‘Temos de viajar 2 horas para pedalar em segurança’, diz amigo de ciclista assassinado em SP

Jean Coloca diz que comunidade envolvida com a atividade do pedal está assustada. SSP-SP afirma que patrulhamento aumentou na região e que tenta capturar os criminosos

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Foto do author Caio Possati
Atualização:

O ciclista Jean Coloca, de 50 anos, colega de Vitor Medrado do circuito de competições profissionais de ciclismo, costumava se encontrar com o parceiro de pedal nas ciclofaixas e parques de São Paulo. Esses encontros, no entanto, foram interrompidos de forma definitiva na manhã da última quinta-feira, 13, quando Medrado, aos 46 anos, foi vítima de um latrocínio no bairro do Itaim Bibi, nas proximidades do Parque do Povo, na zona oeste da capital.

O crime aconteceu por volta das 6h15 da manhã. A vítima estava parada em uma calçada da Rua Brigadeiro Haroldo Veloso, mexendo no seu celular, quando dois criminosos em uma motocicleta se aproximaram e atiram contra o ciclista. Vitor Medrado, que não demonstrou nenhuma resistência ao assalto, foi socorrido, mas não resistiu aos ferimentos. Os bandidos fugiram com o aparelho celular da vítima e, até a noite desta sexta-feira, 14, não tinham sido capturados.

Ciclistas fizeram uma homenagem para Vitor Medrado na manhã desta sexta-feira, no local onde o ciclista foi assassinado. Foto: Werther Santana/Estadão

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A Secretaria da Segurança Pública do Estado (SSP-SP) diz que a Polícia Militar reforçou o patrulhamento na região do Itaim Bibi, e que trabalha para a instalação de um novo batalhão na área. Informou ainda que a Polícia Civil, além de fazer um policiamento especializado no local, está nas ruas para tentar encontrar os criminosos (veja mais abaixo). Os suspeitos são investigados também por atirar contra outra vítima durante um assalto à mão armada no Brooklin, bairro da zona sul, horas depois de matarem Vitor Medrado.

Ao Estadão, Jean Coloca, que também é treinador e presta assessoria personalizada para outros ciclistas, diz que a comunidade envolvida com este tipo de atividade está assustada com o crime. Ele destaca que pedalar em São Paulo não é mais seguro e que costuma ouvir com frequência, de outros colegas, o relato de também serem alvos de assaltos em outras partes da cidade.

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“Já fui assaltado na rodovia do Bandeirantes, por isso que eu não vou mais para lá. Já tentaram me assaltar ali, próximo a Jaguaré (distrito da zona oeste da cidade). Eu ouço direto de amigos que o pessoal desce com faca, com arma. Então, realmente, a gente está em um período muito delicado, muito delicado”, diz o ciclista à reportagem.

Conforme dados da própria SSP-SP, o número de latrocínios na capital aumentou 23,2%, em 2024 (53) ante 2023 (43). O aumento no Estado, em geral, foi 1,8%.

Vitor Medrado morreu após ser baleado por dois criminosos durante um assalto no Itaim Bibi, nas proximidades do Parque do Povo. Foto: Werther Santana/Estadão

A sensação de insegurança, que se amplia ainda mais com um trânsito intenso da capital, faz o treinador adotar a estratégia de pedalar com seus alunos longe da cidade. Cidades do interior paulista, como São Roque e Itu, e rotas que levam à Baixada Santista - Estrada de Santos -, são alguns dos refúgios escolhidos contra o temor de um eventual assalto.

“Não é normal”, diz Coloca, “assaltarem lá na rota do vinho, em São Roque. Então, olha o que a gente tem que fazer: pegar o carro, viajar duas horas, uma hora e meia, para que a gente pedale com segurança”, afirma. “Você vai até São Roque para se sentir minimamente seguro, para poder pedalar e não virar estatística”.

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Apesar da insegurança, o treinador pede para que as pessoas, mesmo que assustadas com o crime contra Medrado, não deixem de praticar o ciclismo. Na sua avaliação, o ciclista não foi vítima por conta da atividade, mas por uma fatalidade que poderia acontecer com qualquer outra pessoa.

“O caso que aconteceu com o nosso querido Vitor, nosso campeão, não foi por ser um ciclista, e sim por ele estar ali, por talvez estar falando com o aluno dele (pelo celular). Poderia ter sido qualquer um”, diz. “Então, é necessário pedir por mais segurança, e não deixar o pessoal se assustar. É para continuar pedalando e fazendo o que ama”, acrescentou o ciclista.

Jean Coloca reforça ainda que os ciclistas precisam estar atentos e evitar atender ao telefone durante a atividade. “Para a nossa comunidade que anda com bike, eu sempre reforço: não atenda o telefone, deixa tocar”, diz. “Era comum eu mesmo parar ali (perto do Parque do Povo) para atender. Só que, infelizmente, os criminosos estão de olho na gente.”

Vitor Medrado recebeu uma homenagem na manhã desta sexta-feira em frente ao Parque do Povo, próximo do local onde foi assassinado. Centenas de ciclistas estiveram presentes, e familiares e amigos depositaram flores e fizeram orações em nome do ciclista. O público que compareceu também realizou um protesto para pedir por mais segurança na região.

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A SSP-SP diz que a Polícia Militar está em fase de elaborar a instalação de um novo batalhão na área do Itaim Bibi, com Unidade de Força Tática, e afirma que as equipes da 3.ª Central Especializada de Repressão a Crimes e Ocorrências Diversas (Cerco), juntamente com as 2.ª e 3.ª Delegacias Seccionais (Brooklin e Pinheiros), estão nas ruas em busca dos responsáveis de cometer os crimes no Itaim Bibi e no Brooklin.

“Já foi identificado que a motocicleta usada pelo criminoso trata-se de um veículo dublê e as unidades estão analisando as imagens para confirmar se o autor está relacionado aos dois casos”, informou a SSP-SP. A pasta diz ainda que, em 2024, os roubos e furtos no Itaim Bibi tiveram uma queda de 29,4% e 16,5%, respectivamente, na comparação com 2023, e que 5,5 mil suspeitos foram detidos e 645 armas de fogo ilegais foram apreendidas.

Ciclista é baleado e morto durante assalto no Itaim

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Criminosos atiraram e roubaram o celular da vítima.

‘Ele dedicava a vida dele para dar qualidade de vida a outras pessoas’

Jean Coloca lamentou também muito a morte de Vitor Medrado, a quem o descreveu como um “menino de ouro” e um “atleta exemplar”, que sempre estava se dedicando aos ciclismo. Os dois tinham uma relação mais próxima nos eventos da modalidade do que propriamente fora das pistas. Mesmo mais distantes nos últimos anos, Coloca não tem dificuldades para elogiar o companheiro. “Era um cara ímpar, uma pessoa do bem, super humilde, gente finíssima.”

Cerca de 200 pessoas comparecem na homenagem para o ciclista Vitor Medrado. Foto: Werther Santana/Estadão

Os dois, diz o ciclista, tinham trajetórias de carreiras semelhantes: estavam deixando de correr pelas competições profissionais para se dedicar ao trabalho de mentoria e assessoria personalizada para outros corredores. “O Vitor foi um atleta profissional e teve a mesma história que eu tive no ciclismo. Competiu provas, Campeonato Paulista, Campeonato Brasileiro, ganhou medalha nos Jogos Abertos do interior do Estado”, lembra Jean Coloca.

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