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Mussum, Elza Soares e mais: SP vai escolher mais personalidades negras para ganhar estátuas

Cidade terá cinco novos monumentos para valorizar a cultura e a história negra de personalidades escolhidas pela população

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Foto do author Gonçalo Junior
Atualização:

Qual é a escultura de uma personalidade negra que você conhece na cidade de São Paulo? Antes que você se sinta tentado a “dar um Google”, saiba que elas são raras mesmo. Das 390 obras de arte e monumentos em espaços públicos espalhados da capital, só dez retratam personalidades negras.

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Para minimizar a falta de representatividade, a Secretaria Municipal de Cultura vai instalar mais cinco esculturas para valorizar a história e a cultura da população negra. O primeiro passo do projeto foi abrir consulta pública para a população opinar sobre as novas personalidades a serem homenageadas nas ruas e praças.

Os cidadãos podem votar até o dia 25 deste mês, escolhendo três nomes pela plataforma Participe+ (mais informações abaixo). A secretária municipal de Cultura, Aline Torres, afirma que as cinco esculturas mais votadas na eleição virtual serão as novas a serem produzidas – os escultores também serão negros. Os prazos ainda não estão definidos.

Elza Soares é uma das personalidades que podem ser homenageadas Foto: Fabio Motta/Estadão

Esse é o segundo movimento recente realizado pelo poder municipal com esse objetivo. Em 2021 foram concebidas cinco peças em diferentes bairros da cidade, de acordo com a referência, história e vivência de cada figura homenageada.

A Prefeitura pretende continuar essa ação. “Ao longo dos anos resgataremos importantes histórias, valorizando e divulgando essas grandes personalidades negras que contribuíram tanto para a história da capital, além de divulgar o trabalho de artistas contemporâneos que passarão a integrar o expressivo acervo de Obras de Arte e Monumentos em Espaços Públicos da Cidade de São Paulo”, diz o texto da consulta pública.

Estátua em homenagem a Joaquim Pinto de Oliveira, arquiteto negro escravizado no século XVIII conhecido como Tebas, na região central de São Paulo Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Essas ações são o resultado de mobilizações protagonizadas pelos movimentos negros que pautam o direito à História e o reposicionamento das narrativas sobre os afrodescendentes. Essa é a opinião da historiadora Taina Silva Santos, mestra em História Social pela Unicamp e coordenadora de projetos na Casa Sueli Carneiro.

“Esses movimentos têm mostrado o quanto precisamos avançar coletivamente em termos éticos e em relação às formas que nos relacionamos com o passado, sobretudo com os apagamentos e silêncios que deixaram a população negra nos bastidores da História”, diz .

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Conheça as sugestões da Prefeitura para você votar:

Mãe Sylvia de Oxalá - importante na preservação do modo de vida, a valorização e queda de estigmas e preconceitos do Candomblé. Comandou o terreiro Axé Ilê Obá, primeiro espaço de candomblé tombado pelo Condephaat, estadual, como patrimônio Histórico e Cultural, de 1986 a 2014.

Elza Soares - um dos nomes mais importantes da história da música popular brasileira com uma trajetória com reviravoltas e recomeços memoráveis. Nos anos 70, foi perseguida pela ditadura militar. A música “A Carne” se tornou símbolo contra o racismo.

Ruth de Souza - primeira atriz negra a atuar no Theatro Municipal e a primeira brasileira indicada a um prêmio internacional de cinema. Em 50 anos de trabalho na Globo, fez mais de 30 novelas.

Laudelina de Campos Melo - a mineira nasceu em 1904, menos de 20 anos depois da abolição da escravatura. Desde a adolescência, atuou em organizações sociais do movimento negro. Na década de 1930, sua trajetória ganhou contornos políticos. Foi figura-chave no movimento sindical.

Dandara - a guerreira foi uma das principais personalidades na resistência negra contra o regime escravagista no Brasil. Teve papel fundamental no comando do quilombo dos Palmares.

Tereza de Benguela - a líder viveu no século XVIII e, após a morte do marido, José Piolho, passou a chefiar o quilombo do Piolho (ou Quariterê), na atual fronteira entre Mato Grosso e Bolívia. Sob sua liderança, as comunidades negra e indígena resistiram à escravidão por duas décadas, até 1770.

Iracema de Almeida - uma das primeiras médicas negras em São Paulo e pioneira nos estudos de anemia falciforme no Brasil. Suas pesquisas ainda pautam protocolos de atendimento. Uma das principais vozes pela fundação do Museu Afro Brasil e falecida em 2004.

