O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), declarou nesta quarta-feira, 3, a intenção de implantar um serviço gratuito de equoterapia na área do Jockey Club se for transformado em parque. Em agenda pública sobre outro tema, a ser perguntado por jornalistas, também criticou a decisão judicial que suspendeu temporariamente os efeitos da recém-sancionada lei municipal que proíbe a realização de corridas de animais com apostas.
“Como não pode ter uma lei municipal? E as leis que proíbem os rodeios, animais em circo?”, questionou. “Muitos municípios têm, na sua legislação, que não pode ter rodeio, é o caso da cidade de São Paulo. Então, compete ao Município fazer a sua legislação naquilo que se refere quando legisla para ser mais restritivo”, comparou.
Após a aprovação, na semana passada, a agenda do Jockey se manteve, com corridas em dois dias. O calendário desta semana prevê páreos exclusivamente na tarde de sábado, 6.
Segundo Nunes, a ideia seria de que funcionários do Jockey atuem com a terapia assistida com cavalos, voltada principalmente às pessoas com deficiência. “A única coisa é que, em vez daqueles profissionais trabalharem para as pessoas poderem fazer aposta, eles vão trabalhar para ajudar a cuidar das pessoas na nossa equoterapia pública”, afirmou.
O prefeito também ressaltou a dívida de R$ 856 milhões que o Jockey teria com o Município, a qual é contestada pelo clube na Justiça. “(O Jockey) Atende a uma população de alto nível social, não paga (o IPTU que seria devido) para a gente usar esses recursos para os mais pobres. Nós temos obrigação legal de exigir a cobrança. E uma das cobranças é você ir lá, ou em qualquer outro local, e fazer a penhora do imóvel”, defendeu.
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Por que a lei que proíbe corridas de cavalos teve eficácia suspensa?
A Justiça de São Paulo acatou um pedido de liminar impetrado pelo Jockey Club na terça-feira, 2, para suspender os efeitos da “implementação das providências decorrentes” da lei que proíbe corridas de animais com apostas. Dessa forma, impede “qualquer punição ou sanção administrativa decorrente da violação da obrigação legal imposta pela lei” até uma análise da constitucionalidade da lei.
A decisão foi do desembargador José Damião Pinheiro Machado Cogan. Na petição, a defesa do clube argumenta que esse tipo de proibição não seria de competência municipal, assim como questiona os valores apontados pela Prefeitura como devidos.
“A lei proibitória sancionada sujeitará o impetrante às consequências imprevisíveis, esvaziando-se a finalidade do clube impetrante, o que é flagrantemente prejudicial, pois os proprietários, sócios e demais frequentadores terão a nítida sensação da ‘morte do clube’, colocando-o em situação extremamente delicada, reduzindo-o a mais”, salientou.
O que diz a nova lei recém-sancionada?
A nova lei declara a proibição de “atividades desportivas que utilizem animais, como corridas, disputas ou qualquer outra prova, com a respectiva emissão de pouleis (bilhetes) de apostas, ainda que por meio digital ou virtual”.
Há a determinação de um período de transição, com o prazo de 180 dias para o encerramento de atividades desse tipo na cidade — a contar da data de publicação da sanção, na segunda, 1º, “independentemente de regulamentação”, conforme destaca a publicação.
Segundo o texto, no caso de descumprimento, o espaço deverá ser advertido, com 30 dias para a regularização. Já a reincidência prevê uma multa de R$ 100 a serem multiplicados pela capacidade de frequentadores (estima-se que, no Jockey Club, seja de 20 mil pessoas). Por fim, no caso de permanência do descumprimento 30 dias após a última autuação, determina-se a suspensão do alvará de funcionamento.
Procurada pelo Estadão na segunda-feira, a Prefeitura não informou detalhes sobre a transição das atividades do Jockey ou de implantação do parque, mas respondeu que “tão logo a área seja oficialmente da Prefeitura, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) dará início aos estudos para implantação”.
Prefeitura de SP era contra criar parque no Jockey: ‘Inviável e em área alagadiça’
Em três anos, a implementação de um parque no Jockey Club de São Paulo passou de uma proposta descartada pela Prefeitura para um dos novos espaços de lazer com implantação preferencial pelo Município.
A área foi incluída no quadro de parques com implantação preferencial da nova lei do Plano Diretor, que entrou em vigor no ano passado. Nessa lei, está com o nome de João Carlos Di Genio, empresário fundador do grupo educacional Unip/Objetivo, que morreu em 2022.
A intenção municipal de transformação em parque é distinta do entendimento que tinha ao menos até 2021. À época, dizia ser “inviável”, “por restrições funcionais, de tombamento, altos custos de implantação e manutenção de um parque em área alagadiça”.
O entendimento anterior da Prefeitura está ligado ao Projeto de Intervenção Urbana (PIU) Jockey Club, sugerido por representantes do hipódromo em meados de 2017. A partir da manifestação de interesse privado, a gestão municipal desenvolveu estudos e avaliações de diferentes secretarias.
O PIU Jockey Club está congelado e sem previsão de retomada. Em 2020, foi apresentada uma proposta preliminar, na qual já se descartava a implantação de um parque no interior da pista. Após esse momento, um dos últimos registros de discussão do tema é de uma reunião de maio de 2021, já durante a atual gestão de Bruno Covas (PSDB) e Nunes.
Na reunião, com associações de bairro, representantes da São Paulo Urbanismo (SPUrbanismo, empresa municipal responsável pelo projeto) destacaram a “inviabilidade” de transformação da área em parque. Como justificativa, citaram as “limitações de arborização e implantação de equipamentos” e a existência do Parque Alfredo Volpi nas proximidades, a cerca de um quilômetro.
A resposta ocorreu em meio às dúvidas dos moradores sobre a criação do parque, que era um dos pontos centrais do PIU inicialmente. Em 2017, a proposta do Jockey envolvia um parque em um desnível no centro da pista, para que não prejudicasse as corridas, com a entrada por uma passagem subterrânea. Essa ideia foi descartada ao longo da tramitação do PIU, contudo.
Além disso, na proposta municipal inicial para o PIU, é destacado o entendimento da então Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbanismo (atual de Urbanismo e Licenciamento) de que “a implantação e gestão de um parque público no local seria inviável, considerando as condições geológicas da área e as restrições das resoluções de tombamento, que restringem o plantio de vegetação arbórea e a construção de edificações no Pião do Prado (setor onde o Jockey propôs o parque, na parte interna da pista)”.
Segundo a análise ambiental feita por técnicos da Prefeitura, uma parte do terreno do Jockey é de solo compressível (“solo mole”) e outros típicos de várzeas, assim como abrange também uma área de escoamento difuso de dois córregos. Trata-se, portanto, de um local mais propenso a inundações periódicas, como igualmente mostra a nova carta geotécnica da cidade (cujo mapa interativo pode ser conferido aqui).
A situação chama a atenção em meio às controversas mudanças no zoneamento do entorno do Jockey, que passou a permitir prédios em áreas antes restritivas a casas, como revelou o Estadão.
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