Passeio na Maria-Fumaça de Campinas revela tradições paulistas e encanta com riquezas históricas

Trens construídos nas décadas de 1950 e 60 fazem percurso tradicional até Jaguariúna e passam por locais que serviram de cenário para algumas das maiores novelas de época da TV

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Foto do author João Ker
Atualização:

O apito ouvido na plataforma de embarque anuncia: a Maria-Fumaça de Campinas está prestes a sair mais uma vez com direção a Jaguariúna, distante 28 quilômetros dali. A vida se repete na estação desde 1984, quando a Associação Brasileira de Preservação Ferroviária (ABPF) lançou este como o primeiro passeio histórico dos seus “museus itinerantes”, hoje presentes em outras linhas de São Paulo e de outros Estados. Quase 40 anos depois, a atração ainda é buscada por famílias, casais, crianças e jovens como uma parada quase obrigatória para quem visita a cidade.

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A riqueza histórica do trajeto entre Campinas e Jaguariúna, entretanto, é tão palpável que atrai tanto turistas quanto a produção de algumas das maiores novelas de épocas dos últimos anos. Sucessos da TV Globo como Chocolate com Pimenta (2003), Sinhá Moça (2006) e Terra Nostra (1999) tiveram cenas gravadas em algum ponto da região, que guarda atrações além da estação e das vilas ferroviárias.

Alguns deles são as fazendas dos barões de café, construídas há mais de um século e com boa parte de sua estrutura original ainda preservada, pelo menos na área externa. A Fazenda Santa Maria, por exemplo, foi construída em 1830 e era uma das principais produtoras cafeeiras do Estado e, apesar de continuar próxima à Estação Tanquinho, hoje serve como locação de filmagens e opção de hospedagem para turistas.

Já em Jaguariúna, a Fazenda Santa Úrsula (antiga Fazenda Jaguari) foi construída no mesmo período e permanece até hoje sob domínio da família que a construiu. Pelas janelas do trem, é possível ver parte da estrutura original e a amplitude da área, ocupada no século 19 por Antonio Barbosa e Úrsula Franco.

Café da manhã servido no passeio tradicional da Maria-Fumaça de Campinas até Jaguariúna Foto: Marcelo Chello / Estadão

Camila Cordeiro e Felipe Campos, de 34 e 37 anos, fizeram pela primeira vez o trajeto juntos no sábado em que o Estadão estava a bordo do trem. A programação foi ideia dos parentes dele, que moram em Campinas e não só sugeriram o passeio, como acompanharam o casal.

“É um passeio para quem é entusiasta de história e de trens”, diz Felipe. A esposa, que carregava o pequeno Leonardo, nascido há quatro meses, apenas frisou que dependendo da idade, humor e disposição das crianças, o trem pode ser um pouco barulhento demais e acabar incomodando. “Mas vale a pena, porque é muito rico de histórias.”

Rio Atibaia visto da janela da Maria-Fumaça Foto: Marcelo Chello/ Estadão

Apesar de todo o charme do passeio estar nessa experiência real de como era fazer o trajeto de trem no século passado, esse também é o principal motivo para os perrengues que, apesar de pequenos, podem aparecer em maior ou menor grau ao longo das quatro horas de passeio.

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O principal deles é o calor que não dá trégua no interior dos vagões, primeiro porque não existe ar condicionado no interior de nenhum deles e, segundo, porque o vento gerado por uma velocidade média de 30 quilômetros por hora não é suficiente para refrescar quem coloca a cabeça pela janela.

Nesse ritmo, o trajeto completo dura de 3h30 a 4h, mas pode ser feito também só em um trecho. Há ainda a opção de fechar os vagões para alguma festa particular (a ser agendada com antecedência) ou o pacote VIP com café da manhã, cujo cardápio com mini-sanduíches, pão de queijo, doces, bolinhos de chuva, sucos naturais, leite e café (feito com grãos do sul de Minas Gerais em torra média no forno a lenha) foi desenvolvido pela nutricionista Luciana Serra Maccari. Aos 50 anos, ela trabalha nos trens da ABPF em Campinas há mais de 15 anos.

Passeio da Maria-Fumaça de Campinas foi lançado em 1984 e acontece todos os fins de semana e feriados Foto: Marcelo Chello / Estadão

“Eu sempre gostei de fazer esse passeio. Quando estava grávida, trazia meu filho na barriga”, lembra Luciana. Hoje com 18 anos, Luís Maccari se junta ao primo João Francisco Serra, da mesma idade, para ajudar a mãe no atendimento aos turistas, guiando o carrinho de comidas entre um vagão e outro.

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As belezas naturais são uma atração à parte e não passam desapercebidas por quem realiza o trajeto sobre os trilhos de Campinas. O Rio Atibaia, formado pela junção dos rios Atibainha e Cachoeira e principal responsável pelo abastecimento das cidades da região, ainda guarda parte da sua exuberância original, mesmo que hoje esteja mais poluído do que nos séculos passados.

Chegando em Jaguariúna, a pausa para o almoço é de aproximadamente 1h30, tempo de sobra para aproveitar os restaurantes locais, conhecer o Museu Ferroviário, passear pela feira de artesanato na praça e ainda tirar uma “foto histórica” de recordação, com direito a figurino, cenário e estética retrô na revelação.

Interior dos trens, originais das décadas de 1950 e 60, foi revitalizado pela ABPF e se mantém fiel aos originais  Foto: Marcelo Chello / Estadão

Nas últimas semanas, a falta de chuva e o calor no interior de São Paulo fizeram com que o passeio na Maria-Fumaça fosse temporariamente interrompido pelo risco que as fagulhas dos trilhos têm de iniciar queimadas. As duas locomotivas usadas para substituir a relíquia, entretanto, também têm seu próprio valor e foram construídas em 1958 e 1960, época em que pertenciam às companhias Paulista e Mogiana de Estradas de Ferro, marcando a transição da tração a vapor para o diesel.

Os ingressos para o passeio de Maria-Fumaça são vendidos pela internet, através do site oficial da ABPF (clique aqui), ou no guichê, mas é recomendado se preparar com antecedência.

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