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Greve no Metrô e na CPTM: ‘População não pode ser vítima’, diz José Álvaro Moisés

Para o professor do Instituto de Estudos Avançados da USP, tanto o governo de São Paulo como os sindicatos estão cometendo falhas

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Foto do author Gonçalo Junior
Atualização:
Foto: Iara Morselli / Estadão
Entrevista comJosé Álvaro MoisésCientista político

No embate entre os metroviários e outras categorias, de um lado, e o governo de São Paulo, do outro, em torno da privatização da Sabesp e da concessão das linhas metroferroviárias, um segmento tem sido a vítima nos últimos meses: a população da cidade de São Paulo. Essa é a opinião do cientista político José Álvaro Moisés, professor sênior do Instituto de Estudos Avançados da USP.

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Na opinião do especialista, tanto o governo de São Paulo como os sindicatos estão cometendo falhas na sequência de greves e ameaças de paralisação no setor de transporte público deste ano. “O governo demonstra dificuldade em dialogar com setores que se colocam como oposição. Já os sindicatos declaram a greve sem explicar claramente suas razões à população”, explica.

“A população não pode ser uma vítima que não recebe informação nem de um lado nem do outro”. Veja outros trechos da entrevista:

Nesta terça-feira, a população de São Paulo enfrentou a quarta paralisação dos metroviários neste ano. Como o senhor analisa essa sequência?

Em primeiro lugar, essas greves são de natureza política. Não trazem uma grande reivindicação salarial ou corporativa. Os manifestantes querem colocar uma ideia em debate público. O segundo aspecto é que o governo estadual tem mostrado certa dificuldade em dialogar com segmentos que se colocam como oposição.

Usuários aguardam em frente da estação Mauá da CPTM, na manhã desta terça-feira Foto: TABA BENEDICTO/ESTADÃO

Como assim?

Em vez de se contrapor aos manifestantes e recorrer à Justiça do Trabalho, que tenta colocar regras no movimento, mas não resolve a situação de fato, o governo poderia abrir um diálogo mais amplo, chamar os líderes da oposição para conhecer as alternativas. Isso pode ser feito na Assembleia Legislativa. Seria uma mudança de paradigmas para buscar uma solução. O mérito da questão é que uma política pública adotada e que alguns segmentos não concordam. O governo foi eleito e tem direito. Em vez de levar o confronto, seria interessante abrir um debate com o conjunto da sociedade. É importante ouvir o governo ouvir os segmentos de oposição mesmo que, no final do processo, ele decida desenvolver o projeto original. Como vencedor da eleição, ele tem legitimidade para implantar os projetos, mas, no momento de crise, seria importante mudar a forma de pensar, indo além da contraposição.

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Os metroviários propõem um plebiscito com a população...

O plebiscito seria uma forma adequada de ouvir a população, mas ele tem de ser precedido de muita informação, discussão e debate. O plebiscito é importante num grande debate. Além do governo e da oposição, o usuário do trem, do Metrô e dos serviços de água e abastecimento deveria ser consultado. As políticas públicas são planejadas para responder às necessidades dos usuários. O mínimo é que eles também sejam ouvidos. A sociedade tem o direito de perceber o que está em jogo. Ela não pode ser vítima das decisões que atrapalham o transporte público. Os sindicatos precisam levar isso em conta. Muitas vezes, eles fazem greves sem que a população saiba a razão da manifestação.

Então tanto o governo como os sindicatos estão falhando?

Da mesma forma que o governo tem responsabilidade em um diálogo mais amplo na Assembleia Legislativa, os sindicatos são responsáveis em apresentar à população as razões do governo e suas próprias posições. Tudo isso antes de entrar em greve. Sem receber informação de um lado e do outro, a população se torna uma vítima desinformada.

O governo afirma que apenas uma pequena parcela dos metroviários é que decide pela greve...

A outra parcela também precisa ser ouvida. Os segmentos que não concordam ou que sejam favoráveis à privatização também precisam ser ouvidos. É preciso conhecer todas as outras opiniões.

Essa tensão pode aumentar por causa das eleições no ano que vem?

Esse é um risco. O calendário eleitoral pode capturar essas questões. Mas eu insisto na necessidade de informar. Além da disputa, é preciso ampliar o grau de informação dos beneficiários dos serviços públicos. Isso é responsabilidade de todos os lados em uma disputa eleitoral. É preciso mais participação da maioria silenciosa para romper as polarizações que têm sido prejudiciais ao processo democrático brasileiro.

Os apagões de energia das últimas semanas deixam a discussão sobre privatização ainda mais complexa?

A Enel, concessionária dos serviços de eletricidade, mostrou deficiências na prestação de serviços à população. Esse é um bom exemplo dos cuidados que uma privatização exige. É preciso ter regras claras em defesa do interesse público para que a população não sofra perda de qualidade. Quem recebeu a concessão tem de responder com responsabilidade e formas de compensação à população em caso de interrupção do serviço. Inclusive com punição prevista em lei. A privatização não pode ser apenas um instrumento de empoderamento das empresas, mas com pouca responsabilidade perante a opinião pública. Privatizar não é uma ação boa ou má em si. É preciso observar o interesse público.