O banco sonoro inaugurado nesta quinta-feira, 21, no Parque Augusta representa um convite, um irresistível “vem, senta aqui”, para as crianças ouvirem músicas e histórias infantis nesse refúgio verde na região central da cidade.
Mas o chamado não é só para crianças. O banco é uma escultura feita a partir da grande raiz de uma árvore com um sistema de som embutido. Para ouvir as histórias, não é preciso estar apenas sentado no banco em si, com fones de ouvido. As caixas acústicas também alcançam quem estiver perto, sentado na grama no entorno, por exemplo.
Com isso, a aposta dos criadores é que o banco se torne um ponto de aprendizado, diversão e imaginação para famílias, educadores e amantes da literatura. “Colocar um banco sonoro de histórias infantis em um parque é uma forma de colocar a literatura em outro ambiente de escuta. Existem muitas crianças no centro”, diz Ana Maria Wilheim, idealizadora e coordenadora do projeto por meio da consultoria Tecer Memórias e Legados.
E quem se sentar para ouvir vai ser tocado pela diversidade de escrituras. São mais de três horas de contos, poesias, músicas e fábulas tradicionais e contemporâneas, além de obras africanas e indígenas. As vozes que narram as histórias também são plurais, de pessoas pretas, indígenas e de diversas regiões da cidade.
“São vozes que trazem a pluralidade, com textos pensados para as infâncias dos filhos, pais, mães e avós”, diz Bel Santos Mayer, coordenadora do Instituto Brasileiro de Estudos e Apoio Comunitário (Ibeac) e curadora do projeto ao lado de Val Rocha, também do instituto, e do poeta e escritor André Gravatá.
Antes mesmo da inauguração, o espaço começou a ser visitado. A empreendedora Priscila Gemballa, de 40 anos, ajudou o filho Martin a curtir o banco. E o menino de 3 anos mostrou que o mobiliário também permite subir, trepar, pendurar e balançar – e outros verbos que a imaginação sugerir.
Essa interação entre pais e filhos é uma das propostas do banco, na opinião do administrador do parque, Heraldo Guiaro. “Muitos visitantes consideram o parque como seu próprio quintal, compartilhando os espaços. Agora, o ato de contar e ouvir histórias faz parte desse imaginário”, diz.
É uma peça que, na verdade, conecta várias dimensões, como a ancestralidade, a vida comunitária, o fazer artístico e a riqueza vegetal. É uma ida ao passado – você se lembra como é gostoso ouvir uma história? -, mas que não deixa de olhar para a frente. Um QR Code abre possibilidades de ouvir as histórias em outros lugares, não só dentro do parque, e traz imagens de narradores e escritores, satisfazendo aquela curiosidade de saber quais os rostos que estão por trás das palavras.
O banco é a raiz de um eucalipto transformada em obra de arte. Desde o final dos anos 1980, o artista Hugo França desenvolve “esculturas mobiliárias” executadas a partir de resíduos florestais e urbanos, como árvores condenadas por ação das intempéries ou pela ação do homem. As formas naturais, buracos, rachaduras e até marcas de queimada e da ação do tempo são sua inspiração.
Existem mais dois bancos sonoros no Parque Ibirapuera
Batizado de Banco Sonoro Carrossel de Histórias, a peça é a terceira de uma coleção de totens urbanos. O primeiro deles, inaugurado em setembro de 2019, no Parque Ibirapuera, é uma homenagem a Jorge Wilheim, um dos principais nomes do urbanismo brasileiro que foi responsável pelos projetos de revitalização do Pateo do Collegio e do Vale do Anhangabaú na região central, além de projetos urbanísticos e planos diretores de cidades em vários estados.
O desejo de Jorge, de se sentar no banco de uma praça e contar sua trajetória para as novas gerações, inspirou a filha, Ana, a criar o banco sonoro. Ali, o conteúdo é um debate realizado nos anos 1990 entre Wilheim e os filósofos Olgária Matos e Mário Sérgio Cortella.
O outro banco, chamado Raízes Negras, localizado em frente ao Museu Afro Brasil, também no Parque Ibirapuera, conta histórias de representantes da cultura negra, como Emanoel Araujo, diretor do Museu Afro Brasil falecido em 2022, e Sueli Carneiro, escritora, filósofa e idealizadora do Instituto Geledés. Essas narrativas fazem parte da coleção “Vidas Negras” do Museu da Pessoa.
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