O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) entrou com ação civil pública para que a incorporadora São José pague danos sociais, ambientais, urbanísticos e morais em indenizações de mais de meio bilhão de reais pela construção de um prédio irregular de luxo no Itaim Bibi, em área nobre da cidade de São Paulo. Os promotores requerem também a demolição do edifício, construído sem alvará de execução. A defesa da empresa diz buscar a regularização do empreendimento e uma solução consensual.
“Quando deu início às obras sem o alvará de execução (pedido de emissão indeferido por três vezes), a empresa requerida decidiu agir em desconformidade com a legislação, não havendo qualquer fundamento para sustentar uma eventual alegação de boa-fé”, disse a Promotoria de Habitação e Urbanismo da Capital à Justiça.
Ao ajuizar a ação, os promotores também criticaram a gestão Ricardo Nunes (MDB) por propor ação sobre o caso, pois avaliam que o Município tem responsabilidade pela execução da obra sem alvará. “Inviável que o Município pretenda, portanto, a pretexto de deter a legitimidade ativa para a propositura de demanda, esquivar-se de tal responsabilidade, que deverá abarcar, solidariamente com os demais codemandados, os custos com a demolição do empreendimento”, apontou.
O prefeito tem defendido publicamente a demolição e destacado as ações de fiscalização e embargo. Em nota, a gestão Nunes disse que a Prefeitura “ajuizou ação demolitória em defesa do interesse público e da legalidade e aguarda decisão”.
Para o MP, “é mais do que evidente a falha do poder público municipal em seu dever de fiscalização”, sobretudo por se tratar “de um edifício de enormes proporções, construído ao longo de alguns anos, em pleno Itaim Bibi, sem alvará de execução, sob os olhos complacentes do poder público local”.
Edifício tem 23 pavimentos e 80 metros de altura
De alto padrão, o prédio tem 23 pavimentos de 20 apartamentos, com unidades de 382 m² e 739 m². O imóvel fica na Rua Leopoldo Couto de Magalhães Júnior e foi divulgado com o nome de Edifício St. Barths, com 80 metros de altura e 14,5 mil m² de área construída. São 20 andares e três subsolos, voltados principalmente para vagas de garagem.
A obra foi interrompida apenas em fevereiro, quando estava com todos os pavimentos adiantados. O embargo feito pela Prefeitura determinou multa de R$ 2,5 milhões.
O MP-SP fala em dano moral coletivo e dano social, com a justificativa de que “violou a ordem urbanística difusa, que é de especial relevância para toda sociedade”. A indenização é estimada em R$ 479,8 milhões, calculada com base no dobro do valor do metro quadrado estimado do imóvel. Se a decisão final for favorável, o recurso será destinado ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados e ao Fundo Social de São Paulo.
Além disso, a Promotoria defende o pagamento de indenização por danos urbanísticos e ambientais, de ao menos o valor dos créditos construídos não adquiridos e que eram necessários para a obra, de R$ 61,8 milhões. Esse valor seria voltado ao Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano (Fundurb). Também pede o bloqueio de bens e valores da São José, responsável pelo empreendimento, a fim de garantir o pagamento das indenizações ao fim da ação.
Os promotores identificaram que a São José Empreendimentos começou a anunciar o edifício ao menos oito meses antes de protocolar o pedido de edificação nova na Prefeitura, em novembro de 2016. Além disso, averiguaram que um estande de vendas esteve aberto ao menos entre julho de 2016 a agosto de 2017 (que incluía o St. Barthes e outro edifício) e que a construção foi iniciada sem o alvará de execução, que é obrigatório.
O pedido foi indeferido pela Prefeitura porque a São José não adquiriu os créditos construtivos (chamados de Cepacs) necessários para a obra, por estar na área da Operação Urbana Consorciada Faria Lima. Hoje, não há mais estoque previsto para leilão. “Ocorre que a edificação não é passível de regularização, conforme já demonstrado. Portanto, não sendo o empreendimento passível de regularização, a edificação deverá ser demolida”, destaca.
“Vale lembrar que a empresa requerida tinha pleno conhecimento de que precisaria apresentar a certidão de pagamento de outorga onerosa em 3.514 (três mil, quinhentos e catorze) CEPACs, desde o apostilamento do alvará de aprovação publicado em 09 de fevereiro de 2018, que expressamente não lhe dava o direito de iniciar as obras”, completou.
Nos autos da ação, a defesa da São José disse que não adquiriu Cepacs porque o último leilão teria “insegurança jurídica” para a aplicação naquele endereço. Afirmou também que não tratou do tema com descaso e que busca regularizar a situação do imóvel. “A judicialização não se demonstra a via mais adequada, célere, nem mesmo eficiente para solucionar a questão”, destacou.
Além disso, ressaltou não ter comercializado apartamentos do edifício irregular. “O empreendimento em questão não foi disponibilizado à comercialização, portanto, não há que se falar em violação à direitos de adquirentes consumidores.”
Ao Estadão, a São José enviou a seguinte nota:
“A Construtora São José já se manifestou nos autos da ação movida pelo Ministério Público demonstrando que a lei não permite a demolição do empreendimento e tem convicção de que isso será reconhecido pela Justiça.
O próprio MP deu parecer contrário à demolição imediata do empreendimento pedida pela Prefeitura, indicando que é necessário, no mínimo, debater a questão perante a Justiça.
De todo modo, a Construtora São José segue buscando uma solução consensual junto às autoridades, sempre deixando claro que está disposta a cumprir todas as exigências legais para regularizar o empreendimento.”
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