domingo, usuários de drogas invadiram uma lanchonete na altura do 450 da Avenida Rio Branco e tentaram furtar uma televisão, uma chapa de lanche e um computador. Policiais afirmaram que os objetos permaneciam no local.

Funcionários do minimercado que foi alvo de saques instalaram uma grade de contenção na entrada do estabelecimento para coibir novas invasões. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Até os estabelecimentos que escaparam do vandalismo também estão precavidos. No Bar e Lanches Pombalense, os funcionários são orientados a baixar as portas ao primeiro sinal de aglomeração, como conta o gerente Eduilson Dantas, que trabalha no local há seis anos. O toldo, normalmente usado para os dias de chuvas, é usado permanentemente para proteger os clientes que preferem as mesas nas calçadas. O local estava fechado no feriado.

Moradores evitam sair de casa

Moradores da região central afirmam que estão mudando seus hábitos pessoais e profissionais e evitam sair de casa nos horários da ação da Prefeitura no fluxo, por volta das 8h (manhã) e 15h (tarde). Eles contam que essa dinâmica costuma espalhar os usuários. Além disso, eles relatam a atuação dos assaltantes de bicicleta, a chamada “gangue das bikes”, durante a dispersão do fluxo. “Eu evito sair de casa nesses horários e, quando saio, coloco o celular dentro da meia e dentro do top”, conta uma moradora do Largo do Arouche que prefere não se identificar.

Iézio Silva, presidente da Associação de Moradores e Comerciantes de Campos Elíseos, chama a atenção para os receptadores. “Temos dezenas de depósitos de ferro-velho que compram qualquer coisa, inclusive de madrugada. Isso também precisa ser fiscalizado”, afirma.

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Na manhã desta segunda-feira, o Estadão chegou poucos minutos depois de uma viatura da PM a uma loja da Oxxo, no Largo do Arouche, que havia acabado de sofrer uma tentativa de assalto. Não foi um arrastão. De acordo com o gerente Madson Wilker, um casal tentou roubar quatro barras de chocolate ao leite Nestlé. Ele e o segurança conseguiram impedir o assalto. Madson ainda estava ofegante quando relatou o episódio que, segundo ele, é frequente na região central. “A gente sabe quando sai de casa, mas não sabe se vai voltar”, afirmou.

Motorista de uma kombi avisa policial sobre um furto no supermercado Oxxo, no Largo do Arouche  Foto: Tiago Queiroz / Estadão

Desde o ano passado, quando houve dispersão dos dependentes químicos após operação policial, a região tem visto uma escalada de violência e transtornos, com aumento de roubos e migração de bancas de venda do tráfico. As gestões de Tarcísio de Freitas (Republicanos), do governo estadual, e a de Ricardo Nunes (MDB), da Prefeitura, anunciaram novos planos para resolver o problema da Cracolândia.

Reforçar o policiamento no centro, reformular o centro de atendimento para usuários de álcool e drogas, mais leitos de internação e aluguel social a quem passou pelo tratamento em equipamentos municipais estão entre as estratégias anunciadas pelo Estado e pela Prefeitura em janeiro para a Cracolândia. Muitas das medidas já foram adotadas por gestões anteriores, mas não conseguiram solucionar o problema.

O que diz a Prefeitura

“A nova estratégia da Prefeitura Municipal de São Paulo permitiu uma redução de 75% do número de pessoas nas duas principais concentrações de dependentes químicos da Cracolândia durante o período da manhã (de 509 usuários de drogas para 132) e de 33% no período da tarde (de 546 usuários para 344. A medição é feita com fotos de drones). A média diária de internações voluntárias passou de 2 pessoas por dia no mês de março para 4,6 pessoas nos dias 3, 4 e 5 de abril.

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Desde a segunda-feira, foram intensificadas as ações de zeladoria (limpeza e desfazimento de tendas) na região central, nos espaços ocupados por dependentes químicos em situação de vulnerabilidade. As equipes de saúde e assistência social participam das ações oferecendo tratamento e acolhimento e a Guarda Civil Metropolitana (GCM) dá apoio às equipes.

A Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU) adotou uma série de medidas para a melhoria da segurança da região; entre elas, está a intensificação do patrulhamento comunitário e preventivo, com a ampliação do número de viaturas e motos em pontos estratégicos, sendo 90 agentes a mais nas ruas, além dos 80 Guardas e 20 viaturas da Inspetoria de Operações Especiais – IOPE que já atuam no território. No total, a região conta com mais de 500 agentes da GCM, que realizam o policiamento por meio de rondas periódicas, 24 horas por dia.”

O que diz a Polícia Civil

“Dois suspeitos de participação na invasão aos comércios na área central foram presos pelo 3ºDP. A Polícia Civil se reuniu com os comerciantes locais a fim de estabelecer estratégias de atuação para coibir os crimes na região. No 1º trimestre deste ano, 1.861 criminosos foram presos ou apreendidos no centro da capital, um aumento de 53% a mais em relação ao mesmo período de 2022.

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No mesmo período foi constatado que 34% dos presos por furtos e 57% por receptação são soltos em audiências de custódia e acabam retornando nos dias seguintes à região, dificultando o combate ao crime. O secretário de Segurança Pública já encaminhou proposta ao Tribunal de Justiça para que os policiais possam informar diretamente aos juízes sobre criminosos soltos que estejam descumprindo as condições legais e também, em conjunto com o SAP, disponibilizou aos juízes da Barra Funda a possibilidade de determinarem o uso de tornozeleiras para presos da região da Cracolândia que forem soltos em audiência de custódia.

Desde a última semana, a Polícia Militar realiza diariamente a “Operação Impacto Centro” para aumentar a atividade ostensiva e preventiva. O Comando de Policiamento (CPA/M-1) também atua por meio da “Operação Impacto - Choque de Ordem/Centro”, com o objetivo de garantir a preservação da ordem pública, ampliar a ação ostensiva, potencializar a segurança e reduzir os indicadores criminais, com mais de 17 mil policiais nas ruas.”

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