‘Gangue do Rolex’: como agem quadrilhas especializadas em roubar relógios de luxo em SP

Grupos atuam preferencialmente em bairros de alto padrão, como Pinheiros e Jardim Paulistano. Eles monitoram possíveis vítimas nas entradas de shoppings e restaurantes. Desde 2021, houve 400 indiciados por suspeita de elo com crime

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Foto do author José Maria Tomazela
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Uso de olheiros, monitoramento nas redes sociais e abordagens nas portas de shoppings e restaurantes. Essas são algumas das estratégias adotadas por quadrilhas especializadas em roubar relógios de luxo, cujo valor pode superar R$ 1 milhão. Investigações mostram que bandidos como os da Gangue do Rolex atuam em redes interligadas em mais de um Estado, com o objetivo de facilitar o repasse de itens roubados, e entraram na mira da polícia, que tem falado em intensificação das patrulhas.

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Desde janeiro de 2021, ao menos 400 pessoas foram indiciadas por suspeita de participar de quadrilhas especializadas no roubo de relógios de luxo no Estado de São Paulo. Destas, 160 foram presas em flagrante e 190 foram alvo de pedidos de prisão provisória.

Só a 4ª Delegacia de Investigação de Crimes contra o Patrimônio do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) cumpriu 622 mandados de busca contra suspeitos e prendeu 36 receptadores na capital paulista, que responde por mais de 80% dos casos.

Embora a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) não tenha estatística exclusiva sobre roubos de relógios de luxo, o número alto de ocorrências levou a Polícia Militar a intensificar o patrulhamento nas áreas mais vulneráveis a esse tipo de delito.

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Operação conjunta das polícias de São Paulo, Distrito Federal e Pernambuco apreendeu relógios caros com quadrilha que mira itens de luxo. Foto: Divulgação/Polícia Civil do DF

Conforme a pasta, os esforços para identificar e prender receptadores também foram intensificados, por meio de “ações de inteligência, com o objetivo de identificar os responsáveis por esses crimes e seus pontos de venda”.

Por serem “fortunas de pulso”, esses itens atraem o interesse das quadrilhas. Um relógio da suíça Jaeger-Le Coultre, do modelo Duometre, com caixa em ouro rosa e pulseira de couro de crocodilo, pode ser adquirido em São Paulo por R$ 1,3 milhão. Os modelos mais visados são os da marca Rolex.

Academias, restaurantes e shoppings de bairros nobres

No dia 25 de fevereiro, quatro integrantes de uma quadrilha especializada em roubo de joias e relógios de luxo foram presos em São Paulo. Eles agiam nos bairros Pinheiros e Jardim Paulistano, na zona oeste e cometiam os roubos em plena luz do dia.

No dia 14 do mesmo mês, um casal de turistas em um carro de aplicativo teve dois relógios de luxo levados por uma quadrilha armada no centro. A polícia monitorou o trajeto da corrida e constatou que o crime era cometido com o suporte de dois veículos. Enquanto um carro realizava a escolta, o suspeito de moto fazia o assalto. Com uma mochila nas costas, o motociclista se passava por entregador.

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Um dos integrantes da quadrilha, de 22 anos, foi preso em frente a um shopping na região de Pinheiros. Ele levava um simulacro de arma de fogo na mochila de entregador. O carro com três suspeitos - com idades de 20, 40 e 44 anos - foi abordado a cinco minutos do local. Um deles era foragido da Justiça. Quatro celulares usados pela quadrilha foram apreendidos para a busca de informações sobre outros comparsas e receptadores.

Conforme o delegado Alexandre Dias, do 78° Distrito Policial (Jardins), os criminosos se posicionam perto de locais frequentados por pessoas com potencial para ter relógio caro, como shoppings, academias e restaurantes em bairros de alto padrão. Assim que localizam uma possível vítima, preparam a abordagem, quase sempre contando com o elemento surpresa para evitar possíveis reações.

Médico do presidente e dentista dos famosos

Não é raro que as vítimas sejam nomes conhecidos. Em dezembro de 2023, o cardiologista Roberto Kalil Filho, médico do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), foi assaltado na garagem do seu consultório, próximo à unidade do Hospital Sírio-Libanês, na Bela Vista, região central de São Paulo.

Dois criminosos em duas motos o seguiram até o local. Chegando lá, o abordaram e levaram seus pertences, entre eles um relógio Patek Philippe, avaliado em R$ 1 milhão, segundo a polícia. O Deic prendeu dois suspeitos do crime, um deles em Taboão da Serra, na Grande São Paulo. Em um dos celulares apreendidos havia fotos do relógio do médico, mas o bem não foi recuperado.

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Relógio avaliado em R$ 1 milhão, roubado de médico e recuperado pela Polícia Civil de São Paulo. Foto: DIVULGAÇÃO/POLÍCIA CIVIL-SP

Em fevereiro do ano passado, dois homens invadiram um evento com dentistas na zona leste paulistana e roubaram um relógio Rolex de Roberto Viotto, conhecido como dentista dos famosos. A peça estava avaliada em R$ 300 mil. Viotto, que tem mais de 1 milhão de seguidores em redes sociais, ministrava um curso no local.

Em junho do mesmo ano, dois suspeitos do roubo foram presos pela polícia. Com eles, foi encontrada uma réplica de Rolex, mas o relógio roubado do dentista não foi recuperado.

Rede se estende por SP, Recife e Brasília

Conforme a Polícia Civil, devido ao alto valor das peças, as equipes de organizam hierarquicamente. Uma quadrilha que ficou conhecida como a “Gangue do Rolex”, tinha ramificações em São Paulo, Recife e Brasília. O chefe da quadrilha, de 32 anos, foi preso na capital pernambucana com quatro relógios de luxo, cada um avaliado em R$ 150 mil. Dois suspeitos foram presos em São Paulo e outros dois em Brasília.

A operação contra a gangue foi montada pela Polícia do Distrito Federal, com o apoio do Deic paulista e da polícia de Pernambuco. No momento da ação, cada integrante da quadrilha tinha função específica. Havia os ‘olheiros’ que escolhiam as vítimas e os executores que realizavam os roubos de maneira rápida e violenta, de armas em punho.

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Conforme a polícia de São Paulo, os ladrões de relógio elegem suas vítimas com base em sinais de riqueza, como veículos de luxo, roupas e calçados de grife. Também vasculham redes sociais, onde as pessoas costumam ostentar esses bens.

As abordagens ocorrem em áreas movimentadas e, geralmente, os ladrões usam motos furtadas e com placas adulteradas para ação e fuga rápidas. Muitas vezes o executor se disfarça de motoboy ou entregador. Os celulares apreendidos com as quadrilhas mostram intensa troca de mensagens para preparar a logística e executar o roubo.

Institucionalmente, a Polícia Civil de São Paulo orienta as pessoas a nunca reagir em caso de assalto. Policiais ouvidos pela reportagem dão também as seguintes recomendações:

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  • Não expor o item em redes sociais e evitar aparecer nelas usando o relógio;
  • Não usar o bem em festas e eventos com muita gente. Relógio caro deve ser usado com parcimônia, em ocasiões especiais;
  • Evitar transitar pelas ruas com o objeto à mostra no pulso

Correções

Diferentemente do publicado na primeira versão desta reportagem, o uso de réplica de relógio como medida de segurança não é uma recomendação oficial da Polícia Civil. Essa medida foi mencionada por delegados ouvidos durante a apuração da matéria, mas não pode ser tratada como orientação da corporação. A única orientação institucional da Polícia Civil é não reagir em caso de assalto. As demais recomendações foram colhidas em entrevistas com policiais.

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