O relator da revisão da Lei de Zoneamento, Rodrigo Goulart (PSD), apresentou diversas alterações na proposta enviada pela gestão Ricardo Nunes (MDB) à Câmara Municipal em outubro. Algumas das mudanças — anunciadas nesta segunda-feira, 4 — atendem a demandas de empresários do setor privado, como a permissão para construções de maior porte e mais tipos de atividades comerciais e de serviços na Avenida Rebouças. Já a anunciada proteção a vilas pode ter um impacto menor, pois dependerá de análise caso a caso por órgão competente e poderá ser revertida caso tenha anuência dos proprietários e da Prefeitura.
A primeira votação é nesta quinta-feira, 7, com segunda apreciação em 14 de dezembro. Como o Estadão antecipou, algumas Zonas Especiais de Proteção Ambiental (Zepam) foram remarcados como Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis), o que permite a regularização de ocupações irregulares em áreas no entorno das represas e da Serra da Cantareira.
O texto substitutivo mantém parte das propostas que atendem a reivindicações de associações de bairros, mas com algumas alterações. No caso da proteção a vilas, a restrição que dificulta o avanço de prédios altos passaria a valer mediante avaliação “caso a caso” de um órgão responsável a pedido dos proprietários. Isto é, não seria automática e pode impactar em um volume menor do que as 1.042 quadras mapeadas pelo Legislativo. Além disso, com o aval de todos os donos e de órgão municipal, a proteção pode ser revertida, permitindo, por exemplo, uma eventual substituição por prédios altos.
A proposta para a Avenida Rebouças envolve o trecho entre a Rua Estados Unidos e a Avenida Brigadeiro Faria Lima, onde há hoje mais restrições construtivas e de atividades, por envolver a “borda” da Zona Estritamente Residencial (ZER) dos Jardins. Com a alteração sugerida, esse perímetro e a Avenida Eusébio Matoso continuam como Zona Corredor (ZCOR), mas os imóveis poderiam ter um aumento de até 50% na altura, hoje limitada a 10 m, podendo chegar a cerca de 15 m.
O máximo de altura envolve outros fatores, um dos principais também tem alteração sugerida, que é o coeficiente de aproveitamento. Esse coeficiente limita a área construída a uma vez a metragem do terreno, isto é, um imóvel de 100 m² de área construída em um terreno desse tamanho. Com a proposta, esse volume pode subir em 50%. Ou seja, 1,5 vezes a área do lote.
Isto é, a alteração permitiria construções mais robustas. “Foi uma matéria bastante discutida durante as audiências públicas”, justificou o relator. “Pode desenvolver uma região hoje parada no tempo”, disse a jornalistas.
Da mesma forma, o relator falou que vai propor a alteração do zoneamento do mesmo trecho da Rebouças de ZCOR-2 para ZCOR-3, que é mais flexível no tipo e porte de atividades exercidas. A alteração liberaria alguns estabelecimentos não residenciais para um público de até 500 pessoas, não mais até 100 pessoas. Isso inclui alguns comércios, estabelecimentos de ensino, espaços esportivos, culturais e de lazer etc.
Alterações no regramento do trecho citado da Rebouças é uma demanda de parte dos donos de imóveis da via, que relatam dificuldades para a locação diante das restrições, enquanto o lado da via está em plena transformação e valorização. Isso ocorre porque o lado ímpar é ZCOR do trecho tombado dos Jardins, enquanto o lado par é um eixo de verticalização.
O que mudou na proposta para vilas?
A proposta de proteção às vilas pode ter um efeito mais limitado em relação ao que foi originalmente sinalizado pela Câmara. A proteção que impediria prédios altos nesses conjuntos seria implementada após análise “caso a caso” pela “divisão de licenciamento competente” no Município. Isto é, as restrições não entrariam em vigor imediatamente após a aprovação dos projetos.
Além disso, a nova proposta permite que o local deixe de ser vila e tenha um zoneamento menos restritivo mediante o aval de todos proprietários e da Câmara Técnica de Legislação Urbanística, ligada à Prefeitura. Isto é, cairia a proteção proposta (de Zona Predominantemente Residencial, com imóveis de até 10 m), que daria lugar a uma classificação que permita prédios.
