Por que mancha de poluição do Rio Tietê é a maior em mais de uma década?

São 207 quilômetros poluídos, segundo a Fundação SOS Mata Atlântica; governo estadual diz que piora era esperada por causa da estiagem e aponta R$ 23 bilhões em investimentos na rede de saneamento básico

Foto do author José Maria Tomazela

A mancha de poluição no Rio Tietê, o maior rio do Estado de São Paulo, aumentou 47 quilômetros entre 2023 e 2024, segundo a Fundação SOS Mata Atlântica. Agora já são 207 quilômetros de rio poluído, a maior extensão desde 2012, quando a mancha chegou a 240 km. No ano passado era de 160 km, o que dá um aumento de 29%.

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A qualidade da água foi monitorada em 576 km do rio, da nascente, em Salesópolis, na Grande São Paulo, até Barra Bonita, na região central do Estado. A extensão total do Tietê, que deságua no Rio Paraná, é de 1.100 quilômetros.

A secretária de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do governo estadual, Natalia Resende, disse ao Estadão que a piora na condição de rios como o Tietê já era esperada por conta da estiagem prolongada que afetou o Estado de São Paulo e todo o Brasil. “Tivemos uma diminuição nos volumes de água, o que gera menos oxigenação, menos movimentação da água e maior concentração de nutrientes e esgoto na água. Isso trouxe um impacto grande na qualidade dos rios”, disse.

Trecho do Rio Tietê na capital; governo afirma que tem investido no desassoreamento e retirada de detritos. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

A grande aposta do governo para reverter esse quadro, segundo ela, é o programa Integra Tietê, lançado em março do ano passado, com o objetivo de, até 2029, serem investidos R$ 23 bilhões na ampliação da rede de saneamento básico, desassoreamento, melhorias no monitoramento da qualidade da água, recuperação de fauna e flora, entre outras medidas com foco na recuperação do maior rio do Estado.

O programa prevê a universalização do saneamento – toda a população atendida com água e esgoto – até 2029. “A gente sabe que não é um desafio para dois ou três anos, mas conseguimos reduzir a meta, que era para 2033″, disse.

Também faz parte do programa o desassoreamento dos rios. Desde o ano passado, segundo ela, foram retirados 1,5 milhão de metros cúbicos de sedimentos dos rios Tietê e Pinheiros, o que equivale a 113 mil caminhões cheios. No caso do Rio Pinheiros, foram retiradas também 70 mil toneladas de lixo.

“A própria SOS fala que 40% da poluição é a chamada poluição difusa, de várias fontes, como as garrafas PET, por exemplo. Só de pneus, retiramos 13.300 pneus do Tietê este ano”, disse.

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Variações ao longo dos anos

Os dados do estudo Observando o Tietê apontam que, apesar de melhorias pontuais, em 131 quilômetros o rio apresentou água em condição ruim e, em outros 76 km, a água tem condição péssima.

Conforme Gustavo Veronesi, coordenador do programa Observando os Rios, da SOS, a extensão da mancha de poluição no Tietê teve variações ao longo dos anos, com momentos de redução e aumento. No entanto, desde 2021, cresceu 143,5%, passando de 85 km naquele ano para 207 agora.

Para ele, embora haja projetos de saneamento em curso, como o Integra Tietê, do governo estadual, a qualidade da água continua a ser comprometida por condições locais, como esgoto ou efluentes tratados em carga superior à capacidade de diluição dos rios, gestão de reservatórios e barragens, clima ou resultante de atividades agropecuárias.

O estudo observa que, na região das cabeceiras do Alto Tietê, entre Suzano e Guarulhos, os indicadores apontam tendência de agravamento das condições ambientais. Aponta ainda que, assim como nos anos anteriores, não houve trechos com água qualificada como ótima em toda a bacia monitorada.

No Rio Tietê, a qualidade da água é péssima entre Itaquaquecetuba e Guarulhos, depois vai para a condição de ruim ao longo da Marginal Tietê, até Osasco, onde volta a ser péssima até Santana de Parnaíba. Depois do trecho inicial, na região de Salesópolis, o rio só volta a ter água boa em Botucatu, na Represa de Barra Bonita. À jusante da represa a água piora e propicia o surgimento de algas, como as que cobriram grandes extensões do rio entre maio e junho deste ano.

Além do Tietê, foram monitorados outros 38 rios da bacia com a coleta de amostras em 61 pontos para análise da qualidade da água. Desses, 62% apresentaram qualidade regular, 11% boa e 26% ruim ou péssima.

Dos seis pontos considerados péssimos, três ficam no Rio Pinheiros, na cidade de São Paulo. As amostras foram colhidas nas pontes do Jaguaré, Cidade Jardim e João Dias.

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O Rio Piracicaba, principal afluente do Tietê, que tinha água boa em 2023, passou a ser regular. O rio foi impactado por um lançamento de poluentes agroindustriais, em julho deste ano, causando a morte de mais de 70 toneladas de peixes. Outros afluentes, como o Rio Sorocaba e o Rio Jundiaí, tiveram a água classificada como regular e ruim, respectivamente.

Para o ambientalista, embora a seca possa ter contribuído para o avanço da poluição, há necessidade de planos integrados que considerem os impactos das mudanças climáticas, do saneamento ambiental nas cidades e do uso da terra ao longo do rio. “Poluir um rio é rápido, mas a recuperação é lenta e exige um estado de atenção constante, com melhorias contínuas no saneamento e na educação ambiental para evitar sua degradação”, disse.

Conforme Veronesi, a criação de um parque linear conectando a Represa de Guarapiranga, o Rio Pinheiros, o Rio Tietê e o Parque Ecológico do Tietê, com 50 km de áreas verdes ao longo dos rios, contribuiria para melhorar a depuração das águas. “É uma medida urgente para São Paulo mitigar os efeitos das chuvas intensas e das ondas de calor. A vegetação auxilia na infiltração da água das chuvas, reduzindo enchentes, e proporciona um clima mais fresco com a sombra das árvores”, disse.

Privatização da Sabesp

A secretária de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do governo estadual, Natalia Resende acredita que a privatização da Sabesp vai ajudar a ampliar o saneamento nas cidades. “Têm cidades que tratam muito pouco do esgoto e vão ter condições de tratar mais. Vamos avançar muito principalmente em cidades do Alto Tietê, levando saneamento para a zona rural. A gente está fortalecendo também as agências reguladoras, entre elas a Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos no Estado de São Paulo)”, disse.

O relatório da SOS Mata Atlântica cita a despoluição do Rio Sena, na França, palco dos Jogos Olímpicos, em Paris, este ano, como exemplo de que é possível recuperar um rio morto. Segundo a secretária, até 2029 o Tietê não será um rio para nadar ou beber água, mas estará muito melhor do que hoje. “Até 2029 vamos ter um rio mais limpo, com menos odor e de cor mais limpa. É um rio urbano, mas com todo o planejamento que estamos fazendo, inclusive olhando as margens, vamos ter um rio de melhor qualidade.”

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