SÃO PAULO - Em depoimento, testemunhas no júri de Elize Matsunaga, acusada de matar e esquartejar o marido Marcos Kitano Matsunaga, trouxeram à tona uma vida de excentricidades e luxo do casal. De jiboia de estimação a viagens ao exterior só para comprar vinho, detalhes sobre o relacionamento dos dois, descrito como um casal discreto e generoso, chamam atenção.
Elize, que completou 35 anos no segundo dia do julgamento, nasceu na cidade de Chopinzinho, no interior do Paraná, e atravessou uma infância pobre. Já Marcos integrava uma das famílias mais ricas de São Paulo. Ele era diretor e herdeiro da Yoki, empresa que foi negociada por R$ 1,7 bilhão após o crime, que aconteceu em maio de 2012, segundo o delegado Mauro Gomes Dias, responsável por investigar o caso.
Eles se conheceram em 2004, por meio de um site de acompanhantes. Na época, Marcos era casado e Elize, garota de programa. Antes do empresário se divorciar da primeira mulher, os dois foram amantes. Marcos chegou a pagar para que ela retirasse as fotos expostas no catálogo da internet e para que prestasse serviço apenas a ele.
O passado de Elize era mantido em segredo. Parentes e amigos foram unânimes em afirmar que só souberam que a ré havia sido garota de programa pela imprensa. Reservados, os dois se casariam em uma cerimônia realizada pelo reverendo Renè Licht, em uma festa para poucas pessoas. Da união, nasceu uma menina, hoje com cinco anos.
O triplex do casal ficava na cobertura de um condomínio da Vila Leopoldina, na zona oeste da capital, com piscina dentro da casa e três pavimentos. Só no primeiro, havia seis varandas. Na sala de estar, o casal deixava troféus de caça à mostra e pendurava cabeças de animais que eles mesmo haviam abatido.
Segundo testemunhas, era costume viajar para uma fazenda de caça no Paraná. “Eles vinham com o bicho arrastando no jipe”, contou a babá Mauriceia dos Santos, que ganhava R$ 3 mil para cuidar do bebê. Eles também faziam aulas de tiro juntos. “Marcos mencionava que ela atirava melhor do que ele”, disse o único irmão da vítima, Mauro Kitano Matsunaga. Em algumas ocasiões, as presas viravam jantar, em que o casal convidava pessoas próximas.
Os vinhos eram outra fixação. Os dois chegaram a organizar leilões para revender unidades importadas e se ofereciam para custear passagens a quem pudesse trazer exemplares de fora do Brasil. “Bebiam uma garrafa por dia”, relatou Cecília Yone Nishioka, prima do empresário. “Cheguei a participar de um leilão com garrafa a US$ 100 mil”, disse Cecília. No apartamento, os dois mantinham uma adega, cujo valor estimado pela Polícia Civil é de R$ 2 milhões a R$ 3 milhões.
Cecília acompanhou os dois em uma viagem para conhecer vinícolas de Portugal. Segundo conta, as idas ao exterior eram comuns. “Uma vez, eles foram para Cancún, no México, porque Elize disse que não conhecia. Ele comprou várias bolsas Louis Vuitton para ela.”
Também a pedido de Elize, o casal chegou a criar uma jiboia no apartamento. Adulta, a cobra pode medir de 2 a 4 metros de comprimento. “Quando eu cheguei para trabalhar lá, eles já tinham se livrado da cobra. Graças a Deus, porque, senão, eu nem entrava”, disse Mauriceia. Os Matsunagas tinham, ainda, dois cachorros.
Arsenal. Ao realizar buscas, policiais civis ficaram impressionados com a quantidade de armas de fogo encontrada no apartamento, além uma coleção de armas brancas. Entre os objetos apreendidos, havia um fuzil AR-15 e uma pistola modelo Polizei Pistole Kriminal (PPK), arma usada por oficiais nazistas na década de 1940.
O arsenal era armazenado em um banheiro, transformado em bunker. O espaço era climatizado e isolado do resto do apartamento por uma porta blindada. O disparo que atingiu o lado esquerdo da cabeça de Marcos Matsunaga, no dia 19 de maio de 2012, partiu de uma pistola Imbel, calibre 380. A arma havia sido um presente de Marcos para Elize.
Julgamento. O júri de Elize teve início na segunda-feira passada no Fórum Criminal da Barra Funda. Tendo confessado o crime, o julgamento servirá para que a pena da ré seja definida. Para isso, o Ministério Público a acusava de homicídio, cometido por motivo torpe, meio cruel e sem possibilidade de defesa da vítima, além da destruição do cadáver. Já a defesa, sustentava que ela agiu por emoção e não cometeu o assassinato com crueldade, na expectativa de reduzir a pena, que podia chegar a mais de 30 anos.
Estava previsto para ocorrer neste sábado, 3, o interrogatório de Elize, além do debate entre as partes. Essas seriam as últimas fases do julgamento antes do votos dos jurados sobre o caso e a sentença.
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