SP abre novo mirante no centro, mas Prefeitura é cobrada por problemas no entorno; veja como ficou

Obra do Belvedere Roosevelt custou R$ 4 milhões e foi criada em área antes sem uso na Rua Augusta, com grafite, arquibancada e jardim de chuva; moradores questionam zeladoria do entorno

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Foto do author Priscila Mengue
Atualização:

Um mirante para uma via expressa? Em meio ao estranhamento e opiniões divididas de moradores e frequentadores, a Prefeitura de São Paulo inaugura nesta quarta-feira, 13, o Belvedere Roosevelt, na Rua Augusta. O novo espaço de lazer e convivência tem vista para a Avenida Radial Leste-Oeste e as escadarias da praça de mesmo nome. Com custo de cerca de R$ 4 milhões, é um dos principais projetos da gestão Ricardo Nunes (MDB) para o centro, região que tem aparecido no noticiário e nas redes sociais pelos sucessivos problemas com roubos, sujeira e a crescente tensão na Cracolândia.

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A iniciativa abrange um pequeno gramado, que esteve gradeado e sem uso por anos. Com cerca de mil m², trata-se de uma laje remanescente das obras da Ligação Leste-Oeste e da Praça Franklin Roosevelt, quase na esquina com a Rua Martinho Prado. O local ganhou arquibancada, acesso para food truck (ainda não em operação), nova iluminação, novo piso e uma escultura no formato de árvore.

A obra inclui a reforma da escadaria lateral, que dá acesso à Rua Avanhandava e à Avenida Nove de Julho. Nos degraus, foram implantados bancos e um “jardim de chuva”, para drenar e filtrar parte da chuva, a fim de reduzir a poluição do solo e da água. Além disso, uma nova faixa de pedestre elevada foi criada para ligar o espaço à praça, medida chamada de “traffic calming”.

Belvedere será inaugurado pelo prefeito nesta quarta-feira Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 12/09/2023

Algumas propostas do projeto original foram modificadas e até não executadas, o que motivou críticas. O deque sustentável foi trocado por uma arquibancada de cimento, por exemplo. Além disso, não foram implantadas as placas fotovoltaicas e a turbina eólica, dentre outras intervenções.

O espaço para food truck está vazio por enquanto, de modo que o mirante chama a atenção basicamente pela arquibancada de cimento, o mural e a escultura. Uma placa inauguratória também foi instalada.

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As obras foram iniciadas em janeiro. Pela localização, a Prefeitura avalia que o espaço tem potencial para atrair frequentadores das vias do entorno, do Minhocão e, principalmente, da Praça Roosevelt. A gestão Nunes tem destacado que o belvedere é uma das ações de “recuperação da região central”, como a remodelação dos calçadões e o Parque Augusta, dentre outras.

Belvedere inclui grafites em laje sobre a Radial Leste-Oeste Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Outro destaque do novo mirante envolve os murais, um voltado para a Augusta e outro para a Ligação Leste-Oeste. As obras são de Gabriel Nunes, (o Gah87), de de 35 anos , e foram batizadas de Bem-te-vejo (com referências de aves da cidade, como o bem-te-vi).

É o maior trabalho feito pelo artista em uma área pública, executado em parte durante as noites e madrugadas, com eventuais interdições no trânsito. Para ele, as obras vão chamar a atenção tanto de pedestres quanto de motoristas e passageiros de veículos que passam pelo entorno.

Vindo da zona leste e morador do centro, o grafiteiro propõe mostrar uma outra São Paulo nos murais, que mistura prédios (como o Copan) e aves da fauna. “Na correria do dia a dia, a gente não consegue ignorar a quantidade de prédios, mas, se apurar o seu olhar, vê bastante árvore, uma quantidade imensa de pássaros, e vários tipos de vida. A gente anda na rua e vê que, na brechinha do prédio, está nascendo uma árvore”, diz.

Já a escultura em formato de árvore é de autoria de Renan Vieira, Filipe Barcelos e Matheus Imai. Trata-se de uma obra cinética, que se movimenta de acordo com o vento, batizada de Árvore Pindoba. “Houve um estudo de ventos, de materiais”, contam os artistas.