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Lélia Gonzalez - teve especial participação na fundação do Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial, em São Paulo, 1978. Ficou marcada na história em vista de sua atuação como filósofa, antropóloga, escritora, intelectual, professora e militante do movimento negro e feminista.

Chaguinhas - Francisco José das Chagas liderou a Revolta Nativista que buscava igualdade de pagamento entre militares brasileiros e portugueses. Foi condenado à forca. em 1821. No dia de sua execução, a corda, instalada na Praça da Liberdade, rompeu-se três vezes. Na Capela em que foi sepultado, devotos buscam milagres batendo três vezes em uma porta de madeira.

Irmãos Rebouças - são considerados os primeiros negros a cursar uma universidade e os dois maiores engenheiros do Brasil no século XIX com obras como o chafariz na Praça Zacarias, em Curitiba, e a Ferrovia Paranaguá-Curitiba, a maior obra da engenharia férrea nacional).

Abdias Nascimento - intelectual completo, foi poeta, escritor, dramaturgo, artista visual e ativista. Fundou o Teatro Experimental do Negro e o projeto Museu de Arte Negra. Foi professor emérito da Universidade do Estado de Nova York (EUA) e foi senador da República.

Milton Santos - um dos geógrafos mais estudados do Brasil. Destacou-se por escrever e abordar sobre temas como a epistemologia da Geografia, o espaço urbano, urbanização, a globalização, entre outros.

Grande Otelo - ator, comediante, cantor, produtor e compositor. Artista de cassinos cariocas e do chamado teatro de revista e de mais de 100 filmes. É frequentemente citado com um dos mais importantes atores da história do Brasil.

Mussum - ator, músico e comediante com mais de 20 anos no grupo Os Trapalhões, além de fundador do grupo “Os Originais do Samba”, responsável pela afirmação do ritmo na construção da identidade nacional.

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Veja como votar

Para participar é necessário ter uma conta no Participe+ e estar logado. Este o site de participação nas consultas da Prefeitura (https://participemais.prefeitura.sp.gov.br/)

Caso ainda não tenha uma conta, veja aqui como criar a sua no endereço: https://www.youtube.com/watch?v=sUQoimPODyY

Na aba “Debate”, você terá acesso a uma breve biografia das personalidades negras indicadas pelo DPH/SMC. Você deverá “apoiar” uma delas, podendo comentar o porquê de sua seleção.

Qualquer dúvida acerca do site Participe +, entre em contato com a equipe de Governo Aberto pelo e-mail: participemais@prefeitura.sp.gov.br ou então governoaberto@prefeitura.sp.gov.br

É uma reparação histórica pela escravidão, dizem historiadores

A historiadora Heloisa Rosa afirma que as estátuas são uma forma de reparação histórica pelo período da escravidão. “É uma ferramenta na criação de narrativas que desvinculam a história da população negra à sujeição e à violência, o que demonstra o potencial dessa iniciativa, tanto no que diz respeito ao trato com um passado traumático, como na aspiração de um futuro em que a representação de pessoas negras possa gerar autoestima, e assim, ser uma ferramenta de enfrentamento do racismo, em suas diferentes facetas”, diz a educadora patrimonial no Museu da Cidade de São Paulo.

Doutorando em História pela Unicamp e especialista em Patrimônio Cultural e Memórias da Escravidão, o historiador Francisco Phelipe Cunha Paz adota linha semelhante. “O exercício de lembrar, passarmos de uma memória sobre o negro, ou de um apagamento da memória sobre o negro, para uma memória negra, um lembrar negro do negro, pode ser um dos caminhos para libertar o negro brasileiro do cativeiro colonial e no combate efetivo ao racismo”, diz o especialista.

Estátua de Zumbi dos Palmares na Praçaa Antônio Prado, região central de São Paulo Foto: Daniel Teixeira/Estadão

“Esse lembrar negro do negro, articulado aos monumentos dedicados às personalidades negras, permite à população negra brasileira poder se refazer para além das dores, das chagas, marcas e traumas da escravidão”.

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Tainá Silva Santos ressalta que o aumento de estátuas pode ser um bom recurso se estiver alinhado com um projeto amplo de reparação histórica à população negra que não se resuma, apenas, à representação no conjunto de monumentos da cidade. “Essa medida será realmente efetiva quando trabalhada de forma intersetorial e interseccional pelos governos”.

* Este conteúdo foi produzido em parceria com integrantes da Casa Sueli Carneiro e da Rede de Historiadorxs Negrxs

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