Após a eventual aprovação do projeto de lei, a Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (Smul) terá 90 dias para definir os procedimentos administrativos da avaliação das vilas.
Segundo o relator, foi feito “o que era possível”. “Não dá para a Câmara determinar quais deverão ter essa preservação”, disse. “Todos os proprietários vão ter que pedir na secretaria (municipal)”, afirmou. “Todos os proprietários vão ter que concordar com a descaracterização.”
Novas alterações são esperadas antes da apreciação final, prevista para 14 de dezembro. “Muitos outros (pedidos de mudanças) ainda estão sendo avaliados para, se for o caso, alteração em um segundo substitutivo”, disse o relator na apresentação. Na audiência, parte dos participantes criticou o tempo de menos de duas semanas para avaliação da proposta antes das duas votações.
Mais mudanças
Outro ponto mantido foi a retirada de incentivos e da permissão para prédios sem limite de altura de alguns “eixos de verticalização”, como em grande parte da Vila Madalena. Uma alteração pode, contudo, enfraquecer essa proposta, pois permite que construções altas caso sejam 40% da área dos terrenos daquela quadra (hoje, a norma exige ao menos metade). Como o Estadão mostrou, outros dispositivos legais também limitam o impacto dessa proposta.
A exclusão de eixos envolve quadras com características consideradas inadequadas para uma ampla verticalização, o que inclui áreas de risco, com cursos d’água, alta declividade (quando em ao menos metade da quadra) ou com barreiras urbanísticas (como linhas férreas, cemitérios e outros espaços que exigem um maior deslocamento do pedestre, “contornando” o local), em vias de até 12 m de largura, dentre outras.
Outra novidade são os incentivos para empreendimentos com propostas sustentáveis, como o uso de energia solar e de pré-tratamento de esgoto. Esses locais são chamados “edifícios conceito”. A proposta é vista com ressalvas por alguns especialistas por envolver estímulo significativo (20% de desconto na outorga onerosa, principal taxa cobrada do setor imobiliário, que pode chegar a milhões de reais, principalmente em bairros mais valorizados).
Segundo os críticos do modelo, esse modelo reduziria a arrecadação do Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano. A verba desse fundo é uma das principais para obras de habitação, infraestrutura e mobilidade na cidade.
A nova versão do PL ainda autoriza que os empreendimentos obtenham incentivos municipais para “fachada ativa” (comércio no térreo) mesmo quando ocupar apenas uma das entradas. Hoje, esses espaços podem ser construídos “de graça” (não entram no cálculo da taxa chamada outorga onerosa) se instalados em todas as entradas do prédio. Com a proposta, poderá estar em apenas uma.
Essa proposta era uma demanda dos setores comercial e imobiliário, que argumentavam que alguns comércios de térreo precisavam ficar voltados a ruas sem saída ou sem movimento.
O projeto de lei da revisão mantém outras mudanças significativas propostas na versão da Prefeitura e antecipadas pelo Estadão. Entre elas, estão o desestímulo à construção de microapartamentos para hospedagem (como Airbnb), a criação de uma zona especial com regras mais flexíveis em área militar perto do Parque do Ibirapuera, a liberação de comércios de alimentos de maior porte em parques e a proibição a ferros-velhos e comércio de material reciclável no centro, dentre outras.
Quais vilas poderiam ser blindadas? Veja mapa interativo
As vilas com a proteção proposta estão nas quadras destacadas abaixo. Segundo o relator, a mudança permitida não seria para todo o quarteirão, mas exclusivamente para o conjunto de casas e sua faixa envoltória. Na ferramenta, é possível também fazer a busca por endereço.
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Como é o atual zoneamento de São Paulo?
O Estadão desenvolveu um mapa interativo do zoneamento atual. A ferramenta foi criada a partir da base de dados oficial da Prefeitura (Geosampa). O material também permite a busca por endereço.
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