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Mirante na Rua Augusta divide opiniões e gera discussão

A iniciativa divide opiniões pelo montante investido e porque alguns moradores e frequentadores avaliam que a Prefeitura deveria priorizar outras ações na vizinhança, como melhorias na Praça Roosevelt e na Rua Amaral Gurgel, abaixo do Minhocão. Também há aqueles que defendem que o local deveria ter mais verde (crítica também comum à praça vizinha) e que são necessárias mais ações contra roubos e furtos no entorno.

Presidente da Associação dos Moradores da Praça Roosevelt (AmoPraça), o engenheiro Fernando Mazzarolo, de 63 anos, descreve a situação como de “frustração”. “É uma estrutura interessante para uma área que estava inutilizada. O que a gente lamenta é que se constrói essa coisa nova e a Praça Roosevelt está abandonada, em situação terrível”, resume.

Ele cita problemas no pergolado, nos cafés, no piso, no paisagismo e na zeladoria da praça como um todo. “É difícil dizer que é bacana: olho a obra e vejo o abandono da Praça Roosevelt. Se eu fosse prefeito, daria prioridade para manter o que já existe”, lamenta. “Os governos parecem preferir fazer obras novas do que manter as que existem.”

Imagem de 2022 mostra o espaço antes da construção do Belvedere Roosevelt Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 06/04/2022

Comentários semelhantes são comuns em publicações recentes de perfis ligados à Prefeitura nas redes sociais, como o da Subprefeitura da Sé. “Era um espaço inutilizado, tende a dar mais vida ao local, mas, sem projeto cultural, de segurança e de atração de moradores estará abandonado e destruído em quatro anos”, disse um morador. “Será que isso é prioritário? Que tal a Prefeitura melhorar os serviços públicos para a população, fazer obras de infraestrutura urbana nos locais de maior vulnerabilidade social?”, questionou outro.

Também há defensores. “Moro ao lado dessa passagem e essa escada melhorou 80% o nosso percurso”, apontou uma moradora, em postagem na rede social. “Muito bom. A cada dia o centro se revitaliza mais e mais”, disse outra.

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A construção do mirante para uma via expressa também motiva discussões e brincadeiras sobre a relação dos paulistanos com os automóveis. Há aqueles que lembram do antigo belvedere para a Avenida Nove de Julho. Já outros criticam a ideia: “Não tem lógica essa obra. Uma arquibancada pra trânsito poluente.”

Arquibancada do mirante da Rua Augusta Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Em nota, a Subprefeitura Sé disse que a Praça Roosevelt “recebe serviços de zeladoria constantemente, com manutenções pontuais no piso e áreas ajardinadas”. “Quanto aos quiosques, recentemente foram vandalizados, mas o autor do ato foi preso na ocasião. No momento, um chamamento público está em fase final de elaboração para verificar interessados em explorar esses equipamentos”, concluiu.

Já a Secretaria de Estado da Segurança Pública apontou que “as forças policiais estão empenhadas no enfrentamento à criminalidade no centro de São Paulo, inclusive na região mencionada”, o que teria contribuído em um aumento nas prisões por roubo, furto e outros crimes de 73,4% na 1ª Delegacia Seccional (Sé), nos primeiros sete meses deste ano em comparação a 2022. Também citou aumento de policiais militares no centro e trabalhos de investigação da Polícia Civil na região.

Após 5 anos, boulevard entre Parque Augusta e Roosevelt não foi criado

O boulevard da Rua Gravataí – anunciado há cinco anos como futura ligação entre a Praça Roosevelt e o Parque Augusta – ainda não foi implementado. O projeto integrava o acordo firmado entre a Prefeitura e as construtoras que detinham os terrenos onde o parque foi criado. A demora motivou insatisfação entre ativistas pela criação do parque nos últimos anos.

Em nota, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente respondeu ao Estadão que “trabalha na articulação interna entre diversos órgãos para dar início à execução” do projeto, com melhoria de calçadas e paisagismo. A execução será do Município, com os R$ 250 mil depositados pelas construtoras no acordo com a Prefeitura e recursos extras ainda em definição. “A previsão é de contratação de projeto e execução da obra até o final de 2024.”

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