Ano novo, cidade nova? ___ 04 | Mais praças

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Por Henrique de Carvalho
Atualização:

Croquis do autor (Henrique de Carvalho)  

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Quarto episódio de nossa série de Ano Novo. São ao todo cinco pontos relevantes e simples de implantar, com o intuito de inspirar pessoas e administrações municipais a revolucionarem suas cidades nestes dois anos que ainda lhes restam até as próximas eleições para prefeito.

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04 | Mais praças

Todas as cidades brasileiras têm uma demanda não atendida por espaços livres urbanos de qualidade, e agir neste tópico resolveria uma série de problemas paralelos, como aumento de áreas verdes urbanas, entrosamento da vizinhança, maior sensação de pertencimento, redução de criminalidade, menor sedentarismo, proximidade com a natureza, aumento de permeabilidade do solo e, consequentemente, redução de alagamentos. Mas para isso dar certo é preciso mexer alguns pequenos pauzinhos de nosso hábito cultural.

Sei de gente que é anti-praça. Dizem que é lugar para juntar a malandragem, espaço que se degrada porque ninguém usa. Mas "péralá"! Um espaço desses só se degrada se repelir o uso, se for abandonado, não servir às pessoas ou não receber manutenção adequada, tornando-se (aí sim) inviável.

Vemos, ainda hoje, a implantação de praças alheias ao local em que estão inseridas, sendo mero desenho de piso com grama ralada e meia dúzia de ipês-amarelos espetados. Essas áreas públicas devem servir (intensamente, eu reforçaria) à comunidade, fazendo com que as pessoas gostem da idéia de sair de casa para ir até lá e ali se reconheçam umas nas outras.

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Atualmente, em São Paulo, a demanda é tão mal atendida que as pessoas adotaram o Minhocão como espaço livre urbano aos finais de semana. Ao mesmo tempo em que o gesto de ocupar e ressignificar um viaduto é positivo, é simultaneamente uma aberração naturalizada pela ausência de opções de qualidade e compatíveis com as necessidades das pessoas.

Como São Paulo não é parâmetro para outras cidades, pois é uma megalópole superproblemática, pensemos pois na cidade média real, de 50.000 a 200.000 habitantes, como é a maioria das cidades no Estado de São Paulo.

O primeiro passo é ter boas praças. Isto significa começar com uma pesquisa sobre as necessidades das pessoas, da cidade e identificar vocações naturais do lugar, que servirão de base para um bom projeto. Depois é desenvolver um bom projeto e, em seguida, executar este projeto corretamente, sem estraçalhá-lo sob o discurso de "é o que deu pra fazer".

Também é preciso cuidar adequadamente das praças, fazendo manutenção periódica adequada (períodos curtos, claro!), indo além daquela aparada de grama protocolar que costumamos ver por aí, só pra constar. Para garantir a segurança, basta deslocar parte do efetivo ocioso em delegacias com pouco movimento para as praças.

A demanda por espaços livres é tão grande que, onde houver grama, uns bancos e iluminação noturna, lá estarão pessoas interessadas em fazer esportes e brincar com as crianças. Iluminação eficiente já é, em si, um grande atrator de público.

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Observem como aquele pedaço iluminado para o Natal sempre ganha incremento de usuários que não estão interessados na decoração, mas na sensação de segurança que o incremento na iluminação propicia.

Levando a vida pra rua, teremos cidades mais seguras e saudáveis. As cidades sofrem devido à lógica da falta e da escassez presentes no pensamento dos que a administram e, mais largamente, presentes no fluxo de pensamento de todo brasileiro quase como uma regra, uma metodologia cultivada pela escassez factual à qual somos submetidos. Contudo, podemos ter a imaginação voltada para uma postura generosa ao ouvir, projetar, implementar e gerir espaços, mesmo que com pouca grana. Superaríamos obstáculos que nós mesmos criamos -- como é a lógica da escassez --, cultivando no solo fértil de nossas praças e parques a cultura da generosidade.

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