O xilitol, substituto popular de açúcar, comumente utilizado por aqueles que desejam perder peso ou que têm diabetes, está associado a um risco aumentado de um evento cardiovascular, como um ataque cardíaco e derrame, de acordo com um estudo publicado no European Heart Journal na quinta-feira, 6.
No Brasil, o xilitol é vendido como substituto do açúcar de mesa, em formato de pó ou líquido, e também usado em alguns produtos pela indústria alimentícia.
Os fatos
Pesquisadores conduziram vários estudos. Em um, eles analisaram amostras de plasma de participantes de um estudo anterior – mais de 3.000 sujeitos que estavam em jejum. Esses sujeitos foram acompanhados por três anos, durante os quais alguns deles sofreram um evento cardiovascular, como um ataque cardíaco ou derrame. No novo estudo, pesquisadores descobriram que aqueles que haviam sofrido um evento cardiovascular tinham níveis altos de xilitol no sangue.
Os pesquisadores também estudaram o efeito do xilitol na coagulação usando sangue humano completo e plaquetas, e descobriram que o xilitol fazia com que as plaquetas no sangue coagulassem. Eles testaram, então, a rapidez com que o sangue coagulava na presença de xilitol em modelos de ratos, lesionando a artéria carótida do animal, e descobriram que o xilitol aumentava a taxa de formação de coágulos nos locais de lesão arterial. Coágulos sanguíneos que viajam para as artérias ou veias nos órgãos do corpo, como o coração, podem causar ataques cardíacos, derrames e até a morte.
Em outro estudo, os pesquisadores testaram a suscetibilidade à coagulação do sangue coletando sangue de dez voluntários saudáveis antes e 30 minutos após tomarem uma bebida adoçada com xilitol. Outros dez voluntários receberam uma bebida adoçada com glucose ou açúcar. Os pesquisadores descobriram que aqueles que ingeriram a bebida com xilitol mostraram um aumento acentuado na capacidade de coagulação do sangue logo após a ingestão. Não foi encontrada nenhuma mudança na capacidade de coagulação do sangue nos sujeitos que haviam ingerido a glucose.
“Acho que temos que descobrir se isso é algo que é um comportamento comum de todos os álcoois de açúcar ou se é referente apenas a um subconjunto”, diz Stanley Hazen, cardiologista da Cleveland Clinic. “Até agora, parece ser comum a todos, mas precisamos fazer mais pesquisas, e outros também precisam.”
Os pesquisadores advertiram que, embora esses estudos mostrem que o xilitol está ligado a um risco maior de eventos cardiovasculares, eles não mostram que é a causa desses eventos.
Contexto
Álcoois de açúcar, como xilitol e eritritol, são amplamente utilizados como substitutos do açúcar em alimentos processados, como doces, gomas de mascar e produtos de panificação.
Álcoois de açúcar têm menos calorias e carboidratos e não causam picos súbitos de açúcar no sangue, mostram estudos. Os pesquisadores observaram que, embora o xilitol não seja tão comumente utilizado em produtos alimentícios keto ou sem açúcar nos Estados Unidos, é prevalente em outros países.
“Estávamos tentando descobrir o próximo colesterol, ou seja, outro caminho que contribui para doenças cardíacas que ocorre naturalmente em nosso corpo”, conta Hazen, também presidente de ciências cardiovasculares e metabólicas no Lerner Research Institute da Cleveland Clinic. “E achamos que é isso que temos: o eritritol ou o xilitol, esses álcoois de açúcar, estão ligados a doenças cardíacas, ou pelo menos estão associados ao desenvolvimento futuro de eventos cardíacos.”
A mesma equipe de pesquisa encontrou uma ligação semelhante entre eritritol e risco cardiovascular no ano passado.
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Uso de substitutos de açúcar está aumentando
Os resultados vêm à medida que o uso de álcoois de açúcar como xilitol está em tendência de alta, à medida que dietas cetogênicas e de baixo carboidratos estão gerando crescimento em adoçantes alternativos anunciados como “naturais”. Cerca de US$ 1,19 bilhão em produtos de xilitol foram vendidos em 2021, e esse mercado deve crescer para cerca de US$ 1,48 bilhão até 2030, de acordo com a firma de pesquisa Custom Market Insights. “Há essa situação incomum nas últimas uma ou duas décadas onde as pessoas estão experimentando níveis de xilitol que nunca foram vistos em nossa evolução antes”, disse Hazen.
