Após uma reunião nesta quarta-feira, 24, a Prefeitura de São Paulo, a Uninove e o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) chegaram a um novo acordo para a antecipação do pagamento dos recursos necessários para a desapropriação da área do futuro Parque do Bixiga, na Bela Vista, no centro paulistano. O compromisso firmado é que os quase R$ 65 milhões sejam depositados nos cofres municipais até 12 de agosto e, na sequência, poderão ser destinados à compra dos terrenos do Grupo Silvio Santos.
Os recursos são oriundos de um acordo relativo a uma ação civil de improbidade administrativa contra a universidade. Com o pagamento desse valor e de um restante a ser parcelado (além da cessão de um imóvel à Secretaria Municipal de Saúde e outras medidas), a situação da Uninove com o Município será regularizada. O Grupo Silvio Santos havia concordado com o valor proposto para os terrenos meses atrás.
A criação do Parque do Bixiga é reivindicada há cerca de 40 anos pelo Teatro Oficina (cuja sede é vizinha aos terrenos) e foi, especialmente, defendida pelo dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, morto no ano passado. As tentativas de acordo entre o artista e o apresentador Silvio Santos geraram repercussão nos últimos anos, mas sem uma resolução.
“O importante é que está andando, e indo muito rápido”, destacou o secretário municipal de Governo, Edson Aparecido, ao Estadão. Ele evita apontar um prazo certo para a inauguração do parque, diante ainda de etapas de projeto, obra e outras a serem realizadas, mas avalia que a garantia do recurso antes do inicialmente previsto pode acelerar o processo. “Talvez permita encurtar o prazo de implantação”, diz.
O promotor Silvio Marques, de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital, não vê mais impedimento para a implantação do parque. Ele também esteve envolvido com o acordo que viabilizou a criação do Parque Augusta, também na região central.
“O Parque do Bixiga está garantido. É a primeira vez que eu falo isso. Não tem mais nada que impeça”, declarou ao Estadão. “Vai propiciar a compra imediata do parque. Assim que entrar na conta, pode assinar a escritura e tomar posse”, afirmou. “Foi uma fórmula que a gente encontrou, Prefeitura, Uninove e Ministério Público, para facilitar a aquisição do parque”, finalizou.
Conforme acordado na reunião, a Uninove irá depositar os quase R$ 65 milhões até 12 de agosto, enquanto os outros cerca de R$ 45 milhões serão pagos em 5 parcelas, a partir de setembro. Ao todo, o acordo é estimado em quase R$ 1 bilhão, com o restante realizado de outras formas, como pela cessão de imóveis. Anteriormente, a previsão era que a universidade pagasse o valor majoritário do parque em seis parcelas.
O acordo é oriundo de uma investigação do MP-SP relativa à chamada “máfia dos fiscais”. Segundo apuração do Grupo Especial de Repressão aos Delitos Econômicos (Gedec), a universidade havia pago propina para agentes públicos para escapar da fiscalização. A destinação de parte dos valores à criação do parque teria sido sugerida pela Promotoria.
A reunião desta quarta ocorreu menos de uma semana após o prefeito Ricardo Nunes (MDB) sancionar o decreto de utilidade pública dos imóveis relativos à área de 11,1 mil m² do futuro Parque do Bixiga. Além disso, a “minirrevisão” do Plano Diretor incluiu o espaço entre os parques com implantação preferencial na cidade, o que facilita a criação.
Por enquanto, o espaço segue com a denominação temporária de Parque do Bixiga. Na Câmara, vereadores divergiram sobre a possibilidade de nomeação em homenagem a Zé Celso ou a Silvio Santos (Parque Abravanel). Durante a votação da “minirrevisão”, também lançou-se a ideia de escolher o nome de Adoniran Barbosa, mas não há perspectiva de uma definição nesse aspecto.
Representantes do Teatro Oficina e de movimentos de bairro defendem a criação de um grupo de trabalho conjunto com a Prefeitura para o desenho do futuro parque. Arquitetos e apoiadores da companhia têm desenvolvido uma proposta há anos, a qual inclui a reabertura do Rio Bixiga, que passa pelo terreno e hoje está oculto.
Parque do Bixiga foi grande sonho de Zé Celso; relembre história
Em textos-manifesto, reuniões, entrevistas, performances artísticas e mobilizações públicas, Zé Celso juntou apoiadores diversos e até improváveis contra a construção de edifícios no entorno do Teatro Oficina. A situação foi abordada em peças montadas pela companhia teatral.
Entre as vitórias de Zé Celso após a venda dos imóveis vizinhos à Sisan Empreendimentos (do Grupo Silvio Santos), está o tombamento da sede da companhia nas esferas municipal, estadual e federal (com diferentes perfis e propostas de proteção). O imóvel tem projeto da reconhecida arquiteta Lina Bo Bardi (conhecida especialmente pelo Masp e o Sesc Pompeia), em conjunto com Edson Elito.
Um dos argumentos de Zé Celso pela defesa do parque é de que Lina e Elito já propunham uma praça pública junto ao teatro, batizada de Anhangabaú da Feliz Cidade. Além disso, dizia que os prédios poderiam obstruir a visão do janelão que ocupa grande parte de uma das fachadas laterais do imóvel, enquanto o parque traria lazer e um “respiro” à vizinhança.
A mobilização contra construções no entorno do parque cresceu especialmente após 2000, quando foi aprovado um projeto para construir um shopping no local. Outra proposta que incorporava o teatro ao centro comercial foi apresentada quatro anos depois, também criticada pelo Oficina e posteriormente abandonada pela iniciativa privada.
Depois do shopping, foi a vez das torres. Em 2008, a Sisan propôs erguer um condomínio de três prédios. A obra teve entraves para a aprovação, mas chegou a obter decisões favoráveis nos órgãos municipal e estadual de patrimônio ao longo daquela década e da seguinte, mas não saiu do papel.
Mais recentemente, em fevereiro, o grupo chegou a emparedar os arcos do teatro e a remover uma escada externa do teatro após decisão judicial. À época, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) chamou as medidas de irregulares, pois não tinham aval dos órgãos de patrimônio cultural.
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