Veto a ônibus a diesel em SP tem desafio de custo e estrutura; empresas reclamam

Prefeitura determinou que somente veículos elétricos poderão passar a ser incorporados à frota municipal; concessionárias veem ‘questões abertas’

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Foto do author Gonçalo Junior
Atualização:

A proibição da compra de ônibus movidos a diesel para o transporte público na capital, determinada pela Prefeitura de São Paulo na última sexta-feira, 14, esbarra nos custos de aquisição dos ônibus elétricos e na falta de infraestrutura de carregamento desses veículos, na visão de empresários do setor. Especialistas alertam para o atraso da determinação, que começou a ser regulamentada em 2009, e lamentam a ausência de uma política ampla de transporte coletivo para atrair investidores e evitar a evasão de usuários.

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As concessionárias do transporte público não poderão mais comprar ônibus movidos a diesel e devem optar por tecnologias de redução de emissão de poluentes previstas na Lei 16.802/2018, sobre o uso de fontes motrizes mais sustentáveis. Com a determinação, a SPTrans, empresa responsável pelo transporte coletivo na capital, pretende aumentar o número de veículos elétricos para cumprir a meta estabelecida pela gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

Até 2024, fim do mandato, a expectativa é que 2,6 mil veículos movidos a energia elétrica estejam circulando por São Paulo. De acordo com o artigo 50 da Lei de Municipal de Mudanças Climáticas, em 2028, a capital paulista deverá atingir redução de 50% das emissões totais de dióxido de carbono (CO2) em relação aos índices de 2016.

Atualmente, a capital conta com 219 ônibus do tipo, sendo 201 trólebus e 18 movidos à bateria, modelo mais bem alinhado à legislação. De acordo com o Laboratório de Estudos do Veículo Elétrico da Unicamp, a frota de ônibus da cidade de São Paulo é de 14052 veículos que transportam 9 milhões de passageiros diariamente.

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Representantes das concessionárias apontam “questões ainda abertas” na determinação que entrou em vigor nesta segunda, 17. Uma das queixas se refere ao investimento inicial das empresas nos novos veículos. O ônibus elétrico, avaliado em R$ 2,4 mil, custa três vezes mais que o modelo com motor a diesel (R$ 800 mil de acordo com os acessórios).

“Além do investimento inicial mais elevado, o custo operacional de um ônibus elétrico é 10% a 15% maior”, estima Francisco Christovam, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss).

Programa de Metas da Prefeitura prevê que 20% da frota seja de ônibus elétricos até 2024. Foto: Werther Santana/Estadão

A bateria é o item mais caro de um veículo elétrico, como explica Clayton Barcelos Zabeu, professor de Engenharia Mecânica no Instituto Mauá de Tecnologia (IMT). Hoje, o abastecimento de um ônibus a bateria demora 3 a 4 horas, mas, mesmo com esse longo período, os veículos não atingem a autonomia necessária de 250 km por dia. Há preocupação também com a necessidade de adaptação das garagens para uso dos veículos elétricos.

“Se quisermos buscar eficiência e inteligência no nosso sistema de transporte coletivo, é preciso criar uma infraestrutura como uma subestação de transmissão nos terminais, por exemplo. As grandes cidades do mundo estão pensando nisso”, diz o especialista.

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Substituir ônibus a combustão por elétricos pode melhorar a qualidade do ar e a saúde pública. Veículos que utilizam diesel emitem inúmeras substâncias, como os óxidos de nitrogênio (NOx ) e o material particulado (MP), responsáveis por problemas de saúde. Outro benefício da adoção de ônibus elétricos é a redução de ruído, pois são mais silenciosos.

O Brasil está correndo atrás do prejuízo no cenário internacional. De acordo com o Guia da Eletromobilidade, publicado em fevereiro pelo Governo Federal em parceria com o BID, dos 500 mil ônibus elétricos no mundo, apenas 250 circulam no Brasil. O País está atrás da Colômbia e Chile, que criaram e implementaram políticas públicas para o setor.

O que joga a favor dos ônibus elétricos é o valor da manutenção, muito menor, e do custo da energia, também menor se comparado com o que se gasta com o diesel. Aí, o segredo está na quantidade de componentes. Enquanto um motor de combustão interna possui em torno de 500 e 600 peças, o veículo elétrico tem três ou quatro componentes de acordo com o modelo e as especificações.

Tantas cifras despertam uma questão sobre o preço da tarifa. Christovam afirma que os custos das concessionárias na prestação do serviço vão subir. Especialistas apontam que o poder municipal possui três opções neste caso: aumento da tarifa de ônibus, elevação de subsídio ou criar receitas extras, como pedágio urbano, taxa de congestionamento, criação de imposto de circulação do veículos.

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Medidas têm de ser pensadas de forma global

O transporte impacta diretamente no agravamento das mudanças climáticas, com o aumento das emissões dos Gases de Efeito Estufa (GEE) e poluentes locais, e também causa efeitos negativos em questões socioambientais e de saúde pública, diminuindo a qualidade de vida da população.

Pátio de ônibus na capital paulista.  Foto: Felipe Rau/Estadão

Especialistas ouvidos pelo Estadão afirmam que a sustentabilidade e a mobilidade urbana têm de ser pensadas de uma maneira global, não apenas com o uso de determinada tecnologia no transporte coletivo, como motores a diesel ou elétricos. Todos apontam que a adoção de ônibus elétricos deveria proporcionar uma oportunidade de repensar a mobilidade da cidade como um todo. Mas temem que isso não aconteça.

“É preciso levar em conta aspectos sociais, econômicos e culturais com uma política de transporte público, diminuindo a superlotação e as horas gastas no ônibus e melhorando os trajetos”, diz o geógrafo Roberto Braga, especialista em Planejamento Urbano e Regional do Instituto de Geociências e Ciências Exatas da Unesp.

Essa é a mesma avaliação da professora Marijane Lisboa, da PUC, que ficou com a impressão de um “ato isolado” do poder municipal. “É um ato que parece não ter relação nem com o passado nem com o futuro. A comunicação não diz quando, como e de que forma será adotada a medida”, diz a coordenadora do curso de Ciências Socioambientais da PUC.

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Flávia Consoni, professora do Instituto de Geociências da Unicamp no curso de extensão em Mobilidade Elétrica, observa a necessidade de políticas públicas nacionais para organizar novos modelos de negócios e atrair investidores privados para a operação das frotas. A especialista lembra que a medida adota pela Prefeitura de São Paulo reflete atraso na adoção de medidas efetivas para melhorar a sustentabilidade no transporte coletivo.

“Essa medida não pegou ninguém de surpresa. Em 2009, a lei 14.933 priorizava o transporte coletivo de baixa emissão. Em 2018, uma nova regulamentação estabelecia que os operadores de frota de São Paulo promovessem a redução progressiva de CO2, Nox (óxidos de nitrogênio) e material particulado em prazos de 10 e 20 anos. Veio a covid-19 e todos os trabalhos foram interrompidos. Está tudo super atrasado”, diz a especialista.

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