A progressão de pena é uma necessidade de qualquer sistema penal do mundo, mas não pode ser padronizada para todos os tipos de crimes. Criminosos violentos ou reincidentes deveriam ter mais dificuldades para mudar o regime de cumprimento de pena e passar do mais rigoroso (fechado) para o mais brando (semiaberto ou aberto).
Essa é a visão do ex-secretário nacional de Segurança Pública e consultor internacional na área, o coronel reformado da Polícia Militar paulista José Vicente da Silva Filho.
A pedido do Estadão, o ex-secretário analisou a morte do delegado de classe especial Mauro Guimarães Soares, de 59 anos, baleado no sábado, 21, na Vila Romana, zona oeste de São Paulo. O suspeito identificado e preso se chama Enzo Wagner Lima Campos, de 24 anos, e já tinha sido preso em outras ocasiões, quatro delas por roubos com uso de arma de fogo. Ele chegou a ser condenado em 2020 e cumpria a pena em prisão domiciliar.
Além da comoção causada pelos latrocínios (roubo seguido de morte), a intensidade e a frequência dos crimes cometidos nas ruas das principais cidades do País também são responsáveis pela sensação de insegurança, de acordo com o especialista. Veja alguns trechos da entrevista:
Um dos aspectos que chama a atenção na morte do delegado Mauro Guimarães é o fato de o suspeito estar em prisão domiciliar. Como o senhor analisa esse aspecto?
A progressão de pena é uma necessidade de qualquer sistema penal do mundo. O problema é que ela não pode ser padronizada para todos os crimes. Embora já tenhamos algumas divisões, como no caso dos crimes hediondos, é preciso mais algumas diferenciações.
Como assim?
Crimes com grave ameaça ou uso de arma de fogo ou aqueles criminosos com alta reincidência precisam de pena mais intensa. No caso dos reincidentes, já existe um projeto em estudo e defendido por vários governadores. É uma forma de dificultar a progressão de pena com manejo da legislação criminal. Além das restrições que já existem aos homicídios e latrocínios.
Por que a progressão é importante?
A progressão é necessária porque favorece o retorno à sociedade. Um dado que não é muito divulgado é que, todo mês, 10 mil presos aproximadamente saem em liberdade. Eles saem por vários motivos, como doença, progressão, troca de pena ou cumprimento total. Nesse cenário, é preciso entender e investigar como eles estão saindo das prisões.
O problema, então, não é só o regime de cumprimento da pena?
Existem muitas nuances. Cabe ao Congresso ou ao Ministério da Justiça examinar onde estão as falhas dos instrumentos criminais de contenção. Temos 100 mil presos aguardando julgamento, com prisão temporária. Desse total, aproximadamente 10 mil serão inocentados. Isso significa que eles estão de graça nas cadeias. Mais ou menos 15% terão uma pena sem restrição de liberdade. Por isso, é necessário encontrar as vulnerabilidades penais para oferecer soluções. Todo instrumento legislativo tem de ser aperfeiçoado ao longo do tempo.
Falta uma visão mais ampla do problema penitenciário no País?
É importante refinar o diagnóstico, saber exatamente o problema e os instrumentos e recursos para mitigar ou resolvê-lo. Isso se chama política pública. Está faltando um pouco disso. A legislação criminal não muda muito no mundo inteiro, mas ela precisa ter um dinamismo próprio para acompanhar as demandas da sociedade.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.