SÃO PAULO - Vera Lúcia Jesus, de 51 anos, mal consegue abrir as janelas de seu apartamento, no quarto andar de um prédio colado ao Minhocão, o Elevado Costa e Silva – via expressa que liga o centro à zona oeste da capital. “Só abro porque não aguento ficar confinada. Limpo a casa todos os dias. Mas é só passar a mão nos móveis que se percebe a poluição”, diz ela, que é síndica. A partir de 2015, no entanto, Vera pretende arejar a casa com frequência.
Um projeto do grupo urbano Movimento 90° quer construir, ao longo de todo o ano, 8 mil metros quadrados de parques verticais – o equivalente ao tamanho de um campo de futebol – nas faces sem janelas e sem utilidade de 20 prédios próximos do elevado, para criar uma espécie de corredor verde. A ideia é ocupar com plantas as paredes nuas. “Vimos que os locais mais poluídos e sem verde na cidade estão próximos de grandes avenidas. O Minhocão é um ícone da degradação e só ali há 140 empenas cegas”, afirma o paisagista e idealizador do Movimento 90°, Guil Blanche. Empenas cegas são essas paredes lisas, que eram obrigatórias por lei no início do século 20 para que os prédios pudessem se colar uns aos outros. Na década de 1950, a lei mudou e exigiu que houvesse circulação de ar entre as construções. A partir daí, esses grandes espaços passaram a ser ocupados por propaganda, mas voltaram a ficar vazios com o surgimento da Lei Cidade Limpa, em 2007. O jardim vertical que deverá ocupar essas paredes funciona como isolante térmico e pode diminuir em 30% a poluição do entorno. “Passam cerca de 120 mil carros pelo elevado todos os dias. Nossa intenção com esse projeto, além de ‘florestar’ as paredes, é mostrar a impotência dos moradores, que foram atacados com a construção desse aparelho público na década de 1970”, diz Blanche. A instalação deles depende unicamente da autorização dos moradores do prédio. O investimento, que é de cerca de R$ 850 por metro quadrado, será financiado por empresas privadas, que também vão se responsabilizar pela manutenção. “Estamos em negociação. Gostaríamos que alguma empresa se identificasse com o projeto da mesma forma que os patrocinadores das bicicletas”, diz. Impacto. O grupo já instalou um painel de 220 m² em um prédio no Largo Padre Péricles, no início do elevado, para uma ação de uma marca de vodca. Montado em 15 dias, em dezembro do ano passado, ele deverá ser levado em um mês para outra região da cidade e não fará parte do corredor verde. O impacto nos moradores da região, no entanto, foi positivo. “Esse local é muito feio, precisa dar uma revigorada, trazer um colorido para esse cinza. Se oferecessem esse painel para o meu prédio, eu toparia na hora”, afirma a moradora da região Meire Ribeiro, de 45 anos. Dos 20 prédios previstos para receber os painéis, oito já concordaram. Um deles é o de Vera, que não consegue abrir a janela. “Essa região é triste e poluída e nós somos meio abandonados. Só se preocupam com a movimentação dos carros”, diz. “Espero que os parques tragam refresco, outro perfume e uma paisagem belíssima.”
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