Os resultados desafiam a compreensão popular dos álcoois de açúcar como xilitol e eritritol como alternativas saudáveis e naturais ao açúcar. As pessoas os veem como naturais porque nossos corpos os produzem como parte do nosso metabolismo energético; no entanto, nossas células os produzem em volumes muito menores. Quando esses álcoois de açúcar são fabricados, eles são preparados industrialmente, usando bactérias ou leveduras que passam por processos de fermentação para criar um produto químico que engana nossas papilas gustativas, explica Hazen.
“Embora seja um composto natural, é usado de uma forma muito não natural, em um nível massivamente maior do que jamais poderia aparecer em condições normais” em nossos corpos, avalia Hazen.
Os pesquisadores também descobriram que um nível elevado de xilitol pode ser pior para o seu coração do que o colesterol. Ao comer uma dieta rica em colesterol, podemos aumentar nossos níveis de colesterol no sangue de 10 a 30%, conta Hazen. Ao comer um produto rico em xilitol, os pesquisadores descobriram que os níveis químicos no sangue aumentaram 1.000 vezes – ou 100.000% – e permaneceram elevados por quatro a seis horas.
Outra maneira de colocar isso é que, entre os milhares de pessoas que Hazen vê em sua clínica de cardiologia preventiva, aqueles cujos níveis de colesterol estão nos 25% superiores têm um aumento de 30% no risco de um evento de doença cardiovascular em comparação com aqueles cujos níveis de colesterol estão nos 25% inferiores. Mas aqueles cujo nível de xilitol no sangue está nos 25% superiores tiveram um risco 200% maior de ter um evento de doença cardiovascular em comparação com aqueles cujos níveis de xilitol estavam nos 25% inferiores.
O que os especialistas dizem
“Este estudo acrescenta a um corpo crescente de literatura sobre os potenciais problemas fisiológicos causados por adoçantes artificiais”, escreveu Marion Nestle, professora emérita de nutrição na Universidade de Nova York, em um e-mail. “Os pesquisadores estão encontrando problemas com um após o outro, agora xilitol.” Embora ela acredite que o estudo precisa ser repetido, sugere que o xilitol pode não ser benigno. Os benefícios dos adoçantes artificiais em geral são incertos, ela escreveu. “Está começando a parecer mais e mais que eles apresentam riscos”, ela escreveu. “Minha preferência é evitá-los, mas, de qualquer forma, eu não gosto do sabor deles.”
Rob van Dam, professor de ciências do exercício e nutrição na Universidade George Washington, disse que, embora as descobertas do artigo sejam convincentes e adicionem à pesquisa existente sobre os riscos dos adoçantes artificiais, os cientistas podem não ter sido capazes de testar adequadamente a ligação entre o xilitol consumido e o risco cardíaco, dado que eles usaram sangue de pessoas que estavam em jejum, o que significa que o sangue provavelmente continha xilitol produzido no corpo, metabolicamente. “Então, a questão é: esses níveis elevados de xilitol realmente refletem que a ingestão dietética de xilitol é ruim?”, pergunta van Dam. “Ou isso apenas significa que algo está errado no metabolismo das pessoas, levando a níveis mais altos de xilitol?”
Os pesquisadores reconhecem essa questão e realizaram um experimento de acompanhamento, onde deram a dez pessoas xilitol e água para ver o que acontecia com suas plaquetas sanguíneas, e observaram que as plaquetas pareciam se agregar mais.
“Eu acho, por si só, que não seria muito alarmante, mas há essa evidência acumulada de que alguns desses adoçantes artificiais podem não ser tão inocentes quanto podemos ter pensado”, diz van Dam. “Se fosse apenas sobre algo que as pessoas não consomem muito, ninguém realmente se importaria tanto. Mas o contexto é: centenas de milhões de pessoas estão expostas, às vezes todos os dias, então cada pedaço de evidência que levanta alguma preocupação é bastante relevante para a saúde pública.”
O que vem a seguir
Dado que a comunidade médica está amplamente recomendando o uso de substitutos de açúcar em vez de açúcar como uma opção para aqueles que são obesos ou tentando perder peso, ou para quem tem diabetes ou síndrome metabólica, esse estudo deve ser um sinal de alerta, diz Hazen.
“Espero que isso seja um chamado para que mais pesquisadores comecem a estudar isso, porque é uma grande preocupação de saúde pública, dado o quanto disso estamos injetando em nossa pirâmide alimentar, pensando que é uma coisa segura”, avalia Hazen.
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