'A gente não aplica só a vacina, aplica esperança': histórias de quem nos dá proteção contra a covid

Profissionais começaram a injetar Coronavac nos brasileiros esta semana e contam sobre esperança de conter a pandemia

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Trabalhar no combate à covid-19 é conviver diariamente com o risco da infecção e os efeitos que, há um ano, sufocam e matam milhares de pessoas. Profissionais da enfermagem já estão vacinando e sendo vacinados emergencialmente pelo Brasil. Gente como Jéssica Pires de Camargo, de 30 anos, de São Paulo, Hamilton Bertan, de 38, de Campinas, e Adélia Maria dos Santos, de 71 anos, do Rio, marcaram a tarefa de iniciar a imunização nos últimos dias.

“A gente não aplica só a vacina, a gente aplica esperança”, disse o técnico de enfermagem Hamilton Bertan, 38 anos, da Unicamp, que vacinou uma colega na segunda-feira, 18, durante a ação do governo estadual que marcou o início da campanha contra a covid-19 em Campinas. Mesmo antes da chegada das doses, a Coronavac já fazia parte da vida dele. Bertan participou da pesquisa do imunizante e foi um dos integrantes da "equipe não cego", o time de cientistas que controla quem tomou vacina e quem tomou placebo no estudo, conduzido pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac. 

Terezinha da Conceição, de 80 anos, foia primeira mulher a receber a vacina contra a covid-19na cidade do Rio de Janeiro Foto: Bruna Prado/ AP

Bertan diz estar orgulhoso de fazer parte do esforço da ciência para encontrar um fim para a pandemia. “A gente se sente bastante feliz fazendo parte desse momento histórico”, afirma. “A gente lançou o primeiro bote salva-vidas, mas para chegar à terra firme as pessoas vão ter de receber a 2ª dose”, ressaltou. “É importante a 2ª dose para que a gente possa quebrar a cadeia de transmissão da doença, conseguirmos a imunidade de rebanho”, declara. 

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Com mais de 10 anos de carreira na saúde, Bertan se formou técnico de enfermagem pelo Colégio Técnico de Campinas (Cotuca), na própria Unicamp, e fez Enfermagem pela Faculdade Jaguariúna. No Centro de Saúde da Comunidade da Unicamp, está há três anos e já foi coordenador de serviços de UTI hospitalar. Solteiro, tem dois irmãos, um gêmeo e outro mais velho. “E tenho um cachorro”, acrescenta. Ele aplicou a vacina na colega Liane Mascarenhas Tinoco, de 48 anos, a primeira a receber a vacina em Campinas. “Ainda não chegou a minha vez. Estou aguardando."

Sob todos os holofotes

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Para a paulistana Jéssica Pires de Camargo, de 30 anos, vacinar a colega Mônica Calazans, a primeira mulher a receber o imunizante no País, foi um momento único. “Foi especial porque se trata de um vírus novo, uma doença nova num quadro emergencial”, explicou a enfermeira, que trabalha na Coordenadoria de Controle de Doenças da Secretaria Estadual de Saúde, em São Paulo. “Sinto orgulho." Além de Mônica, cuja vacinação foi transmitida pela TV em todo o Brasil, Jéssica vacinou cerca de 50 colegas. Ela própria foi a última do time a receber o imunizante. 

Vacinação contra a covid-19 em São Paulo Foto: Alex Silva/ Estadão

Na Saúde desde 2016, ela fez faculdade de Enfermagem e pós-graduação em Saúde Coletiva na Santa Casa de São Paulo. Solteira, com uma filhinha de um ano e meio, ela não teve a doença, Um tio, porém, sofreu com o vírus. “O caso dele foi diagnosticado por sintomas. Passou mal, mas se recuperou", conta. 

Jéssica destaca que o início da campanha é importante também para o reconhecimento dos profissionais da enfermagem. Mas reforça que a luta só começou. “É preciso lembrar que agora, com o andamento da vacinação, a gente espera que ocorra a diminuição dos casos. Mas, mesmo assim, é preciso manter o distanciamento, as máscaras e a higiene das mãos”, diz.

Para ela, o fim da crise da pandemia dependerá do alcance da vacinação. O Brasil tem sofrido para garantir a oferta de doses em grande número, diante da falta de matéria-prima e das dificuldades para importar doses prontas. Nese cenário, Jéssica aposta que o impacto favorável deve chegar só em 2021. “Não é de uma hora para a outra que a economia vai melhorar, que as pessoas vão voltar a viver a vida normal”, diz. A enfermeira deve receber a 2ª dose da Coronavac em três semanas. Mas lembra que, mesmo depois da 2ª dose, ainda há um prazo de mais três semanas para garantir que os anticorpos tenham produzido a proteção do organismo. 

Enfermeiraprepara uma dose da vacina contra o coronavírus Foto: Amanda Perobelli/ Reuters

De frente para o Cristo

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Já a servidora de Saúde do Rio, Adélia Maria dos Santos, foi convidada a aplicar a vacina, diante do Cristo Redentor, pela experiência de mais de 40 anos de atuação na área. Ela faz parte da coordenação de imunizações no Rio e está na Secretaria Municipal de Saúde desde 1990. Junto dos profissionais da área, serão vacinados também idosos com maior risco, como Therezinha da Conceição, de 80 anos, moradora de um asilo no Rio, imunizada na segunda-feira, 20. 

“A imunização é a minha grande esperança”, afirma ela, que em quase quatro décadas como enfermeira, trabalhou em salas de vacina e outras funções no programa de imunização. Segundo Adélia, o Brasil tem um dos melhores programas de imunização do mundo. “A gente erradicou muitas doenças, é um programa que muito me orgulha”, argumenta ela, moradora da zona norte carioca. 

Hamilton Bertan, enfermeiro do Cecom, da Unicamp, vacina a colega Liane Tinoco, em Campinas Foto: Governo de SP

Idosa, ela ficou mais em casa e tentou se preservar durante a pandemia, em casa. A família é grande:“tenho muitas irmãs, sobrinhos, sobrinhos-netos, sempre todos juntos da minha vida”, afirma. “Eu não peguei a doença, nem meus familiares”, acrescenta. 

Como Bertan, de Campinas, Adélia também ainda não foi vacinada. “Tenho 71 anos e comorbidades. Neste momento emergencial, a vacina é para os profissionais de linha de frente e os idosos asilados, que são grupos de risco iminentes e que a gente quer imunizar nesta campanha”, explica. “Logo que possível, serei então vacinada dentro do grupo dos profissionais de saúde e idosos acima de 60 anos.”

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